Com demora do Estado, famílias dependem de doações de fórmula especial para alimentar crianças com alergia a leite
Famílias da região de Campinas reclamam da demora no prazo para resposta e das negativas que não são justificadas. Há casos em que até decisões da Justiça são desrespeitadas.
Foto: Reprodução/EPTV
Famílias do interior de São Paulo relatam que dependem de doações de fórmula especial para alimentarem seus filhos com Alergia à Proteína do Leite de Vaca (APLV), em meio à demora da Secretaria Estadual de Saúde para responder aos pedidos de fornecimento gratuito.
De acordo com a Coordenadoria de Assistência Farmacêutica (CAF), o prazo para atender às solicitações pode variar de 7 a 30 dias corridos, mas as famílias afirmam que, além de levar mais tempo, os processos são negados sem justificativa (veja os relatos abaixo).
A EPTV, afiliada da TV Globo, ouviu famílias da região de Campinas (SP) que chegaram a entrar com ações na Justiça para obter o fornecimento. No entanto, elas contam que o Governo Estadual não tem cumprido as decisões judiciais.
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Para auxiliar quem não tem condição de comprar o alimento, elas se uniram em um grupo online, onde trocam informações e mobilizam a doação. De Sumaré (SP), a advogada Patrícia Dias Aydar, mãe de um menino com 2 anos com APLV, diz que, sem a iniciativa, muitas crianças ficariam desassistidas.
Cada lata da fórmula infantil chega a custar R$ 300 e pode durar até três dias a depender do consumo da criança. Segundo ela, para algumas famílias, o custo mensal pode chegar a R$ 5 mil até que o bebê complete seis meses de vida.
“São muitas famílias super endividadas ou psicologicamente frustradas, adaptando coisas que não são adequadas para a idade do bebê, como o leite vegetal que compra na farmácia. Tem crianças que consomem sem prescrição médica. Algumas são hospitalizadas. Se não fosse o grupo e esse repasse, acho que muita crianças estariam até em situações graves”.
A reportagem aguarda um posicionamento do Governo do Estado sobre as reclamações.
DEMORA E NEGATIVAS SEM EXPLICAÇÃO
Para ter acesso às fórmulas infantis especiais por meio da Farmácia de Alto Custo, as famílias precisam entrar com um pedido oficial e apresentar uma longa lista de documentos e exames (confira abaixo). O problema é que, mesmo seguindo os passos corretamente, muitas encontram dificuldades para ter o benefício. Patrícia conta que vê muitos desses casos no grupo que administra.
As reclamações vão desde a demora no prazo para resposta, até as negativas que não são justificadas. “Muitas vezes, justificativa que está fora do critério, mas não está. As documentações sempre estão certas. A grande maioria que a gente analisa no grupo, todas vem muito bem detalhadas, certinhas. Não é uma negativa. Tem pessoas que já tiveram três, quatro, oito”, comenta.
Esse é o drama vivido por Fernanda Moreira, que mora em Hortolândia (SP) e é mãe da Ayla. Ela conta que teve o pedido negado duas vezes. No começo de maio, a Justiça determinou em até 10 dias o fornecimento de oito latas mensais da fórmula, sob pena de multa diária de R$ 500. O prazo passou e a família não consegui fazer a retirada.
A filha do Rafael Diniz também foi diagnosticada com APLV após ter uma reação grave. Hoje, aos 7 meses, a menina depende da fórmula. Assim como ocorreu com Fernanda, o pai precisou pedir o fornecimento judicialmente. A Justiça, então, determinou a entrega de 16 latas mensais do suplemento em 20 dias, mas, quase dois meses depois, a família ainda não recebeu nenhuma lata.
A alternativa para Rafael tem sido recorrer ao grupo de Patrícia, onde consegue a doação do alimento.
“Quem vai entrar com processo do Alto Custo não tem como arrecadar valores para comprar a fórmula porque fica altíssimo no final do mês. A gente inclui no grupo as pessoas que precisam da doação e mães que um dia precisaram e conseguiram no Alto Custo [que acabam fazendo a doação]”, afirma Patrícia.
O QUE É A APLV
A Alergia a Proteína do Leite de Vaca (APVL), assim como outras alimentares, é desenvolvida pelo próprio sistema imunológico, que passa a reconhecer o leite (ou outro alimento) como algo ruim e desencadeia a reação alérgica quando ocorre o contato.
Ao ter contato com a proteína, a criança pode ter sintomas como coceira, diarreia, dor abdominal, vômito e vermelhidão. Em alguns casos, a reação pode até ser confundida com problemas respiratórios, dificultando o diagnóstico.
Patrícia, por exemplo, notou os primeiros sinais de que o filho era alérgico 40 minutos após o nascimento, quando o amamentou pela primeira vez. Ele teve manchas na pele, distensão abdominal e gases. Oito dias depois, com a persistência dos sintomas, ela teve que entrar em uma dieta rigorosa.
Isto porque a proteína do leite de vaca consumido pela mãe chega ao bebê por meio da amamentação e provoca a alergia. “Leite, derivado, utensílio de cozinha que eu precisava trocar. Demorei em torno de quatro meses para conseguir me adaptar. Quando consegui, meu menino estabilizou”.