Comunidade terapêutica que mantinha dependentes químicos como trabalhadores é condenada por trabalho escravo em Juiz de Fora
Decisão judicial, que ainda cabe recurso, determina o pagamento de R$ 50 mil por danos morais coletivos e R$ 10 mil a cada trabalhador. O governo federal também atualizou a ‘lista suja’, e a empresa foi incluída junto com outras da cidade e região.
A Justiça do Trabalho condenou uma comunidade terapêutica localizada em Juiz de Fora por manter seis dependentes químicos em situação análoga à escravidão. Embora fossem apresentados como “acolhidos”, eles viviam em condições degradantes e eram obrigados a trabalhar.
A decisão, divulgada na segunda-feira (6), determina o pagamento de R$ 50 mil por danos morais coletivos, valor que será destinado ao Fundo de Direitos Difusos, e R$ 10 mil a cada trabalhador por danos morais individuais.
Há um recurso em andamento para tentar reverter a sentença do juiz Luiz Olympio Brandão Vidal, da 4ª Vara do Trabalho, após o Ministério Público do Trabalho (MPT) entrar com uma Ação Civil Pública — ação judicial que serve para proteger interesses coletivos e responsabilizar quem causa danos a alguém.
Ainda na segunda-feira, o governo federal também atualizou a “lista suja”, que divulga os nomes de empregadores que submeteram trabalhadores a condições semelhantes à escravidão, e a Comunidade Terapêutica Tenda do Encontro foi incluída. Entenda mais abaixo.
Em nota, a defesa da Comunidade Terapêutica Tenda do Encontro, representada pelo advogado Flávio Nunes, afirmou que, no processo criminal, a instituição foi absolvida de todas as acusações. Já na esfera trabalhista, foi interposto um recurso. A nota completa pode ser lida ao final da reportagem.
A fiscalização que revelou o caso foi realizada por auditores do Ministério do Trabalho, com apoio da Polícia Rodoviária Federal, em 2023, após uma denúncia da Vigilância Sanitária de Juiz de Fora, que apontou diversas irregularidades.
Confira abaixo quais:
– Seis homens que viviam e trabalhavam no local;
– Três trabalhavam em obras de construção civil e os demais, na cozinha, na horta e na supervisão do espaço;
– Nenhum tinha registro em carteira;
– Os trabalhadores afirmaram atuar como voluntários, mas os fiscais constataram que o trabalho ocorria em troca de abrigo e comida, sem salário e sem registro;
– O local apresentava obras inacabadas, condições precárias de higiene e ausência de saneamento básico.
– Os “acolhidos” residiam na propriedade e exerciam funções contínuas, sem remuneração e sem equipamentos de proteção individual (EPIs), mesmo em obras;
– Os homens eram dependentes químicos e não recebiam acompanhamento médico, psicológico ou social, conforme determina a legislação para tratamento terapêutico;
– O alojamento era improvisado, coberto por telhas de zinco e apresentava várias frestas;
– Os colchões estavam sujos e danificados;
– Havia alimentos vencidos, como feijão e maionese;
– A água usada para beber e cozinhar vinha de uma cisterna sem tampa e sem tratamento;
– Existia risco de explosão em uma panela de pressão com defeito;
– Os homens trabalhavam de chinelos e sem equipamentos de proteção.
Além das indenizações, o juiz determinou que a instituição registre os vínculos na Carteira de Trabalho Digital, pague as verbas trabalhistas e corrija as irregularidades sanitárias e de segurança.
O magistrado destacou que o dano moral “é presumido diante da violação da dignidade humana e da exploração da vulnerabilidade social dos trabalhadores”.