Eles pararam o Brasil durante dez dias em maio de 2018. A reclamação sobre o preço do diesel persistiu até alguns poucos meses atrás, quando o combustível começou a registrar queda. Os caminhoneiros formam uma categoria formada por 986,8 mil pessoas, segundo dados do Novo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Novo Caged) referentes a julho do ano passado. Os trabalhadores literalmente carregam o Brasil, onde o transporte rodoviário tem prioridade.
A casa desses profissionais costuma ser a boleia, onde passam até meses longe do lar tradicional. A carreira cheia de desafios e aventura seduz homens e mulheres que têm a oportunidade de viajar por todo o País. Há 24 anos rodando nas estradas, Idelmárcia Rodrigues – mais conhecida como Marcinha – só não conhece Manaus porque o trajeto inclui utilizar uma balsa, o que causa mal-estar na ex-pedagoga.
“Fico até três meses em viagem, nunca menos de um mês. Tenho a minha cozinha no caminhão, uma gaveta na parte externa da carroceria. Eu cozinho minha comida lá, faço bolo de panela de pressão, pizza de frigideira, arroz, feijão, carne…Comida de posto normalmente é cara e ruim demais!”, diz.
O cuidado com a alimentação não está relacionado apenas ao custo, mas também à saúde. Ela tem diabetes, doença tão comum entre os colegas da categoria quanto hipertensão, segundo a caminhoneira. Ao longo de quilômetros, as preocupações incluem a conservação da estrada, que impacta na manutenção do veículo, possibilidade de roubo e cumprimento de prazo com entrega. Marcinha lembra que buracos na estrada – quando existe asfalto – são um problema nacional.
Para ela, percorrer a Transamazônica foi um emblemático devido à extensão de 400 quilômetros na estrada de chão, poeira e lama em alguns momentos. Outro obstáculo são os pontos de parada, considerados inadequados na maioria e ainda perigosos. No caso da motorista, as empresas para quem presta serviço disponibiliza uma lista com esses locais autorizados pelas seguradoras, que somente cobrem sinistros previstos nesses pontos.
A categoria ameaçou cruzar os braços por diversas vezes nos últimos quatro anos ressaltando a necessidade de um piso mínimo de frete com reajustes periódicos. O critério afeta diretamente os caminhoneiros autônomos e indiretamente profissionais com vínculos trabalhista, como é o caso de Marcinha. “Os pedágios estão muito caros e o frete baixo. Eu ganho sobre o frete mínimo, ou seja, também sou afetada pelo valor defasado”, destaca.
Já para o caminhoneiro Cleiton Morais, as manifestações não costumam refletir diretamente. Ele conseguiu mudar de vida deixando de ser funcionário e se tornando o próprio patrão ao comprar um caminhão para prestar serviço. A experiência nos dois lados da atuação da carreira o ajudaram a perceber que o esforço de 12 anos como motoristas apresentou resultados positivos.
“Hoje eu só rodo em cidades de Goiás como Goiânia, Anápolis e Inhumas. É muito mais tranquilo. Cheguei a ficar 15 dias fora de casa viajando por São Paulo, Mato Grosso, Tocantins e Minas Gerais. Transporto brita e areia, mas já levei cimento ensacado, cimento a granel, farelo, trigo e milho”, diz.
O conforto de estar mais perto da família não veio acompanhado de maiores ganhos financeiros. Cleiton afirma que muita coisa mudou. Agora, ele tem preocupações com o próprio veículo, as consequências de o caminhão ter um problema mecânico e os ganhos. Segundo ele, após calcular despesas e entrada de dinheiro, a remuneração chega a R$ 3 mil, semelhante ao salário de um motorista que é funcionário.
Perfil dos caminhoneiros
De acordo com a Confederação Nacional do Transporte (CNT), o mercado de trabalho dos caminhoneiros é essencialmente masculino, sendo 99,5% desses profissionais homens, e média de idade deles é de 44,8 anos. A pesquisa revelou que eles atuam, em média, 11,5 horas por dia chegando a rodar mais de 9 mil km por mês de cinco a sete dias por semana. Os dados são do levantamento mais recente, divulgado em 2019.