Elis Regina: Biógrafo Revela Bastidores e Curiosidades aos 80 Anos

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Demissão de músicos durante show e prêmios guardados na casinha do cachorro: biógrafo revela bastidores sobre Elis Regina

Cantora completaria 80 anos nesta segunda-feira (17). Autor de “Elis: Uma Biografia Musical”, Arthur DE Faria relatou curiosidades sobre a trajetória da artista.

Programação na capital celebra os 80 anos de Elis Regina

“Nossos ídolos ainda são os mesmos” – e poucos permanecem tão presentes quanto Elis Regina. Se estivesse viva, a artista completaria 80 anos na segunda-feira (17). Ícone da música brasileira, sua voz e intensidade seguem ecoando, atravessando gerações e consolidando um legado que, como define o músico e escritor Arthur DE Faria, “nunca precisou ser resgatado”.

A cantora, nascida em Porto Alegre, morreu em 19 de janeiro de 1982, em São Paulo, meses antes de completar 37 anos. Deixou três filhos e um herança de músicas históricas, discos que venderam milhões de unidades e a popularidade em alta de uma das artistas mais famosas dos anos 60 e 70.

Autor de “Elis: Uma Biografia Musical”, publicada em 2015, Arthur DE Faria revelou ao DE curiosidades sobre a trajetória da artista. Confira abaixo.

Elis começou cedo. Aos 11 anos, já cantava no programa Clube do Guri, em Porto Alegre. Uma espécie de “The Voice Kids”, programa da TV Globo, da época, compara Faria. Aos 13, ela assinou o primeiro contrato profissional e foi eleita a melhor cantora do Rio Grande do Sul. O reconhecimento se repetiria duas vezes antes de completar 19 anos e sair do estado. “Quando ela chega no Rio de Janeiro, com 19 anos de idade, ela tem muito mais experiência profissional do que qualquer outra cantora da geração dela”, afirma o músico.

Para o biógrafo, o fenômeno que Elis se tornou em apenas um ano no RJ se explica por meio “de muito esforço e estrada rodada”, além da vocação. Faria faz a ressalva de que Elis nunca deixou de valorizar suas raízes, na contramão das especulações que davam conta que a cantora teria renegado a terra natal: “Muitas vezes ela falou que ela era uma moça do Navegantes, criada no IAPI, filha de uma lavadeira”, comenta. “Elis é muito maior do que Porto Alegre, do que o Rio Grande do Sul. A Elis é uma referência de cantora para cantores no mundo inteiro”, diz.

Elis também ficou conhecida por sua personalidade forte. Um episódio emblemático aconteceu quando ela, insatisfeita com a banda que a acompanhava, demitiu os músicos durante uma apresentação. “Ela apresentava cada um dizendo ‘tocando comigo pela última vez’, e assim ela foi demitindo cada um dos músicos da banda”, conta Faria. O biógrafo explica que a banda estava “solta, sem prestar atenção nos arranjos, sem prestar atenção na canção”. Para a obra, ele conversou com dois dos músicos que foram despedidos pela artista e eles teriam afirmado que estariam tocando sem demonstrar interesse na apresentação. A intensidade também se refletia em como Elis lidava com a fama. “Ela era absolutamente anti-estrela”, revela Faria. “Um dia, o filho dela, criança, estava brincando e achou no fundo da casinha do cachorro um monte de prêmios, e perguntou: ‘o que é isso, mãe? O que é esse negócio? Por que eles estão aqui?’. E ela disse: ‘isso não é nada, isso não significa nada. O que importa é o almoço que eu vou cozinhar pra ti’, relembra.

Elis foi pioneira em assumir o controle total de sua carreira, em uma época dominada por homens. A cantora escolhia o repertório, participava dos arranjos e opinava na capa dos discos. “Ela sempre se sentiu uma instrumentista, cujo instrumento era a voz. Ela foi a primeira pessoa a assinar sua carteira da ordem dos músicos com o instrumento ‘voz'”, comenta o escritor. Segundo Faria, as cantoras da época escolhiam, no máximo, o repertório junto com o produtor do disco, deixando os homens para fazerem os arranjos e gravarem. No entanto, Elis Regina era a primeira a chegar no estúdio e a última a sair, para participar de todas as etapas da criação de uma música. “Ninguém dizia o que ela tinha que fazer na carreira dela, ela sempre teve as rédeas de todos os detalhes da sua carreira. Isso num mundo terrivelmente machista, como é o da música ainda hoje, imagina isso em 1965”, reflete o músico. Além disso, a rapidez com que os discos eram gravados por ela é exaltada. “Sempre matava discos em 4 horas. ‘Falso Brilhante’ foi gravado em 4 horas, um take pra cada música, a única que precisou de dois takes foi ‘Velha Roupa Colorida'”. Politicamente, a cantora se engajou fortemente na década de 1970, durante o regime militar. A Ditadura durou até 1985, e uma das características do período foi a censura a artistas, escritores e imprensa. Foi neste período que Elis Regina começou a perceber com mais clareza as transformações sociais que atravessavam o Brasil. Ela foi então em busca de entendimento. Passou a ler mais, mergulhou na psicanálise e se debruçou sobre os debates da “revolução sexual”, especialmente em torno da sexualidade feminina, conforme o biógrafo. Elis se transformou em uma mulher engajada e feminista. A carreira dela, no entanto, se desenvolveu em uma realidade marcada pela ausência de democracia. Nascida em 1945, Elis viveu toda a sua vida adulta sem jamais ter votado para presidente. Entre as causas que defendia, estavam a legalização do aborto e os movimentos sindicais. Se tivesse que descrever Elis em uma palavra, Faria escolheria “intensa”. “Era muito intensa em tudo que ela fazia. Quando ela se apaixonava, quando ela se desapaixonava. Quando ela tinha um ímpeto de fazer uma coisa, ela fazia. E é isso que arrepia a gente quando ouve e vê ela cantando”, relata o escritor. Desafiado a imaginar o que Elis diria sobre sua própria trajetória, o biógrafo Arthur Faria arrisca: “Sempre tentei fazer o melhor que pude, e acho que consegui muitas vezes”.

Em Porto Alegre, diversos eventos homenagearão Elis Regina. Confira:

– Show “Elis 80” (23 de março): O show “Elis 80” será realizado no Teatro Oficina Olga Reverbel, no Multipalco Eva Sopher do Theatro São Pedro, no domingo (23), às 19h. Os músicos Rosana Marques e Alexandre Alles homenageiam Elis Regina. O espetáculo rememora a discografia da cantora, com interpretações de clássicos. A duração do show será de 1h30. No repertório, o show inclui músicas de álbuns como “Fino do Fino”, “Dois na Bossa”, “Elis e os Festivais”, “Elis Especial”, “Aquarela do Brasil”, “Ela”, “Me Deixe em Paz”, “Falso Brilhante”, “Transversal do Tempo”, “Essa Mulher”, “Saudade do Brasil” e “Trem Azul”. O espetáculo faz parte do projeto “Memória Elis Regina”, idealizado pelo grupo Rosana Marques e Banda desde 2008.

– Tributo “Alô, Alô, Marciano! – 80 anos de Elis Regina”: Em uma apresentação na rua com entrada franca, o evento começa às 18h, junto à estátua de Elis Regina, localizada na Orla do Guaíba, ao lado da Usina do Gasômetro. Esta é uma iniciativa da Secretaria da Cultura da Prefeitura Municipal de Porto Alegre.

Elis, para sempre! A edição reproduz o Clube do Guri, programa de auditório de grande sucesso nas décadas de 1950 e 1960, palco onde estreou Elis Regina. Oito meninas se apresentarão, sob direção musical de Lucano Maia. A entrada é franca, mediante lotação do espaço.

Samba do Quintana Recebe Laila Garin: Samba do Quintana apresenta sambas que ficaram conhecidos por meio da interpretação de Elis, como “O bêbado e o equilibrista”, “Madalena” e “Tiro ao Álvaro”. A entrada é franca e conta com intérprete de Libras.

Show Laila Garin canta Elis: A artista Laila Garin, que interpreta a cantora no espetáculo “Elis, a Musical”, em cartaz desde 2013 e visto por mais de 350 mil pessoas, apresenta as canções interpretadas por Elis Regina em um show em homenagem à aniversariante. A entrada é franca e conta com intérprete de Libras.

A história do disco – especial Elis 80: Gravação de podcast seguida de audição comentada. Entrada franca, mediante senha por meio da garantia do ingresso digital.

Exibição gratuita do documentário Elis & Tom, Só Tinha de Ser com Você: A Cinemateca Paulo Amorim contará com a exibição gratuita do documentário “Elis & Tom, Só Tinha de Ser com Você” (Roberto de Oliveira e Jom Tom Azulay), seguida de mediação especial no acervo. Após a sessão, o público poderá participar de uma visita mediada ao acervo recém remodelado.

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