Represamento, exames e envelhecimento: o que explica alta de atendimentos por câncer de tireoide na região de Campinas
Dados da Secretaria de Saúde de SP mostram crescimento de 321% em 2024, comparado a 2023; docente da Unicamp aponta causas e alerta para cirurgias desnecessárias.
Cresce número de atendimentos por câncer de tireoide em 2024 no estado de São Paulo.
Os atendimentos por câncer de tireoide no Departamento Regional de Saúde (DRS) de Campinas cresceram 321% em 2024, segundo dados da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Foram 539 registros, contra 128 em 2023. As internações também aumentaram, mas em ritmo menor. Foram 179 em 2021, 223 em 2022, 210 em 2023 e 314 em 2024, o que representa um crescimento de 49,5%. De janeiro a junho de 2025, a região de Campinas registrou 133 internações.
Segundo a professora Laura Sterian Ward, da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, os dados se referem a atendimentos por suspeita de câncer de tireoide, e não necessariamente a casos confirmados. Ela aponta três fatores principais para o aumento: envelhecimento da população, nódulos na tireoide, sejam benignos ou malignos, tendem a surgir com o avanço da idade; melhor acesso ao diagnóstico, exames como o ultrassom estão mais disponíveis e conseguem identificar tumores muito pequenos; represamento causado pela pandemia, muitos pacientes deixaram de buscar atendimento nos últimos anos e agora estão procurando diagnóstico e tratamento.
Apesar do crescimento expressivo nos atendimentos, a maioria dos nódulos é benigna e não exige cirurgia, o que explica o aumento mais discreto nas internações. “Cânceres pequenos, únicos e sem extensão para os gânglios podem ser tratados com vigilância ativa, ou seja, sem cirurgia”, explica a docente. Ward também destaca o papel dos testes moleculares, que ajudam a identificar com maior precisão se um nódulo é maligno ou não.
Em artigo publicado na revista Nature Reviews Endocrinology, a professora aponta que países de baixa e média renda enfrentam dificuldades para acessar tecnologias básicas no tratamento desse tipo de câncer, enquanto nações mais ricas lidam com o excesso de diagnósticos e intervenções desnecessárias. O trabalho foi escrito em conjunto com o professor Lucas Leite Cunha, da Unifesp. Eles explicam que o avanço tecnológico, especialmente com o uso disseminado de ultrassonografias de alta resolução, tem levado à identificação de microcarcinomas papilíferos de baixo risco, que muitas vezes não causariam sintomas nem colocariam a vida do paciente em risco.
A solução para casos de baixo risco pode estar na vigilância ativa e em ablação por radiofrequência ou laser, alternativas à cirurgia.