Estimular o consumo consciente por meio do conceito de moda circular, que prolonga a vida útil de roupas que seriam facilmente descartadas. A solução desta equação tem sido a fórmula de sucesso dos brechós, segmento que vem se consolidando no setor produtivo, frenando os impactos negativos da indústria do fast fashion, com economia de recursos naturais. De quebra, se destaca como válvula propulsora do empreendedorismo feminino.
“É um modelo de negócio diferenciado. Pois para além do lucro, nosso propósito é promover sustentabilidade em um segmento altamente consumista como o da moda, em que as tendências mudam em uma velocidade assustadora”, afirma a proprietária do Empório Armário, Thaís Moreira. O estabelecimento experimenta sua terceira ampliação em pouco mais de dez anos de existência no mercado. Após conquistar clientela cativa no centro da capital, a loja rumou para um novo endereço no Setor Marista.
Thais e o Empório Armário se tornaram referência para as “brechonistas” de todo o estado com a consagração do Encontro de Brechós, que começou em junho de 2016 e entrou no calendário fashion e cultural da capital. A mais recente edição do evento aconteceu em dupla versão nos últimos dias 10 e 11 de junho, ao lado do Grande Hotel, reunindo dezenas de expositores que tiveram movimento nas barracas.
Cerca de dois mil visitantes compareceram em busca de peças em bom estado de conservação e a preços até 80% mais baratos que em lojas convencionais. E não pense que se trata de produtos de qualidade duvidosa. “Tudo passa por uma curadoria especial, que garante higiene e qualidade das peças”, explica Thais. Além de moda, o evento busca ocupar as ruas do centro da capital com uma opção de lazer democrática e gratuita, trazendo músicos e artistas locais.
Outros números do “Encontro” chamam a atenção. Cerca de 300 quilos de peças são recuperadas a cada evento e 95% das brechozeiras participantes são mulheres. Só em 2022, três toneladas de peças ganharam nova oportunidade. Segundo dados do LinkedIn, publicados no Global Gender Gap Report 2022, do Fórum Econômico Mundial, o empreendedorismo feminino cresceu 41% no Brasil apenas no primeiro ano da pandemia.
“Lavou, tá novo”
Pelo baixo investimento e grande possibilidade de retorno, o segmento de brechós ganhou popularidade e superou o estigma que havia até não muito tempo atrás. De acordo com um levantamento realizado pelo Sebrae, baseado em dados da Receita Federal, houve um aumento de 48,58% na abertura de estabelecimentos que comercializam produtos de segunda mão, nos primeiros semestres de 2020 e 2021 no Brasil.
“A economia circular já é uma realidade no Brasil. Em Goiânia, nós temos duas lojas e a abertura da segunda foi quase uma obrigação. Estávamos planejando abrir em outro momento, porém com tanta gente querendo desapegar e fornecer, tivemos que abrir antes do tempo, o que é muito positivo”, relata Rosa Maria Martins, sócia-gestora da Peça Rara Goiânia, franquia inaugurada há dois anos e meio e que conta com quase cem unidades pelo território nacional.
De acordo com o estudo “Style that’s sustainable: A new fast-fashion formula”, da consultoria McKinsey, a transição para a economia circular na indústria da moda pode gerar benefícios econômicos de cerca de US$ 560 bilhões por ano até 2030. Todo esse volume é impulsionado por itens que, segundo pesquisa da empresa alemã Movinga, em 20 países ficam no guarda-roupa e não são utilizados no período de um ano em mais de 50% dos casos. Esse percentual chega a subir para 76% no Brasil.
A rede Peça Rara em Goiânia parece seguir essa tendência. Ao contrário da perspectiva de redução de demanda, a unidade dois manteve o ritmo da primeira e somou o caixa da rede na capital. Segundo Rosa, são de 20 a 30 pessoas desapegando por dia, no mínimo. O faturamento atualmente gira em torno de R$ 300 mil por mês, com venda de pelo menos cinco mil peças no mesmo período. “Para uma loja que tem um um ticket médio baixo, isso é muito relevante”, comenta Rosa Maria.
“Acredito que essas pessoas que consumiram essas dez mil peças poderiam ter consumido dez mil peças novas; assim, consequentemente, a gente gera uma redução de gasto de água, de agrotóxico no solo. O cultivo de algodão, por exemplo, polui bastante o ambiente. Sem falar na exploração do trabalho, já que muitas dessas fast fashions fazem uso de mão de obra escrava”, cita a empreendedora.