Há nove anos, em 19 de junho de 2008, foi sancionada a Lei 1.705, a Lei Seca. Mesmo após a proibição de associar álcool e direção, para muitos brasileiros beber e dirigir ainda é uma prática. Em 2016, 7,3% da população adulta das capitais brasileiras declararam que bebem e dirigem. No ano anterior, o índice foi de apenas 5,5%. Um aumento de 32%, em apenas um ano, segundo os dados da Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas, por inquérito telefônico (Vigitel), do Ministério da Saúde.
Dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade do Ministério da Saúde mostram que o número de mortes em decorrência de acidentes de trânsito caiu mais de 11% em todo o país. Em 2015, 38.651 pessoas foram vítimas do trânsito, contra 43.780 óbitos registrados no ano anterior. Há, no entanto, diferenças regionais, enquanto os estados de São Paulo, com 1.169 óbitos registrados, o Rio de Janeiro, com 709, e a Bahia, com 472, apresentaram a maior redução de mortes no trânsito, Paraíba, com 62 mortes, Sergipe, com 39 e Roraima, com 18, tiveram aumento no número de óbitos.
Para o professor do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade de Brasília (UnB) Pastor Willy Gonzales Taco, especialista em trânsito, em quase dez anos de Lei Seca, infelizmente, mudou pouco o comportamento das pessoas. “Apesar da lei, de campanhas, ainda há um processo lento em se fazer transformações no comportamento das pessoas”, disse. “A lei é um instrumento que leva a refletir sobre a vida das pessoas. Muitos acidentes que acontecem são inconcebíveis. As pessoas tinham formação, tinham conhecimento amplo”.
Ao longo dos anos, a Lei Seca foi ficando mais rígida, com atualização do valor da multa e outras penalidades. Atualmente o condutor que ingerir qualquer quantidade de bebida alcoólica e for submetido à fiscalização de trânsito está sujeito a multa no valor de R$ 2.934,70 e suspensão do direito de dirigir por 12 meses. Em caso de reincidência, o valor da multa é dobrado.
Para o delegado de Polícia Civil e professor de Direito Penal do Centro Universitário Marcelo Zago, as pessoas ainda estão se adaptando à nova realidade. “Tem sido feita uma campanha de reeducação progressiva. Quando a lei vem severa em pouco espaço de tempo pode ocorrer um fenômeno que é o de ela não pegar”. Segundo ele, é questão de tempo. Ele compara a situação ao uso do cinto de segurança, que na década de 1980 era inconcebível e hoje todos usam. “Daqui a 15, 20 anos, vamos olhar para trás e ter a mesma atitude com as bebidas. Será inadmissível beber e dirigir”.
Publicidade e fiscalização
Segundo a coordenadora do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (Cisa), especialista em dependência química, Erica Siu, houve redução dos acidentes e mortes depois da Lei Seca e isso traz benefício para a população como um todo. No entanto, disse, ainda falta fiscalização. “Precisa ser constante. Em períodos mais propensos, como o carnaval, as férias, festas, as campanhas prevalecem. Elas deveriam ocorrer o ano todo”, defendeu. “As pessoas não podem apenas evitar blitz, mas em evitar acidentes, evitar mortes”, disse.
De acordo com a coordenadora, não existem níveis seguros de consumo e nem mesmo um período exato que a pessoa possa dirigir após beber. “O álcool tem efeito variável em cada pessoa. Pode parecer que não tem efeito nenhum, mas na verdade tem. Quando se ingere uma pequena dose, há estudos que mostram que há efeito na coordenação motora e nos reflexos. Varia se a pessoa comeu ou não, varia de acordo com a idade”.
As campanhas de conscientização, assim como a fiscalização, são feitas tanto a nível nacional quanto local. Segundo o Ministério da Saúde, a pasta desenvolve, desde 2010, uma ação nos pontos com maiores problemas e maior fiscalização, principalmente no que se refere ao álcool e direção e à velocidade excessiva e ou inadequada.
O programa Vida no Trânsito, segundo o ministério, ressalta a importância da articulação do setor saúde com o trânsito no cumprimento do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) nos componentes da vigilância, com informação qualificada, monitoramento das lesões e mortes e fatores de risco, prevenção e cuidado pré-hospitalar, hospitalar e de reabilitação ofertado às vítimas. O programa é praticado em cinco capitais do país: Belo Horizonte, Campo Grande, Curitiba, Palmas e Teresina. A partir de 2013, foi implantado nas demais capitais, e em alguns municípios, como Guarulhos (SP), Campinas (SP), São Gonçalo (RJ), São José dos Pinhais (PR) e Foz do Iguaçu (PR).