Câmeras corporais em PMs: obstrução em abordagens e absolvição de suspeitos – A série “Lente de Aumento” revela casos na Justiça do Rio

‘Lente de Aumento’: PMs obstruem câmeras corporais em abordagens, e suspeitos
acabam absolvidos por falta de provas

Especial do RJ2 analisou quase 800 processos da Justiça do Rio de Janeiro que
incluíram registros da atividade policial.

Por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF
[tudo-sobre/supremo-tribunal-federal/]), desde 2022 todo PM
do Rio de Janeiro é obrigado a usar uma câmera corporal
[rj/rio-de-janeiro/noticia/2022/05/30/camera-no-uniforme-sera-usada-por-pms-do-rj-a-partir-desta-segunda-feira.ghtml].
Os registros em vídeo da atividade da PM fluminense são tema da série “Lente de
Aumento”, da GloboNews e do RJ2.

A decisão do ministro Luiz Edson Fachin
[tudo-sobre/luiz-edson-fachin/] destaca que um dos
objetivos da medida é diminuir o número de mortes em operações. Mas, na prática,
o que a lente vê ou deixa de ver depende da conduta de cada militar.

Para os policiais que trabalham corretamente, a câmera é uma proteção contra
falsas acusações e a garantia que tudo foi feito dentro das regras. Mas há
militares que cobrem a lente para cometer agressões, abusos e violações de
direitos humanos.

Aliás, nesses casos em que não há o registro visual da abordagem, o abordado
acaba inocentado na Justiça.

O 2º capítulo da série trouxe imagens exclusivas de uso indevido do equipamento.
Um dos casos foi em São João de Meriti, na Baixada Fluminense.

Os PMs afirmam que um homem tentou fugir e acabou preso com 60 gramas de maconha
e 90 gramas de cocaína. Já o acusado diz que não estava com drogas e que foi
agredido pelos policiais com socos, chutes e enforcamento.

A verdade deveria ter sido gravada, mas as câmeras corporais ficaram dentro da
viatura. No processo, o Ministério Público do Rio de Janeiro
[rj/rio-de-janeiro/cidade/rio-de-janeiro/] (MPRJ) pediu as
imagens e recebeu 5 horas de gravações que não mostram nada — mas havia o áudio.

“Sou morador, cara, eu sou morador! Calma aí, cara! Coé?”, diz o preso, que
emenda um grito de dor.
“Tá resistindo, irmão? Bota a mão pra trás!”, ordena um PM.
“Calma, carvalho!”, emenda outro militar.
“Eu sou morador, cara”, suplica o suspeito, já ofegante.
“P*rra nenhuma!”, interrompe um PM.

Mais sobre a série:
Série mostra abusos e riscos de ações de PMs a partir de câmeras corporais
[rj/rio-de-janeiro/noticia/2024/12/02/lente-de-aumento-serie-mostra-abusos-e-riscos-de-acoes-de-pms-do-rj-a-partir-de-cameras-corporais-veja-videos-ineditos.ghtml]
Câmera corporal filma ataque a PMs no Jacarezinho; ‘Tomei na perna!’
[rj/rio-de-janeiro/noticia/2024/12/03/lente-de-aumento-camera-corporal-filma-ataque-a-pms-no-jacarezinho-tomei-na-perna.ghtml]

O promotor, responsável pela acusação, pediu a absolvição. Depois de 1 ano e
meio na cadeia, o réu foi inocentado pela Justiça. O juiz do caso afirmou que
“quando o Estado não fornece as imagens da abordagem, a versão da acusação perde
o vigor inicial, pois não pode se sustentar exclusivamente na palavra dos
policiais”.

Rogério Schietti, ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), afirmou que a
filmagem “não é, em si, a única prova possível num processo”.

“Na medida que você tem um processo em que surjam versões contraditórias,
diferentes, a imagem vai solucionar essa dúvida. Então, se você não tem a
filmagem, a Constituição diz que a dúvida sobre uma determinada prova vai se
resolver a favor do réu”, detalhou.

Paulo Roberto Mello Cunha, promotor da 2ª Promotoria de Justiça junto à
Auditoria Militar, explicou que nesses casos há a “negativa de obediência”.

“O Ministério Público chegou ao entendimento que o policial que,
deliberadamente, dolosamente, ele não usa a câmera ou obstrui a câmera, ele
incide no crime militar chamado “negativa de obediência”, que é justamente o
policial se insurgir contra uma ordem de superior”, descreveu.

Esquina de Meriti onde houve ocorrência policial — Foto: Reprodução/TV
Globo

Outro episódio foi no Conjunto Cesar Maia, na Zona Oeste do Rio. Um vídeo com a
câmera encoberta é o único registro da prisão.

“Vocês não me espancaram à toa? Um trabalhador?”, questiona o detido.
“Você é vagabundo!”, responde o PM.
“Agora eu vou botar na Justiça vocês”, retrucou o homem.
“Você agarrou o fuzil. Fica aí que não acabou ainda não!”, falou o militar.
“Para, chefe! Para, vai continuar me espancando? Isso é covardia. Já apanhei
muito!”, pediu o preso.
“Levanta, arrombado!”, reagiu o PM.

Mais uma vez, a Polícia Militar e o acusado de tráfico apresentaram versões
diferentes. A Justiça avaliou que a ausência das imagens deixou dúvidas sobre o
que realmente aconteceu, e o réu foi absolvido.

Há casos em que a câmera auxiliou os policiais. Uma equipe abordou suspeitos em
uma boca de fumo, e um deles tentou resistir e foi contido. O Ministério Público
avaliou que as imagens deixaram evidente que o PM utilizou a força necessária
para contê-lo. As câmeras filmaram o tempo todo, o que resguardou a legítima
atividade dos policiais.

A reportagem também exibiu a gravação de um PM atirando nas costas de um
suspeito rendido
[fantastico/noticia/2024/12/01/exclusivo-cameras-corporais-da-pm-do-rio-flagram-abusos-desvios-e-recusas-de-propina-por-policiais.ghtml].
A abordagem ocorreu durante a perseguição a supostos assaltantes. A abordagem
aconteceu na Zona Norte do Rio, durante a perseguição a supostos assaltantes que
estariam agindo de carro.

Após o comando dos policiais, o motorista sai do veículo com as mãos para o
alto. No chão, ele tenta se explicar. O suspeito se levanta e leva um tiro nas
costas. Veja na imagem acima.

Na porta da delegacia, os policiais militares combinaram a versão que vai ser
apresentada nos depoimentos.

“O senhor não mirou nele, o senhor mirou no veículo”, diz um dos agentes.

Depois de analisar os detalhes da ocorrência, a Defensoria Pública pediu, e a
Justiça determinou que o Ministério Público e a
Corregedoria da corporação
investigassem a conduta dos PMs.

Em depoimento, o réu confessou que roubou a bolsa de uma mulher naquela
madrugada. Ele foi condenado a seis anos de prisão. A Polícia Militar informou
que o sargento Daniel de Souza Braga foi “preventivamente afastado do serviço
nas ruas” e que a Justiça e a Corregedoria da PM estão apurando o caso.

O QUE DIZEM OS CITADOS

Sobre os dois casos em que os PMs teriam obstruído as câmeras e cometido
agressões, a PM informou que a Corregedoria instaurou um procedimento para
apurar a conduta dos policiais.

Sobre o caso em que o policial dispara um tiro nas costas de um suspeito já
rendido, além das investigações abertas pelo Ministério Público e pela PM, a
corporação também informou que o PM foi afastado das ruas.

Nossa produção também questionou o MP sobre a equipe dedicada a apurar crimes
militares de toda a tropa da PM. O MP disse que disse estudou criar uma nova
promotoria para investigar crimes militares, mas que a demanda de trabalho das
atuais promotorias tem se mantido estável e, por isso, não viu necessidade. Mas
afirma que pode reavaliar as medidas caso haja um aumento significativo no
volume de trabalho.

Sobre o fim do Grupo de Atuação Especializada em Segurança Pública, o Gaesp,
extinto em 2021, o Ministério Público afirma que fez uma reestruturação e criou
outros grupos de trabalho para fiscalizar a atividade policial.

O MP destacou, ainda, a redução de mais de 60% dos casos de letalidade policial
nos dez primeiros meses de 2024 em comparação com o mesmo período de 2019.

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Jovem baleada no Rio: família denuncia demora no socorro pela PRF

Policiais rodoviários demoraram a socorrer jovem baleada no Rio, diz mãe

Juliana Leite Rangel, de 26 anos, está internada em estado gravíssimo. Família diz que processará o Estado.

Em depoimento, policiais da PRF reconhecem que atiraram em carro de jovem no Rio.

Baleada na cabeça na véspera de Natal, quando deixava a Baixada Fluminense para uma ceia em Niterói, na Região Metropolitana do Rio, Juliana Rangel, de 26 anos, demorou a ser socorrida pelos policiais, de acordo com a mãe da jovem.

Dayse Rangel, mãe de Juliana, falou da demora no atendimento. “Eles não socorreram ela. Quando eu olhei eles estavam deitado no chão batendo no chão com a mão na cabeça. E eu falei: ‘não vão socorrer não?’, questionou a mãe da jovem.”

A família da jovem estava na BR-040, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, e seguia para a ceia de Natal, em Itaipu, Niterói, na Região Metropolitana do Rio. A família foi surpreendida pelos disparos realizados por 3 policiais rodoviários federais.

Juliana Leite Rangel, de 26 anos, foi baleada na BR-040. Dayse Rangel disse que quando viu os policiais, a família chegou a abrir passagem para a chegada deles ao carro, mas os agentes federais só atiraram. “A gente até falou assim: ‘vamos dar passagem para a polícia’. A gente deu e eles não passaram. Pelo contrário, eles começaram a mandar tiro para cima da gente. Foi muito tiro, gente, foi muito tiro. Foi muito mesmo. E aconteceu que, quando a gente abaixou, mesmo abaixando, eles não pararam e acertaram a cabeça da minha filha.”

Alexandre Rangel, pai da jovem, contou o que aconteceu: “Vinha essa viatura, na pista de alta (velocidade). Eu também estava. Aí, liguei a seta para dar passagem, mas ele em vez de passar, veio atirando no carro, sem fazer abordagem, sem nada. Aí falei para minha filha ‘abaixa, abaixa, no fundo do carro, abaixa, abaixa’. Aí eu abaixei, meu filho deitou no fundo do carro, mas infelizmente o tiro pegou na minha filha.”

Juliana Rangel, atingida na cabeça, foi levada para o Hospital Adão Pereira Nunes, em Duque de Caxias. O estado de saúde dela, até às 22h desta quarta-feira (25), era considerado gravíssimo. A jovem foi medicada, passou por cirurgia e está no Centro de Tratamento Intensivo (CTI). Os agentes usavam dois fuzis e uma pistola automática, que foram apreendidos. Em depoimento, os agentes reconheceram que atiraram contra o carro. Eles alegaram que ouviram disparos quando se aproximaram do veículo e deduziram que vinha dele.

Vitor Almada, superintendente da PRF no RJ, disse que, em depoimento, os policiais alegaram que ouviram disparos quando se aproximaram do carro, deduziram que vinha dele, mas depois descobriram que tinham cometido um grave equívoco.

“A Polícia Federal instaurou inquérito para apurar os fatos relacionados à ocorrência registrada na noite desta terça-feira (24/12), no Rio de Janeiro, envolvendo policiais rodoviários federais. Após ser acionada pela Polícia Rodoviária Federal (PRF), uma equipe da Polícia Federal esteve no local para realizar as medidas iniciais, que incluíram a perícia do local, a coleta de depoimentos dos policiais rodoviários federais e das vítimas, além da apreensão das armas para análise pela perícia técnica criminal.”

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