Maré tevê uma operação policial a cada 8 dias no ano passado, diz relatório
Vinte pessoas morreram durante ações policiais ao longo do ano passado no
complexo, dado menor que apenas os de 2019 e 2022.
O Complexo da Maré, na Zona Norte do Rio de Janeiro, registrou 42 operações
policiais ao longo do ano passado. O dado está presente no relatório divulgado
nesta sexta-feira (21) pela ONG Redes da Maré. O documento “De Olho na ADPF”
afirma que o número representa o maior registro de ações policiais desde o
começo da série histórica, em 2016. Trata-se de uma operação a cada 8 dias, em
média.
De acordo com o relatório, 20 pessoas morreram durante ações da polícia em 2024
no Complexo da Maré.
Analisando desde o começo do estudo, o dado só é menor que nos anos de 2019 e
2022.
“A polícia fez mais operações policiais no tempo da ADPF, mas a letalidade
diminuiu, mas – ao mesmo tempo – a gente vê que o uso de câmeras, que ter
ambulância, o policial estar identificado, não virou ainda uma prática,
infelizmente, das polícias aqui no Rio de Janeiro. O que a gente está justamente
pedindo na ADPF é que haja um controle sobre a atividade da polícia assim. Um
controle da sociedade”, afirmou Eliana Souza Silva, diretora da ONG Redes da
Maré.
Ao longo de 9 anos, a organização acompanhou cerca de 150 operações e ouviu
relatos dos moradores.
O documento mostra que, das 20 mortes registradas, apenas 4 tiveram perícia nos
locais. Em 17 delas houve relatos de moradores e parentes dos mortos sobre
indícios de execução.
Das 42 operações, em apenas 26 delas os policiais usaram câmeras corporais. O
boletim registra quatro relatos de que, em algumas situações, os agentes
desligaram ou cobriram as câmeras.
Desde o começo da série histórica, a Maré registrou 148 mortes durante
operações. O dado representa uma média de 13,1 mortes por 100 mil habitantes.
De acordo com relatório, 20 pessoas morreram durante ações da polícia em
2024 no Complexo da Maré.
ESTUDANTES SEM AULAS
De acordo com os dados da Redes da Maré, as escolas do complexo de favelas
ficaram sem aulas por 37 dias durante ações policiais. Em média, 20 unidades de
ensino fecharam cada vez que houve uma ação da polícia. Isso representa que
7.302 estudantes ficaram em casa.
No mesmo ano, em 88% das operações, veículos blindados circularam no entorno de
unidades de ensino.
E 90% das ações foram perto de unidades de saúde. Foram 30 dias sem serviços e
8.715 atendimentos adiados.
De acordo com os dados da Redes da Maré, as escolas do complexo de favelas
ficaram sem aulas por 37 dias durante ações policiais.
STF
O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma, na próxima quarta-feira (26), o
julgamento definitivo da ADPF das favelas. A ação restringe operações policiais
nas comunidades como forma de combate à letalidade policial.
O processo foi suspenso, no mês passado, após o ministro Edson Fachin, relator da ação, votar para manter as restrições às
operações.
De acordo com o relatório da ONG Redes da Maré, o número de denúncias de invasão
de domicílio foi maior nos últimos dois anos. Em 2016, foram 6 casos. No ano
passado, o registro foi de 93 ocorrências. O número simboliza um crescimento de
1.450%.
No ano passado, em 32% dos casos de invasão, os moradores relataram algum dano
ao patrimônio. Em 13% deles houve ameaça. Em 11%, algum objeto foi levado e em
5% alguém foi vítima de tortura.
Blindados em rua do Parque União, no Complexo da Maré.
PODER PÚBLICO
O secretário de Segurança Pública afirma que o poder público está cumprindo as
regras determinadas para a realização de operações.
“O Estado do Rio de Janeiro vem fazendo o seu papel de cumprir todas as
exigências feitas pela ADPF 635. A intenção é preservar vidas em uma operação,
seja ela planejada pela polícia ou para intervir em guerra de facções
criminosas, ela é necessária para preservar as vidas de funcionários, alunos,
profissionais de saúde”, afirmou Victor Santos.
Ele afirma que as denúncias contra policiais terão respostas das corporações.
“A gente está à disposição para que as pessoas lesadas, tiveram seus bens
levados ou algum tipo de tortura, que procure a secretaria e os canais de
corregedoria porque a gente vai tomar uma providência e nenhum caso desse vai
ficar sem resposta”, afirmou o secretário.
Uma moradora, que não quis ser identificada por segurança, afirma que o trabalho
da polícia é importante, mas os moradores devem ser respeitados.
“Eles tinham que chegar quietos. Fazer a operação deles. Não mexer com
moradores. Não bater em moradores. Não levar as coisas de moradores. Não abrir a
geladeira de moradores, para comer o que os moradores têm. Aqui na comunidade,
existe muito trabalhador e trabalhadora. Eu já estou cansada disso”, disse ela.
Viaturas da Polícia Civil em uma das entradas do Complexo da Maré.