Existe hierarquia hospitalar envolvendo as equipes de medicina e enfermagem? De acordo com Adelvânio Morato, presidente da Associação de Hospitais do Estado de Goiás (AHEG) e também da Federação Brasileira de Hospitais (FBH), os auxiliares, técnicos e enfermeiros estão em uma categoria inferior à dos médicos. Já Roberta Rios, presidente do Sindicato dos Enfermeiros do Estado de Goiás (SIEG), classifica essa informação como “arcaica”.
Como funciona a hierarquia hospitalar?
Em entrevista ao Diário do Estado, Adelvânio Morato afirmou que o auxiliar e o técnico em enfermagem respondem ao enfermeiro, que por sua vez responde ao médico.
“Quando você fala do médico, na área da saúde, é uma categoria superior à da enfermagem. Não superior de pessoas, superior em graduação”, declara Adelvânio.
Para Roberta Rios, a informação é imprecisa. “Existe historicamente uma supervalorização da medicina em detrimento de outras profissões. É uma questão histórica que precisa ser desconstruída, até porque a enfermagem trabalha de forma autônoma e em equipe. A enfermagem não é inferior e subordinada à medicina”, rebate.
Segundo o presidente da AHEG, a questão de hierarquia hospitalar funciona de forma semelhante ao poder público, na relação entre prefeito, governador e presidente. A responsabilidade médica é de tratar, enquanto o enfermeiro executa apenas o que o médico determina.
Já a presidente do SIEG rechaça essa lógica. De acordo com ela, a definição de hierarquia hospitalar é arcaica, precária e ilusória. Dentro do ambiente hospitalar geral, a importância dos profissionais é igualitária.
Por outro lado, dentro do campo de enfermagem, há sim um sistema de hierarquia. O enfermeiro funciona como o supervisor de técnicos e auxiliares, que não podem trabalhar sem a presença de um enfermeiro pelo fato de não terem curso superior. Contudo, a equipe de enfermagem como um todo não precisa necessariamente da presença de um médico para atuar.
Quem se responsabiliza por possíveis erros?
Em um possível erro médico no hospital, quem se responsabiliza? De acordo com Adelvânio Morato, como o enfermeiro executa apenas o que o médico determina e a responsabilidade do tratamento é do médico, se o enfermeiro fizer algo de errado, é o médico que responde. O enfermeiro, nesse caso, não tem responsabilidade nenhuma.
“Por exemplo, se um paciente estiver passando mal dentro de um hospital e estiver um técnico e um enfermeiro. O que eles podem fazer? Nada. Correr atrás do doutor para que ele vá lá, examine e prescreva o medicamento ideal. Aí sim ele vai executar o serviço. Ele não tem responsabilidade em termos de diagnóstico e tratamento. A responsabilidade dele é o cuidado”, afirma.
A fala do presidente da FBH se choca com os argumentos da presidente do SIEG. Roberta Rios destaca que o médico não é soberano, isto é, não está acima de outros profissionais. Como a medicina e a enfermagem trabalham em campos diferentes, apesar de ambas estarem na área da saúde, não há responsabilização do médico em um possível erro da equipe de enfermagem.
“O médico não responde pela enfermagem em nenhuma hipótese. Se houver um erro de medicação, o médico não responde, pois não tem autonomia para isso. […] Se houver erro de algum técnico de enfermagem, quem responde é aquele técnico que cometeu e o enfermeiro supervisor. Legalmente, o médico não responde”, diz Roberta.
O novo piso salarial nacional da enfermagem
Na semana passada, logo antes de ser aprovado o novo piso salarial nacional da enfermagem, o Diário do Estado entrou em contato com Adelvânio Morato para falar sobre os impactos financeiros da mudança nos hospitais. Segundo ele, deveria haver uma melhor definição do piso, pelo fato de cada estado do Brasil ter uma realidade econômica diferente.
Na entrevista desta semana, o presidente da AHEG voltou a reforçar que o piso salarial é “totalmente incoerente”, citando que o próprio médico, assim como psicólogos, odontólogos, fisioterapeutas e outros, não tem um piso salarial nacional, mas sim regional. De acordo com Adelvânio, a única equipe que conseguiu nacionalmente um piso salarial foi a enfermagem.
Para Roberta Rios, o piso salarial da enfermagem é uma reparação e um importante passo para a valorização da profissão. Ela acrescenta que a enfermagem vive um cenário crônico de exploração em detrimento do lucro e que, em várias ocasiões, um médico costuma ganhar mais em um plantão de 12h do que um técnico de enfermagem durante todo o mês.
Por fim, Adelvânio atesta que é um “absurdo” a possibilidade de um enfermeiro ganhar mais do que um médico, por supostamente estar em uma categoria inferior de graduação. Em nota na AHEG, o texto informa que as entidades nacionais que representam o setor de saúde estão pleiteando a declaração de inconstitucionalidade da lei que criou piso salarial para a enfermagem.
Já Roberta conclui dizendo que o médico não trabalha sozinho e que ele depende da equipe de enfermagem, assim como o contrário. “Por que (o enfermeiro) não pode ganhar mais do que o médico? Qual é a explicação? São profissionais de nível superior, assim como o médico”, finaliza.