Derretimento de calotas deve acelerar mesmo com meta climática, diz estudo
Pesquisa sugere que mesmo que o mundo cumpra suas metas climáticas, isso pode
não ser suficiente para salvar as camadas de gelo do planeta
As calotas de gelo do mundo estão a caminho de um derretimento descontrolado,
levando a uma elevação do nível do mar de vários metros e a uma migração
“catastrófica” das zonas costeiras, mesmo que o mundo consiga o milagre de
manter o aquecimento global dentro de 1,5 ºC, segundo uma nova pesquisa
publicada nesta terça-feira (20) na revista Communications Earth and
Environment.
Um grupo de cientistas internacionais se propôs a estabelecer qual seria o
“limite seguro” de aquecimento para a sobrevivência das calotas de gelo da
Groenlândia
([https://www.cnnbrasil.com.br/tecnologia/pesquisa-estima-perda-da-camada-de-gelo-da-groenlandia-veja-numeros/])
e da Antártida. Eles analisaram estudos que utilizaram dados de satélites,
modelos climáticos e evidências do passado, como núcleos de gelo, sedimentos
marinhos profundos e até DNA de polvo.
O mundo prometeu restringir o aquecimento global
([https://www.cnnbrasil.com.br/tecnologia/aquecimento-global-ou-mudancas-climaticas-entenda-a-diferenca/])
a 1,5 ºC acima dos níveis pré-industriais para evitar os impactos mais
catastróficos das mudanças climáticas.
No entanto, não apenas esse limite está ficando fora de alcance — o mundo está
atualmente no caminho para até 2,9 ºC de aquecimento até 2100. Mas a descoberta
mais preocupante do estudo
([https://nature.com/articles/s43247-025-02299-w]) é que 1,5 ºC talvez nem seja
suficiente para salvar as calotas de gelo.
Mesmo que o mundo mantenha o nível atual de aquecimento, de 1,2 ºC, isso ainda
pode desencadear um rápido recuo das calotas de gelo e uma elevação catastrófica
do nível do mar, descobriram os cientistas.
Juntas, as calotas de gelo da Groenlândia e da Antártida
([https://www.cnnbrasil.com.br/tecnologia/onda-de-calor-na-antartida-eleva-temperaturas-a-10o-c-acima-do-normal/])
contêm água doce suficiente para elevar o nível global dos oceanos em cerca de
65 metros — um cenário improvável, mas que deve ser reconhecido para compreender
plenamente o risco. Desde a década de 1990, a quantidade de gelo perdido por essas calotas
quadruplicou; atualmente, elas estão perdendo cerca de 370 bilhões de toneladas
por ano. O derretimento das calotas de gelo é o principal responsável pela
elevação dos mares, e a taxa de aumento anual do nível do mar dobrou nos últimos
30 anos. E a tendência é piorar.
Vários estudos sugerem que 1,5 ºC de aquecimento é “muito alto” para evitar o
rápido recuo das calotas de gelo, um processo que seria irreversível na escala
de tempo humana, e que o mundo deve se preparar para metros de elevação do nível
do mar nos próximos séculos, de acordo com o estudo.
“Você não desacelera a elevação do nível do mar com 1,5 ºC, na verdade, você vê
uma aceleração bastante rápida”, afirma Chris Stokes, autor do estudo e
glaciologista da Universidade de Durham. Trata-se de uma ameaça existencial para as populações costeiras do mundo. Cerca
de 230 milhões de pessoas vivem a menos de 1 metro acima do nível do mar. Mesmo
pequenas mudanças na quantidade de gelo contida nas calotas “alterarão
profundamente” as linhas costeiras globais, deslocando centenas de milhões de
pessoas e causando danos que ultrapassam os limites da adaptação, concluiu o
estudo.
Os mares podem subir 1 centímetro por ano até o final do século, ainda dentro da
vida das pessoas jovens de hoje, segundo os cientistas. Nesse ritmo, o que equivale a 1 metro por século, “você verá uma migração terrestre em massa em uma escala que nunca testemunhamos desde o surgimento da civilização moderna”, diz Jonathan Bamber, coautor do estudo e
glaciologista da Universidade de Bristol. Ainda há grandes incertezas sobre onde estão os pontos de inflexão. As mudanças
climáticas não ocorrem de forma linear e não está claro exatamente quando o
aquecimento pode desencadear um recuo rápido e até o colapso. O mais preocupante, segundo os autores do estudo, é que as melhores estimativas
dos limites “seguros” de temperatura para preservar as calotas de gelo continuam
diminuindo à medida que os cientistas compreendem melhor sua vulnerabilidade às
mudanças climáticas.
Modelagens iniciais sugeriam que as temperaturas precisariam atingir cerca de 3
ºC de aquecimento para desestabilizar a calota de gelo da Groenlândia, por
exemplo, mas estimativas recentes indicam que bastariam cerca de 1,5 ºC. Evitar o colapso rápido de uma ou mais calotas de gelo exigiria limitar o
aquecimento global a algo mais próximo de 1 ºC acima dos níveis pré-industriais,
concluíram os autores do estudo.
Isso exigiria cortes drásticos na queima de combustíveis fósseis pelos humanos —
algo que parece extremamente improvável, já que países como os Estados Unidos
continuam apostando no petróleo, carvão e gás.
O mundo já está começando a vivenciar alguns dos piores cenários no que diz
respeito à perda de gelo, afirmou Stokes. “Há muito pouco que estamos observando que nos dê esperança aqui”, afirma. “O
melhor cenário possível é que o aumento do nível do mar seja lento e constante”,
acrescentou.
Os resultados não significam que o mundo deva desistir das metas climáticas, já
que cada fração de grau de aquecimento representa impactos mais graves, segundo
Stokes.
Limitar o aquecimento a 1,5 ºC será uma grande conquista. Deve, sem dúvida, ser
nosso objetivo, mas de forma alguma isso irá desacelerar ou parar a elevação do
nível do mar e o derretimento das calotas de gelo. Aproveite para continuar acompanhando notícias sobre esse assunto e se manter informado sobre como cuidar de nosso planeta da melhor forma.