Prédios-caixão, as construções proibidas há 20 anos em Pernambuco
Edificações que ignoram normas de engenharia já chegaram a abrigar 11% da população do Grande Recife. Modelo de obra foi banido há 20 anos, mas problemas persistem. Pernambuco teve ao menos 18 desabamentos de ‘prédios-caixão’ em cinco décadas, o último deles em janeiro deste ano, com 54 mortes.
A administradora Rosângela Costa, 60 anos, estava passando por dificuldades financeiras e na família quando soube por uma amiga de uma oportunidade única para ter uma casa própria. Sem precisar dar entrada ou parcelas intercaladas, comprou um apartamento no Conjunto Beira-Mar, localizado em Paulista, na Região Metropolitana do Recife.
Costa chegou ao residencial quando ainda havia pouca gente e infraestrutura, em 1984. Mas hoje aquele sonho da casa própria virou pesadelo. Nas palavras do engenheiro civil Luiz Fernando Bernhoeft, do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Pernambuco (Crea-PE), ela havia adquirido uma moradia em um tipo de prédio que “nasceu para cair, mais cedo ou mais tarde”.
O apartamento estava num chamado “prédio-caixão”, um tipo de edificação que começou a ser construído na década de 1970 e se popularizou em Pernambuco, mas que anos depois tornou-se também uma dor de cabeça para o estado. Esses prédios foram construídos fora das normas legais da engenharia e com materiais sem durabilidade, resultando em uma sequência de tragédias e desabamentos que deixaram um rastro de morte.
Neste ano, completará duas décadas que os prédios-caixão foram proibidos em Pernambuco. Mas eles seguem causando problemas ainda hoje. Há bairros quase fantasmas cheios de edificações abandonadas, prédios ocupados de forma irregular e milhares de ex-moradores aguardando indenizações. “Você não vai comprar um apartamento com 360 parcelas sabendo que ele vai cair, que ele vai ruir, que ele foi construído diretamente no barro”, pontua Costa.
Os prédios-caixão são edificações de “alvenaria resistente”, ou seja, construídas sem vigas, pilares e concreto armado. A despeito da quantidade de mortes que causaram, levam esse nome por causa do seu formato. Os prédios foram construídos com até quatro pavimentos, para evitar o uso de elevador, como determinava a política urbana de solo, mas não seguiam nenhuma norma da engenharia.
Conjuntos habitacionais enormes foram construídos dessa forma, como o Muribeca, em Jaboatão dos Guararapes, na região metropolitana, com 2,2 mil apartamentos. O residencial dos anos 1980 foi totalmente interditado pela Defesa Civil em 2014, e demolido em 2020. Estima-se que haja 5,3 mil prédios-caixão no Grande Recife. Nem todos, entretanto, apresentam risco de cair.
Autor: Alice de Souza