Em alta no Betis, Antony sonha com Copa do Mundo e cita recusa ao Bayern:
“Balançou muito”
Brasileiro recebeu ligação de Kompany antes de a janela fechar; hoje ídolo na Espanha, superou problema extracampo que o atrapalhou na Seleção e também um fim sem brilho no United
Antony revela ligação de Kompany, do Bayern: “Me balançou bastante”
Cria do Inferninho, favela localizada em Osasco, Antony vive momento de céu de brigadeiro. Esteve na na primeira convocação de Carlo Ancelotti, é ídolo no Betis e alimenta esperança em disputar mais uma Copa do Mundo. Tem seis gols marcados e duas assistências na temporada. No clube espanhol reencontrou o bom futebol e despertou interesse de um gigante como o Bayern de Munique.
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Antony é cria da favela do Inferninho — Foto: Reprodução
Mas não se engane. Se o nome da comunidade onde nasceu não tem conotação positiva, o reencontro de Antony com o “favelado” que sempre existiu em seu coração foi o ponto de partida para promover uma reviravolta pessoal. Saiu de um Manchester United onde estava à sombra das poucas oportunidades concedidas por Ruben Amorim para, num curto empréstimo, conduzir o Betis à primeira parte da tabela de LaLiga e à final da Conference League com grande protagonismo.
Agradou tanto que acabou contratado em caráter definitivo, e olha que quase foi parar no Bayern de Munique. A palavra dada aos espanhóis prevaleceu, apesar de uma ligação de Vincent Kompany, técnico do time alemão, tê-lo balançado. Em entrevista que durou quase 30 minutos, o brasileiro de 25 anos passou a limpo o momento de crescimento.
Hoje em alta, Antony viveu o momento de maior emoção em maio, quando, a três dias de disputar a final da Conference League, ouviu seu nome constar na lista de Ancelotti. A notícia veio quando estava concentrado em Breslávia, na Polônia, local da decisão, e mexeu tanto com o coração do atacante que ele teve de se recompor para deixar o quarto e ir encontrar os companheiros no saguão do hotel.
> – Cara, para mim, foi mais emocionante do que a própria primeira convocação, acho que pelo contexto das coisas pelas quais eu passei. Eu me emocionei muito ali, foi um momento que eu não conseguia parar de chorar, tive que esperar um pouquinho no quarto para depois descer para o jantar, porque eu tinha acabado de chegar na Polônia, a gente jogaria a final.
Antony usará chuteira especial em homenagem ao GP do Brasil — Foto: Puma/Divulgação
– E eu cheguei (para ouvir a convocação) exatamente no momento em que o Ancelotti começou a dizer os nomes. Estava bem ansioso, e, quando eu escutei meu nome, foi um momento de muita emoção. Não só pra mim, mas para a minha família também. Já liguei para minha mulher, meus irmãos e meus pais. E todo mundo muito emocionado, porque passamos por muitas coisas e em pouco tempo aqui no Betis eu dei essa reviravolta e consegui voltar para a Seleção – disse Antony, atacante que joga fora do país com mais participações em gols dentre os convocados desde a chegada de Ancelotti.
Uma das “muitas coisas pelas quais passou” foi um processo movido em 2023 por uma ex-namorada que o acusou de agressão física e ameaças. O problema fez Antony ser cortado de jogos da seleção brasileira contra Bolívia e Peru, pelas eliminatórias da Copa, em setembro do ano em questão. Em agosto do ano passado, o atleta conseguiu provar sua inocência, e o inquérito foi concluído sem que ele fosse indiciado.
Superado o problema extracampo, Antony também venceu as dificuldades esportivas. Num primeiro momento, pensou que o empréstimo para o Betis seria um passo para trás, mas na sequência certificou-se de que tomara a melhor decisão possível. Reencontrou a essência de favelado, voltou a driblar e a empilhar golaços.
– Cara, quando eu falo isso (que voltou a ser o “Antony favelado” em declaração postada via Instagram), eu quis dizer de encontrar comigo de novo, de me encontrar feliz, de ver a minha família ali sorrindo e eu estar conseguindo sorrir de novo, porque eu passei por alguns momentos difíceis que até um sorriso ali me custava muito. E quando eu falo que me encontrei é pela forma que me trataram aqui (no Betis), pelo carinho com que todos me receberam aqui, de me encontrar comigo e de estar feliz nos pequenos detalhes.
> – Na favela, por mais difíceis que fossem situações pelas quais estava passando, eu estava muito feliz. E eu consegui enxergar isso em mim de novo, às vezes um gesto simples, pequeno, que me fazia feliz. Então, quando eu uso essa palavra, é isso: é estar feliz em qualquer situação.
O bom momento com a camisa do Betis trouxe apelido e comparações de carona. Virou Antônio de Triana, referência a um dançarino flamenco do início do século 20 conhecido pela influência que tinha dentro do bairro de Triana. Recentemente foi chamado de “Lionel Antony” por ter feito contra o Lyon um gol muito semelhante ao primeiro de Messi como profissional, em 2007, quando o craque encobriu o goleiro adversário após passe magistral de Ronaldinho Gaúcho.
– Graças a Deus, eu fiz golaços aqui, né?. Os jogadores até brincam lá: “Pô, você não vai fazer nenhum gol feio?”. É claro que tem o da Fiorentina, que é muito importante, que é numa semifinal em que a gente avança. O mais bonito para mim foi contra o Espanyol, um golaço que eu fiz ali nos acréscimos. Mas acho que de importância posso colocar acho que o da Fiorentina, porque foi um passo muito importante ali para a gente.
– O Messi é um cara que eu tenho como referência. Fico muito feliz de poder fazer aquele golaço, e o Messi é um cara que eu sempre acompanho desde pequeno. Ele tem a história incrível dele, respeitado por todos, por mim mesmo. Eu sempre acompanhei, sempre gostei muito do futebol e me sinto feliz de poder ter feito esse golaço contra o Lyon.
Hoje nos braços da torcida com seus 15 gols e oito assistências em 37 partidas, Antony também está muito feliz com a vida em Sevilha. A temperatura, a receptividade, a culinária e a língua ajudaram. A adaptação foi muito rápida, a família adorou, e a opinião de Lorenzo, um de seus dois filhos (também é papai de Lavinne), pesou. Tanto que esse foi um dos fatores considerados pelo jogador na hora de dizer não ao gigante Bayern de Munique.
– Cara, vou abrir o jogo com você assim, 100% agora. Me balançou bastante. A gente está falando de um gigante mundial, do Bayern de Munique, onde um treinador, com a história que tem, que é o Kompany, me liga. E a gente tem uma conversa ali, foi supereducado comigo, falou que sempre gostou muito do meu futebol e isso às 11 horas da noite, 11 e pouco.
> – E, querendo ou não, me balançou muito. Pela grandeza do clube, pela grandeza do treinador e pela forma que ele me abordou que ele conversou comigo. Mas o que pesou bastante é a decisão em família também, cara. É olhar para os meus filhos. O Lorenzo ama esse lugar, ama essa cidade. Quando a gente estava de férias no Brasil, sem saber de nada, ele sempre falava: “Pai, quando a gente vai voltar para a Espanha?”.
CONFIRA OUTROS TÓPICOS DA ENTREVISTA DE ANTONY:
Você se entrosou muito bem com o Isco, que voltou recentemente à seleção espanhola e teve grande passagem pelo Real Madrid. Quando anunciado seu retorno definitivo ao Betis, ele fez muitos elogios a você. O que representa?
– Eu sempre fui um homem muito bom de grupo, sempre soube chegar assim nos ambientes. Me sinto muito feliz por esse reconhecimento, não só dele, mas de toda a equipe. E está sendo uma honra enorme jogar com o Isco. A gente se dá muito bem, conversa bastante e, inclusive, todo dia está sempre brincando junto. É bom que ele já está treinando, está perto de voltar. E é visível para todos que a gente tem uma conexão muito boa.
– E quando eu estava na Inglaterra, ele me escrevia bastante: “pô, Antony, vai vir ou não vai?” Falava: “Não sei, mas está quase dando certo e tal”. E agora que ele machucou – e bom que ele já tá se recuperando – eu falei: “Agora eu que estou te esperando para a gente jogar, desfrutar junto”. Então, o Isco é um grande jogador, não só um grande jogador, mas também uma grande pessoa. Me acolheu muito bem, e a gente se dá perfeitamente dentro de campo e fora também.
Apesar de você estar em alta aí, um gigante como o Bayern te procurou, e quase impediu seu retorno ao Betis. A ligação do Kompany foi no fim da janela?
– Isso, fechava a janela no outro dia às sete ou oito horas da noite, se eu não me engano, ou era meia-noite. No último dia mesmo que as coisas aqui andaram com o Betis que aconteceu na ligação do Bayern de Munique também.
Você ficou balançado, mas a opinião da família pesou. O que mais te segurou no Betis?
– Claro que aqui é um lugar onde eu sou muito feliz, onde há o carinho de todos que me receberam. A decisão foi tomada por mim também por estar bem, feliz e por saber como que é o meu dia a dia aqui. E também porque estava tudo certo com o clube já, por eu ter dado a palavra. Estava tudo apalavrado, eu não poderia também fazer isso comigo e nem com o clube. Então a decisão foi muito em família também.
Antony fala do sonho de jogar mais uma Copa e cita convocação: “A mais emocionante”
O grande fim de temporada no Betis o levou de volta à Seleção e você está na briga por uma vaga na Copa. Pensa muito nisso?
– Apesar de já ter disputado uma Copa do Mundo, é um sonho disputar outra. Claro que eu fico aqui ansioso, eu fico sonhando com esse momento porque vestir a camisa da Seleção e representar o país inteiro é muito gratificante. Eu sei o tanto de pessoas que torcem por mim também e que eu represento. Estou fazendo a minha parte aqui, muito tranquilo em relação a isso. Tento sempre melhorar a cada jogo, a cada treino, eu sou uma pessoa que me cobro bastante, e o que tiver no meu alcance, o que tiver no meu controle, eu vou fazer. Vou estar sempre 100% preparado, fazendo o meu trabalho para voltar a vestir a camisa da Seleção, porque para mim é um sonho de estar disputando mais uma Copa do Mundo.
Você não viu o penta, em 2002, porque era muito pequeno. Já pensou em ajudar o Brasil a conquistar o hexa?
– Olha, eu sonho muito com isso. Eu não pude viver isso, infelizmente na Copa passada bateu na trave contra a Croácia, quando a gente foi eliminado. Mas ter um treinador como o Ancelotti na Seleção nos agrega muito, por ser um treinador tão vitorioso como é. E, bom, é claro que eu tenho um sonho de poder estar ajudando a seleção brasileira a ganhar uma Copa do Mundo. Vou continuar trabalhando para conquistar isso. E por isso que eu vou estar sempre preparado aqui para realizar essa missão de estar jogando na segunda Copa do Mundo.
Ainda sobre o sucesso no Betis, conta que conversa é essa de Antônio de Triana…
– É sobre isso mesmo, sobre o bairro de Triana, é como se fosse o dono da cidade. E, bom, eu sou muito grato pelo carinho, não só por isso (o apelido), mas desde o momento que eu cheguei aqui, da forma que eles me receberam, que eles me trataram, o carinho que tem. Sempre me chamam de Antônio aqui, e sou muito grato. Sempre quando jogo, eu tento sempre retribuir todo esse carinho que eles têm por mim. Junta tudo, é uma loucura aí, que até no começo eu meio que fiquei confuso, tive que perguntar para algumas pessoas do clube e eles me explicaram mais ou menos isso também.
Sevilha é um lugar legal de se morar?
– Cara, é muito top, né? A gente vem do Brasil, um país caloroso, a comida aqui tem muita coisa parecida, é uma cidade incrível, uma das cidades mais quentes da Espanha. Inclusive está no inverno aqui, mas o sol está aqui todos os dias, de manhã, de tarde, diferentemente da Inglaterra que já está um frio, já está chovendo. Aqui é muito diferente, uma cidade à qual me adaptei muito rápido, a comida, o tempo, o dia a dia aqui, as pessoas também. Então a gente que vem do Brasil está acostumado com isso, eu que estou na Espanha agora, vejo essa diferença, vejo que é uma coisa muito similar, similar do Brasil, e é por isso que eu me adaptei bem rápido aqui. E a língua espanhola é mais fácil, né, cara, que o inglês, né? Pega mais rápido.
Antony diz que família o ajudou a retomar após provar inocência em acusação de violência
– Envolve muitas coisas, o meu extracampo me atrapalhou bastante e, consequentemente, você também não tendo minutos em campo, não tendo oportunidade, me afetava muito mais, porque eu sou um jogador que trabalha muito. Eu quero sempre estar jogando, quero estar bem. E das coisas que eu passei extracampo, é até importante tocar no assunto das coisas que eu fui acusado. Também me afetou bastante, porque eu sou um pai de família. Então era muito difícil para mim, ainda mais por não estar jogando também, era outra situação que me afetava bastante.
– Não, eu creio que foi mais sobre acusações mesmo, acho que eu entrei nesse assunto porque foram coisas que realmente me afetaram. Tenho família, tenho mulher, tenho filhos. E, querendo ou não, falar que não me afeta é mentira, porque afeta, sim. É onde você é cortado da seleção, onde você é afastado de treinamentos, e depois prova a inocência. Então foi um período ali bem complicado para mim.
Extracampo à parte, seus últimos momentos no United com o Ruben Amorim foram complicados, e você disse ter se sentido desrespeitado quando teve que treinar à parte antes de ser vendido ao Betis. Conte um pouco sobre isso.
– Sim, quando eu falo que me sinto desrespeitado, foi até por algumas pessoas também que não vêm ao caso. Acho que eu sou um cara que não gosta de entrar em polêmica, não gosta de citar nomes nem nada, mas foi um pouco difícil. Um pouco difícil não, bastante difícil, porque é muito complicado para mim também. Não fiz pré-temporada e tive que me apresentar em outro clube. Graças a Deus, eu sempre me cuidei bastante, então consegui chegar bem aqui (no Betis) no primeiro jogo, já jogar os 90 minutos. Fazia três ou quatro meses do meu último jogo. Não é fácil o fato de o clube do time estar treinando de manhã, e eu estar treinando às cinco horas da tarde, para eu não ter acesso à equipe.
– E, sim, me senti um pouco desrespeitado, mas isso faz parte também, não tenho mágoa, não tenho raiva de ninguém ali. Isso serve muito de aprendizado para eu saber lutar com as armas certas e com sabedoria quando passar por certas situações, porque isso faz parte da vida, faz parte do processo. Inclusive eu sou muito grato ao Manchester também, porque não vivi só momentos ruins, mas vivi momentos legais ali também, com pessoas que eu conheci legais também. Agora




