Após surto de zika, mãe luta por inclusão e acesso para filho com microcefalia: ‘uma batalha diária’

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Dez anos após surto de zika, mãe relata ‘barreira’ no acesso a escola, dieta e inclusão para filho com microcefalia: ‘uma luta’

Patrícia Campassi, moradora de Campinas, contraiu a doença enquanto estava grávida em 2015, ano em que 2.975 casos foram registrados no Brasil.

Mãe relata ‘barreira’ no acesso a escola, dieta e inclusão para filho com microcefalia

Dez anos depois do surto de zika no Brasil, Patrícia Campassi, de Campinas (SP), relata como o filho Lorenzo, que tem microcefalia, enfrenta dificuldades no acesso a atividades escolares, fornecimento da alimentação adequada pelo Estado, além da exclusão na sociedade.

Patrícia contraiu o vírus zika enquanto estava grávida do Lorenzo em 2015, mesmo ano em que foram registrados 2.975 casos no Brasil. Em Campinas, naquele ano, seis pessoas contraíram a doença, número que saltou para 461 em 2016. Desde 2021, não há casos confirmados de zika no município, segundo a prefeitura.

ALIMENTAÇÃO EM FALTA

Lorenzo precisa se alimentar por sonda e precisa de uma dieta enteral. Ele recebia essa alimentação pelo SUS, mas deixou de conseguir há aproximadamente um ano.

“A cada 4 meses a gente tem que fazer a renovação. E nesse processo [o Estado] ficou adiando, adiando. Se passaram 5 meses eu falei ‘não, vou tentar de uma maneira particular’. E agora faz 5 meses que eu estou pagando advogado e mesmo assim a orientação que eu tive é que não tem mesmo leite para ser fornecido pelo Estado”, afirma Patrícia.

Segundo Patrícia, cada lata da dieta enteral custa R$ 130 e dura três dias, já que o Lorenzo precisa da alimentação seis vezes ao dia. Com o preço alto e sem o benefício, a mãe procurou uma nutricionista para utilizar uma alimentação caseira como complemento, à base de vitaminas.

G1 questionou a Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo sobre a falta da alimentação. Em nota, a Secretaria lamentou o ocorrido e informou que a dieta enteral que Lorenzo utiliza estará disponível para retirada na segunda-feira (17).

ATIVIDADES ESCOLARES

Lorenzo chegou a frequentar uma escola municipal, mas não vai mais às aulas desde 2022. Antes disso, a mãe reclama de que as atividades não eram direcionadas a ele.

Segundo a pedagoga e gestora Lucelaine Zampolin, em casos de crianças que precisam de serviços de educação especial, é criado um Plano Educacional Individualizado (PEI), um documento criado a partir das necessidades e habilidades de cada criança.

A prefeitura de Campinas informou que Lorenzo tinha acesso ao serviço de transporte adaptado e que a Secretaria Municipal de Educação oferecia cuidador e atendimento com alimentação escolar especial.

Informou também que a escola que ele frequentava conta com duas professoras de educação especial que orientam o professor da turma, adaptam as atividades em sala de aula e os materiais para as especificidades de cada criança.

De acordo com a pasta, a equipe da escola fez todos os esforços para que Lorenzo continuasse a frequentar as aulas, inclusive conversando com a família. O caso foi categorizado como abandono escolar e a escola notificou o caso ao Conselho Tutelar.

Em resposta às alegações da prefeitura, Patrícia afirma que a orientação da escola era de que Lorenzo não precisava ir todos os dias. Disse também que, quando ia às aulas, Lorenzo entrava às 7h e era liberado por volta de 10h30, e que as cuidadoras eram desatentas em relação aos cuidados dele.

PERDA DE UMA FILHA

A mãe conta que, na mesma época, teve dificuldades para manter a rotina de Lorenzo depois de perder uma das filhas, a Helena, que morreu em 2022 por conta de uma pneumonia. Ela tinha 1 ano e 10 meses. Patrícia conta que vive um luto desde então.

“Tudo que há 10 anos atrás o médico me orientou realmente é a limitação do Lorenzo. Ele não anda, não fala, se alimenta por sonda. Então tem uns cuidados diferentes que hoje já é muito natural e normal pra mim”, relata Patrícia.

Lorenzo faz fisioterapia uma vez por semana e precisa de cuidado constante. A mãe conta também com a ajuda da filha mais velha, Emanuelly, de 14 anos. “Ela é a minha maior rede de apoio. Ela sabe fazer tudo, né? Quando ele nasceu ela tinha cinco, então ela acompanhou tudo”, afirma.

FALTA DE ACESSIBILIDADE E INFORMAÇÃO

“Eu tento incluir ele em tudo, levo ele para qualquer lugar, mas eu tenho que já sair preparada para aquilo que eu vou enfrentar”, desabafa Patrícia.

Para a mãe, a maior dificuldade enfrentada pela família consiste no esforço feito para incluir e cuidar do Lorenzo devido à falta de acessibilidade e informação.

A gravidez de Patrícia corria normalmente até que na 8ª semana, ela teve vermelhidão na pele, dor no corpo e coceira. Os sintomas foram tratados pelos médicos, na época, como alergia alimentar, apesar do crescente número de casos de zika no país. Depois disso, ela fez mais dois ultrassons, que não deram nenhum tipo de alteração. Na 30ª semana de gestação veio o diagnóstico de microcefalia. Apenas depois do nascimento de Lorenzo, durante uma visita a um neuropediatra que a hipótese de zika foi levantada.

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