A possibilidade de criação de uma moeda única para o Mercosul voltou a ser levantada nesta semana e gerou opiniões divergentes, além de muitas dúvidas. O assunto foi retomado após declaração do embaixador da Argentina no Brasil, mas foi refutado pelo ministro da Fazenda Fernando Haddad. O ex-titular da pasta no governo Bolsonaro, Paulo Guedes, já havia feito essa proposta, que seria semelhante ao euro, da União Europeia.
O bloco criado nos anos 1990 propõe a integração econômica, política e social dos países da América do Sul. Teoricamente, uma moeda corrente entre os signatários de tratados de livre comércio na região fortaleceria o acordo entre Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. No entanto, ao contrário da Europa, a adoção de uma moeda única por aqui seria somente para transações externas porque cada uma das nações sulistas permaneceria com o “dinheiro” que já existe. O Real, portanto, não deixaria de existir.
“Para colocar essa ideia adiante, do ponto de vista jurídico, os países envolvidos teriam que alterar as suas legislações sobre o tema monetário. A criação de uma moeda única exige tempo para a definição do modelo econômico-jurídico compatível para os países do bloco. Para se ter uma ideia, os debates para a criação e implementação do Euro levaram 50 anos”, pontua o ex-presidente da Comissão de Processo Legislativo da Ordem dos Advogados do Brasil em Goiás (OAB-GO), Juberto Jubé.
Ele explica que uma lei federal de 1995 definiu o Real como moeda oficial do Brasil e estabeleceu regras e condições de sua emissão, que cabem ao Banco Central e à Casa da Moeda. A produção de uma moeda única no Mercosul, como estaria sendo discutida, ficaria a cargo de um banco central que deveria ser criado. A inspiração seria a Unidade Real de Valor (URV), utilizada na transição do Cruzeiro Real para o Real.
O economista Luiz Carlos Ongaratto acredita que a proposta não deve ter fôlego e seria mais um gesto para sinalizar a intenção de reaproximação política nacional com os demais membros do bloco. Como argumento, ele cita a utilização do que é considerada a moeda global, o dólar, nas importações e exportações especialmente entre os protagonistas do bloco, a Brasil e Argentina.
“O câmbio tem a ver muito com o custo do produto e se atrela a uma outra moeda. O real e o peso oscilam muito. Então, a ideia de uma moeda para transações econômicas entre esses países é uma evolução prevista no acordo do Mercosul. Viria para reduzir o custo de transação entre esses países. Os contras da ideia seriam: quem operaria e qual seria o fator dessa conversão? Quais seriam as garantias para os bancos? O cenário não seria tão positivo para economias instáveis como a brasileira e argentina. Se não tivesse tantos empecilhos, essa moeda já teria sido criada”, detalha.
Especulações
Não há nenhuma proposta em andamento, mas o presidente Lula defende a novidade e atá já se manifestou publicamente. Em duas ocasiões, o petista externou o desejo de concretizar o previsto no acordo do Mercosul. “Vamos voltar a restabelecer nossa relação com a América Latina. E se Deus quiser vamos criar uma moeda na América Latina, porque não tem esse negócio de ficar dependendo do dólar”, afirmou no ano passado antes de se oficializar candidato às eleições.