Motorista e árbitro da Federação Paulista de Futebol larga tudo para criar ONG
para crianças no interior de Pernambuco
Cosme Tavares fundou a ONG Craques da Superação, que oferece aulas de futebol e
alimentação para 49 crianças e adolescentes em Itambé, na Zona da Mata Norte de
Pernambuco.
Árbitro Cosme e crianças no projeto Craques da Superação, em Itambé, na
Zona da Mata Norte de Pernambuco
Um ex-boia-fria que se tornou árbitro em São Paulo largou tudo para, no interior
de Pernambuco, criar um projeto social de futebol para crianças e adolescentes.
Cosme Tavares trabalhou por 20 anos na Federação Paulista de Futebol (FPF),
onde, nas horas vagas do trabalho como motorista, se formou árbitro. Foram quase
400 jogos apitados, até que ele decidiu voltar a Itambé
[https://de.de.globo.com/pe/pernambuco/cidade/itambe-pe/], na Zona da Mata Norte de
Pernambuco.
No projeto social, as crianças e adolescentes têm aulas de futebol e
alimentação, e, em breve, também devem ter aulas de reforço escolar e de
educação emocional e financeira (entenda mais abaixo).
A história de Cosme com o futebol vem desde muito cedo, quando, adolescente, ele
jogava no time juvenil do Engenho Gongo, comunidade camponesa onde ele morava,
em Itambé. Orgulhoso, ele conta que o time chegou a passar um ano inteiro sem
perder nenhum jogo.
Entretanto, aos 17 anos, o pai adoeceu, e ele largou tudo para trabalhar e
ajudar a sustentar a casa. Mas a vida deu um jeito de fazer com que o destino de
Cosme de novo se juntasse ao futebol.
“Abri mão de estudar para ajudar minha família, cortando cana-de-açúcar. Em
1999, meu irmão gêmeo, que morava em São Paulo, me chamou para ir trabalhar lá,
e eu fui. Entrei na igreja e comecei a jogar no time dos crentes. Trabalhei na
companhia aérea Vasp, mas ela faliu. Depois, fiz curso de vigilante, mas fui
demitido. Até que, em 2003, entrei na Federação Paulista de Futebol (FPF)”,
contou.
Na FPF, Cosme entrou como segurança e foi promovido a motorista, cargo em que
permaneceu até 2023, quando largou o emprego para fundar o projeto social. Em
2007, paralelamente ao trabalho, ele começou a se interessar pela arbitragem, e
começou o curso de árbitro.
“Foram dois anos de curso e um de estágio. Comecei na categoria de base, e fui
até a A2. Foram 390 jogos, e eu só não fiz mais porque só era escalado nas
minhas folgas, porque ser árbitro não era meu emprego principal. Foram doze anos
assim, até que, em 2019, comecei a fazer faculdade de administração. Isso se
tornou minha prioridade”, declarou.
A ideia de criar o projeto social veio do contato com os jovens jogadores das
partidas arbitradas por Cosme. Ele contou que, ao ver a felicidade nos rostos
dos meninos, teve vontade de proporcionar o mesmo aos jovens de sua terra natal.
Mas com faculdade, arbitragem e trabalho, a rotina pesou.
“Pedi desligamento do cargo de arbitro, porque não tinha mais tempo para
treinar. Contei ao presidente da federação e pensei ‘poxa, queria criar algo
para levar para a minha cidade, para criar as oportunidades que eu não tive’.
Ele me deu muita força e, em 2021, criei a ONG, mas as aulas só começaram em
2023, quando eu larguei tudo, meus 20 anos de federação, para levar o projeto à
minha cidade”, contou.
Cosme deixou esposa, oito gatos e cachorro em São Paulo e partiu para Itambé,
onde ficou pouco mais de um ano organizando o projeto. No começo, tinha apoio da
prefeitura, e as aulas de futebol aconteciam no ginásio de esportes municipal e
no campo da cidade.
Depois, sem apoio, ele precisou custear por conta própria um campo society, onde
têm sido feitas as aulas. Sem dinheiro e sem patrocínio, Cosme voltou para São
Paulo, para perto da família, para trabalhar como motorista por aplicativo. É
com o próprio trabalho e com a ajuda de parentes que ele mantém o Craques da
Superação.
Ao todo, o projeto atende a 49 crianças e adolescentes. O número era menor que
30 A maioria é menino, com a exceção de uma única garota. Segundo Cosme, não há
distinção de gênero, mas a adesão foi maior entre os garotos.
“Tamara é a única menina, e joga tão bem quanto os meninos. Na páscoa, fizemos
uma ação e demos caixas de chocolate a todos, e ela ganhou duas, por ser a única
menina da turma”, contou.
As aulas acontecem sempre às 16h, nas segundas, quartas e sábados. Nelas, os
alunos treinam as habilidades dentro e fora de campo (veja, no vídeo mais acima,
um dos treinos).
“É um trabalho de habilidade do futebol, ensinando crianças a conviver em
equipe. Também levamos frutas para as crianças, para que elas tenham condições
melhores de jogar. Nosso objetivo é transformar vidas e formar cidadãos através
do esporte. Mesmo não tendo condições muito viáveis, porque não temos apoio de
ninguém, trabalhamos de uma forma séria”, disse Cosme.
Com a ausência do fundador, quem toca a ONG, em Itambé, é um irmão de Cosme e a
cunhada, além de um amigo. Eles são os responsáveis pelas aulas e pelas ações
sazonais que o Craques faz.