General Braga Netto preso: Novos detalhes apertam cerco sobre Bolsonaro e aliados

Prisão de Braga Netto aperta cerco sobre Bolsonaro e aliados

Novo depoimento de Mauro Cid em investigação revelou atuação de Braga Netto para atrapalhar investigações

A prisão do general Walter Souza Braga Netto nesse sábado (14/12) aperta o cerco ao redor do círculo mais próximo do
ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) na fase final do inquérito que investiga a tentativa de golpe de Estado depois das eleições de 2022. O general foi preso por envolvimento na trama golpista e por tentar ter acesso a conteúdo sigiloso. A defesa nega que ele tenha obstruído as investigações.

A Polícia Federal (PF) teve acesso a novas informações sobre o envolvimento do general na trama golpista depois que Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), mudou versões e acrescentou detalhes em depoimentos que construíram o acordo de delação premiada com a corporação.

Até o momento, 40 pessoas foram indiciadas pela PF no chamado inquérito do golpe, que investiga a organização criminosa montada por militares e aliados de Bolsonaro que tentaram impedir a posse do presidente Lula.
O grupo se dividia em diferentes núcleos para espalhar desinformação sobre o processo eleitoral; incitar militares a aderirem ao plano golpista; monitorar alvos como o ministro do STF Alexandre de Moraes, o presidente eleito Lula e o vice Geraldo Alckmin; e criar a minuta que embasaria juridicamente a iniciativa golpista.

Bolsonaro se manifestou na noite de sábado e questionou a tese de obstrução das investigações alegada pela PF. “Há mais de 10 dias o ‘Inquérito’ foi concluído pela PF, indiciando 37 pessoas e encaminhado ao [Ministério Público] MP. Como alguém, hoje, pode ser preso por obstruir investigações já concluídas?”, escreveu o ex-presidente.

De acordo com a Polícia Federal (PF), o militar atuou para tentar obstruir as investigações. O general Braga Netto tentou descobrir o conteúdo da delação premiada firmada pelo ex-ajudante de ordens de Bolsonaro com a PF, entrando em contato com o general Mauro Cesar Lourena Cid, pai de Mauro Cid.
Os contatos teriam sido feitos, de acordo com a investigação, para alinhar os fatos que seriam repassados, obter dados sigilosos e manter informados outros envolvidos. Um documento com perguntas e respostas sobre a delação de Mauro Cid foi encontrado pela PF na sede do Partido Liberal (PL), na mesa do assessor de Braga Netto Flávio Peregrino.

Novas informações repassadas em depoimento por Mauro Cid permitiram à PF reavaliar o contexto de atuação do general na trama golpista. A corporação descreve o militar como “um dos principais articuladores das operações ilícitas executadas pelos investigados integrantes de Forças Especiais”.
A investigação também relata que em reunião feita pelo grupo na residência de Braga Netto, em 12 de novembro de 2022, o general entregou ao major Rafael de Oliveira dinheiro em uma sacola de vinho para financiar as atividades de monitoramento realizadas pelos investigados.

Braga Netto também teria atuado para pressionar os então comandantes da Aeronáutica e do Exército a aderirem ao plano. O tenente-brigadeiro Baptista Júnior e o general Freire Gomes chegaram a ser ofendidos por Braga Netto.
Em nota, a defesa do general afirmou que “com a crença na observância do devido processo legal, teremos a oportunidade de comprovar que não houve qualquer obstrução às investigações”.

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Democracia Brasileira aos 40: entre golpistas, indiferentes e o Estado de Direito

Às vésperas de completar 40 anos, a democracia brasileira ainda coxeia, sente-se ameaçada e inspira cuidados. Deve-se louvar o golpista ou o indiferente ao Estado de Direito que sinceramente converteu-se à democracia. O Estado de Direito é aquele que assegura que nenhum indivíduo está “acima da lei”. Mas ao golpista ou ao indiferente ao Estado de Direito, não basta converter-se. Ao golpista, para que sua conversão seja reconhecida como verdadeira, há que se cobrar explicações. Pelo menos duas: por que antes foi golpista? E o que o fez mudar de posição? Há também que se cobrar um pedido público de desculpas se suas ações pretéritas causaram danos ao país.

A mesma receita deveria ser aplicada às instituições. Quantos Papas já não pediram desculpas e autorizaram o pagamento de indenizações a fiéis abusados sexualmente por sacerdotes? Não se pode dizer da Igreja Católica que ela, em algum momento, tenha estimulado o abuso. Mas pode-se dizer, sim, que ela por séculos tolerou o abuso que provocou tanto mal aos seus servos. O Estado alemão, até hoje, se penitencia pelo mal que o nazismo infligiu à Humanidade, especialmente aos 6 milhões de judeus, ciganos e outras minorias mortos em câmaras de gás.

O ministro José Múcio Monteiro, da Defesa, prega que é preciso diferenciar o CPF do CNPJ das Forças Armadas quando se discute o comportamento dos militares em relação a golpes. CPF é o Cadastro de Pessoa Física, CNPJ, o Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica. O que José Múcio quer dizer: as Forças Armadas não são golpistas; mas há militares que são ou que foram. É uma sacada engenhosa do ministro para preservar a imagem da instituição, as Forças Armadas, mas se lida à luz da história, não corresponde à realidade; é apenas uma sacada oportuna.

Só pelo prazer de argumentar: dou de barato que CPFs tramaram o golpe de dezembro de 2022 para impedir a posse de Lula, e o de janeiro de 2023 para interromper seu governo mal iniciado. Mas não foram CPFs que acolheram em diversas partes do país os golpistas acampados à porta de quarteis; ali, área de segurança nacional, sem o endosso do CNPJ, ninguém acampa. Sem endosso do CNPJ, CPF não movimenta tropas e armamento pesado para retardar a prisão de golpistas como aconteceu na noite do 8 de janeiro, nem sugere uma operação para restaurar a ordem.

Foi um golpe militar que derrubou a monarquia e proclamou a República entre nós. Foi um golpe militar que levou Getúlio Vargas ao poder em 1930 e que o retirou de lá em 1945. Getúlio voltou em 1950, desta vez pelo povo popular, matando-se com um tiro no peito quatro anos depois para não ser derrubado por outro golpe. Sua morte postergou em 10 anos a ditadura de 64. A anistia de 1976, dita ampla, geral e irrestrita, perdoou os crimes dos militares que torturaram e mataram adversários do regime; esses, pagaram seus crimes com o próprio sangue. Uma anistia de araque, portanto, que serviu mais a um lado do que ao outro; uma anistia que dispensou as Forças Armadas de ao menos pedirem desculpa e de revisarem sua formação. Às vésperas de completar 40 anos, a democracia brasileira ainda coxeia, sente-se ameaçada e inspira cuidados.

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