A Origem do Carnaval: do Brasil ao Mundo por José Sarney

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Carnaval e Pero Vaz (por José Sarney)

Qual é a origem do Carnaval?

O Carnaval passa ao largo do mercado, pois não depende dele. Se os bolsos
ficarem vazios, é a Bolsa que fica ameaçada. Carnaval não influencia a taxa de
juros, não a baixa nem a sobe. Assim, nada de preocupações; que seja a alegria.

As queixas procedentes vêm dos saudosistas — e eu talvez seja um deles —, todas
na direção de que o Carnaval se modernizou, perdeu a autenticidade do passado.
Acabaram os pierrôs apaixonados e as colombinas para surgir o biquíni e o
peladão. Maravilha das maravilhas! Isso é o progresso. O mesmo que tirou de moda
a ceroula, o cabeção, o espartilho e colocou as liberdades das musas do
Carnaval: Isabelle Nogueira, Flávia Alessandra, Luciana Gimenez, Alane Dias…

Qual é a origem do Carnaval? Uns, querendo colocar sabedoria, dizem que sua
origem está nas saturnais romanas, festas bem moderninhas em que se celebrava a
entrada da primavera de maneira bem exuberante. Falam que ele veio de um tal
carro-naval, que nada mais era do que um navio de rodas, cheio de marinheiros
que cantavam canções obscenas nas ruas da Grécia antiga nas mudanças de estação.

Melhor imaginação tiveram aqueles que dizem ser estas festas e alegrias
necessárias à preparação do corpo para o jejum da Quaresma. Os italianos
chamavam esse tempo de “Carne! Vale!”, “Carne, vá em frente, caia na gandaia”.
Outros exegetas colocam nas costas da igreja a responsabilidade da palavra
Carnaval e a atribuem ao Santo Papa Gregório, o Grande, que chamou o domingo
anterior à Quaresma de “dominica ad carnes levandas”, isto é, o domingo de
sublimação da carne. O nome pegou por portas e travessas para Carnaval.
Relembrava uma velha definição dos três dias antes da Quaresma, em que monges
medievais davam-se a muitas liberdades, comiam e bebiam etc. e tal para resistir
às tentações no tempo quaresmal. E alegavam que assim faziam imitando os camelos
antes de atravessarem o deserto.

Carnaval, na Espanha, só termina, como na Bahia, no domingo depois da
Quarta-Feira de Cinzas. Perdão! Na Bahia, não termina nunca. Em Veneza, começa
no Dia de Reis e lá vai aquela coisa chata de gôndolas e bandolins. Lembro essas coisas para dizer que o Carnaval não é nada disso. Ele nasceu no Brasil, sem primavera, nem saturnais, nem o Papa Gregório. O Carnaval brasileiro
tem origem e cultura próprias. Sua certidão de nascimento é a Carta de Pero Vaz
de Caminha, em 1500, quando descreve o descobrimento do Brasil. A chegada logo
se transformou no primeiro carnaval, os índios na praia, de “carapucinhas
vermelhas”, “contas amarelas”, pintados e de maracás, os portugueses batendo
tambor, todos bebendo, dançando e caindo numa bruta gandaia. Temos até o nome do
primeiro folião, Diogo Dias, que tocava gaita, “homem gracioso e de prazer”, que
comandava a folia. A diferença é que era Páscoa, mas, na Bahia, todo tempo é bom
de Carnaval.

A globeleza, que se pensa ser criação de hoje, da Globo, já estava lá. E não era
uma só, eram muitas. Diz Caminha que as índias participavam da festa e eram “bem
moças e bem gentis, com cabelos mui pretos e suas vergonhas tão altas e tão
cerradinhas e tão limpas de cabeleiras que, de muito as olharmos, não tínhamos
nenhuma vergonha”. Enquanto isso, nas nossas rádios e tevês, comandantes encarregados do
policiamento já dão instruções ao povo: “Não beba. Se beber, não dirija. Leve só
a roupa do corpo”. E, finalmente, “Não perca seu bloco e use a camisinha”.
Bom Carnaval!

José Sarney foi presidente

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