Crianças adotadas e devolvidas por famílias em SC serão indenizadas em até R$ 30 mil, decide Justiça
Irmãos retirados de abrigos foram devolvidos pelos adotantes. Nos dois casos,
foram verificados danos psicológicos aos menores por causa da rejeição.
Crianças foram adotadas e, posteriormente, devolvidas a abrigos no Sul de
SC — Foto: Pixabay/Reprodução
Quatro crianças entre 5 e 11 anos serão indenizadas por dano moral após serem
adotadas e, posteriormente, devolvidas pelas famílias. Os valores variam de R$
20 mil a R$ 30 mil e a decisão da Justiça foi com base em processos do
Ministério Público de Santa Catarina (MPSC).
O órgão divulgou a sentença na sexta-feira (7) e as indenizações devem ser pagas
pelo Estado. As ações referem-se a dois processos, ambos com irmãos sendo
devolvidos aos locais onde foram adotados.
Em uma das situações, os irmãos já viviam com a nova família há seis meses; na
outra, há dois anos. A decisão é do Poder Judiciário em Urussanga, no Sul do estado,
que determinou ainda que as famílias que fizeram as adoções arcassem com o
pagamento de 10 sessões de psicoterapia para as crianças.
PRIMEIRO CASO
Dois irmãos, de 5 e 9 anos, foram acolhidos em uma instituição em 2022 após
enfrentarem diversas situações de risco com os pais biológicos, incluindo
negligência, uso de drogas na presença deles e falta de cuidados básicos.
Em junho de 2023, um casal manifestou interesse na adoção, iniciando o estágio de convivência no mês seguinte.
As crianças passaram a morar com a nova família, e o acompanhamento do serviço
social apontou um cenário positivo, sem relatos de problemas.
No entanto, em novembro do mesmo ano, os adotantes começaram a relatar
dificuldades, alegando comportamentos inadequados de uma das crianças, como
resistência em ir ao médico e relutância para fazer tarefas escolares.
O casal justificou que “o processo de adoção não daria certo” e que “no futuro
seria pior”.
Apesar do acompanhamento e da orientação de profissionais para lidar com os
desafios, o casal decidiu interromper a adoção. No dia 28 de novembro de 2023, a
guarda foi revogada, e os irmãos retornaram ao abrigo.
A Justiça determinou que o casal deverá pagar R$ 30 mil a cada um dos irmãos
como indenização pelo dano psicológico ocasionado em razão da devolução, da
conduta negligente e do desinteresse claramente comprovados nos autos.
SEGUNDO CASO
De maneira semelhante, dois irmãos, de 11 e 6 anos, também foram adotados após a
tramitação de processo judicial em Urussanga. Durante o estágio de convivência,
em agosto de 2021, o pai adotivo faleceu, mas a esposa decidiu prosseguir com a
adoção, alegando estar segura de sua escolha.
A família seguiu sendo acompanhada pelos serviços sociais e a convivência
parecia harmoniosa por dois anos e três meses. Contudo, de forma inesperada, em
novembro de 2023, a adotante compareceu à 1ª Promotoria de Justiça de Urussanga
informando que não havia criado vínculo afetivo com o irmão mais velho e que
pretendia desistir da adoção dele.
Na época, o garoto foi reintegrado ao abrigo, enquanto a mulher permaneceu com
o irmão mais novo. Pouco tempo depois, ela desistiu também da adoção do
segundo menino.
Relatórios técnicos destacaram traumas psicológicos sofridos pelos irmãos devido
à rejeição. Neste segundo caso, após a ação do MPSC, a Justiça fixou o pagamento
de uma verba indenizatória de R$ 20 mil para cada menino.
“ADOÇÃO DEVE SER MUITO CONSCIENTE”, ALERTA PROMOTOR
O Promotor de Justiça Eliatar Silva Junior, titular da 1ª Promotoria de
Urussanga, que atuou nos dois casos, alerta aos interessados em adotar.
“A decisão de receber crianças ou adolescentes deve ser muito consciente, pois
se estará abrindo as portas de lares e de corações para crianças e adolescentes
com histórico de rejeição, muitas vezes grave. Esses pequenos indivíduos
necessitam que seus pais adotivos tenham paciência, persistência e muito amor
para ajudá-los a superar as negligências e omissões passadas”.
“Então, quem pretende adotar, antes de mais nada, deve pensar que estará
assumindo o compromisso de amar incondicionalmente, não rejeitar nunca e
desistir jamais. Frisa-se que, embora o sofrimento causado pela rejeição seja
imensurável, ele é passível de indenização e de outras medidas legais
necessárias ao restabelecimento da saúde psicológica das crianças”.