Lula não poderá se reeleger. Caso se reeleja, não deverá governar
E segue a velha cantoria
Lula não poderia se candidatar a presidente da República. Como se candidatou,
não poderia ter sido eleito. Como foi eleito, não deveria tomar posse – daí as
tentativas de golpe no final de dezembro de 2022 e no 8 de janeiro de 2023. Mas
como tomou posse, não poderia governar em relativa paz, e de fato não governa.
Porque uma coisa é enfrentar uma oposição aguerrida, o que é saudável e faz
parte das regras do jogo democrático. Outra coisa muito diferente é enfrentar
uma oposição faminta por dinheiro público para se reeleger, e que não saciada,
parece disposta a tudo para vê-lo pelas costas. A não ser que ele se renda.
Se Lula engrossa a voz é acusado de soberba, arrogância, de revelar mais uma vez
os traços de uma personalidade despótica. Se Lula afina a voz é porque está
frágil, sem saber direito o que fazer. Não se preparou para governar. Já não é o
mesmo de antigamente. De resto, envelheceu e seu estado de saúde inspira
cuidados.
Se fala à nação como fez ontem à noite para anunciar medidas que beneficiarão os
brasileiros mais pobres, diz-se que tudo não passa de propaganda, fruto do
desespero de um presidente cuja popularidade está em queda. Não haveria mais
jeito para Lula. Seu governo estaria condenado ao fracasso. Ele é página virada.
É por isso que a oposição ignora as ofertas de Lula para que entre no governo e
o ajude a governar? Mas quem disse que ela ignora? Salvo a banda podre da
oposição, a que se diz civilizada está louca para entrar no governo e ocupar o
maior número de cargos possíveis. O que não quer é votar com o governo no
Congresso.
Mas não só. Recusa-se desde já a contemplar a hipótese de que fazendo parte do
governo possa vir a apoiar Lula em 2026. “Ao rei, tudo, menos a honra”, decretou
o poeta e dramaturgo espanhol do século XVII Pedro Calderón de la Barca. Na
boca do Centrão, a frase soaria assim: “Ao presidente Lula, tudo, menos os
votos”.
Essa é uma das razões da demora de Lula em reformar seu governo. De que
adiantará uma reforma ampla se continuará sem dispor de apoio para aprovar
matérias do seu interesse? Há 20 anos, na metade do seu primeiro mandato, quando
se esperava uma ampla reforma ministerial, ele a diminuiu.
Deu no que se viu: no Mensalão do PT, o escândalo da compra com dinheiro vivo de
votos de deputados e senadores para aprovar os projetos do governo no Congresso.
Na ocasião, Lula jurou ter sido traído por aqueles que chamou de “aloprados”.
Hoje, diz que tudo não passou de “mentiras”, mas sabe que foi verdade.
Um dia, em meio ao escândalo, Lula cogitou em renunciar ao cargo. O então
ministro José Dirceu de Oliveira, que viajara a São Paulo, foi chamado de volta
às pressas e o demoveu da ideia. Lula então decidiu ir à luta, e para surpresa
da oposição, que esperava vê-lo sangrar até à morte, reelegeu-se com folga no
segundo turno.
Isso não se repetirá necessariamente em 2026, mas poderá se repetir. A esquerda
já tem candidato: Lula. É a direita que não tem, e tão cedo terá. Pesquisas de
opinião apontam que nenhum dos aspirantes a candidato da direita seria páreo
para Lula por enquanto. É ele que tem o poder nas mãos e sabe manejá-lo.
Todavia, de volta ao mantra atualizado da oposição: caso governe até o fim, Lula
não deveria disputar à reeleição. Se disputar, não poderá vencer. Mas se vencer,
deveria ser impedido de tomar posse. Governar pela quarta vez e em paz,
nunquinha. Todas as dificuldades serão criadas para que não faça seu sucessor.