UFSC contesta Sérgio Sacani após influenciador e cientista afirmar que estudantes invadiram evento
A Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) desmentiu a fala do cientista e influenciador Sergio Sacani em um podcast sobre uma suposta confusão na abertura de um evento na instituição. Em um vídeo que viralizou nas redes sociais, ele afirmou que o local onde palestrava foi invadido por estudantes. Em nota na quinta-feira (19), a UFSC esclareceu que alunos apenas afixaram, de forma pacífica, faixas no palco questionando a representatividade da mesa.
A fala de Sacani foi retirada de um trecho de um episódio do RedCast, que contava com o ex-deputado federal Arthur do Val, na segunda-feira (16). Sacani fez o comentário ao falar sobre a mesa de abertura realizada em 6 de novembro, em Florianópolis, na Semana de Ensino, Pesquisa e Extensão (Sepex).
Além de Sacani, participaram da mesa a professora da UFSC Regina Rodrigues e o psicólogo Eslen Delanogare. Conforme a UFSC, antes do evento, estudantes do Centro Acadêmico Livre de Psicologia (Calpsi) colocaram as faixas no palco “questionando a abordagem acadêmica e profissional adotada por um dos convidados e a falta de representatividade étnica, racial e gênero na composição da mesa”.
Em nota, o Calpsi repudiou a fala de “teor racista e anti-indígena” do influenciador e que, em paralelo, o outro convidado da mesa, Eslen Dalanogare, afirmou em suas redes sociais que “alguns estudantes queriam boicotar a mesa por ‘motivações políticas” e que “esse barulho vinha de pouquíssimas pessoas” (leia a íntegra da nota, publicada nesta sexta-feira (20), no fim da matéria).
Sergio Sacani é fundador do Space Today, um canal de astronomia brasileiro. Ele foi procurado pela reportagem do DE nesta sexta-feira (20), mas não houve retorno. A reportagem também procurou Dalanogare por meio da assessoria dele, e a professora Regina, por meio da assessoria da universidade. Não houve retorno até a última atualização do texto.
A UFSC afirmou que manteve os cartazes no palco por “compreender a manifestação estudantil como legítima e alinhada à tradição democrática e de pluralidade de ideias próprias do meio universitário” e que Sérgio Sacani não será mais convidado para eventos durante a atual gestão (leia íntegra da nota mais abaixo). “A Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), na condição de organizadora da 21ª Semana de Ensino, Pesquisa, Extensão e Inovação (Sepex) da UFSC, ocorrida entre 6 e 10 de novembro, vem a público esclarecer que, diferentemente da informação que circula nas redes sociais desde a terça-feira, 17 de dezembro, não houve invasão em qualquer espaço da UFSC durante a realização do evento, o que inclui a mesa de abertura realizada no dia 6 de novembro no Auditório Garapuvu do Centro de Cultura e Eventos, intitulada ‘Cosmos, Vida na Terra e Saúde Mental: Uma Viagem Científica’, que contou com a participação dos convidados Sérgio Sacani, Eslen Delanogare e da professora Regina Rodrigues”.
Nos últimos dias foi viralizado, na rede social X (Twitter), um corte de um vídeo no podcast Redcast em que Sérgio Sacani afirma que “estudantes invadiram a mesa” para protestar que ela “não representava ninguém” e ainda diz que “eles queriam um índio, uma trans, um viado e um negro”. Dessa forma, demarcamos nosso repúdio frente a fala de Sérgio, de teor racista e anti-indígena, na qual pontuamos ser bastante infeliz por corroborar com discursos de ódio contra as populações citadas. Em paralelo, o influenciador digital e psicólogo Eslen Delanogare afirmou em suas redes sociais que alguns estudantes queriam boicotar a mesa, por “motivações políticas”, que “esse barulho vinha de pouquíssimas pessoas” e que, apesar disso, ‘há muitos professores e estudantes na universidade que levam a educação a sério.
Trazemos esses dois posicionamentos, porque se tratam de dois dos três palestrantes da mesa “Cosmos, Vida na Terra e Saúde Mental” que, no dia 6 de novembro de 2024, abriram a Semana de Ensino, Pesquisa, Extensão e Inovação (Sepex) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Sérgio Sacani é uma figura pública que se propõe a ser um divulgador científico na Internet, entretanto, conforme a descrição da sua entrevista ao Redcast, conta o ocorrido na UFSC de maneira sensacionalista, tentando ridicularizar os estudantes que traziam um questionamento válido, Já Eslen Delanogare critica a manifestação, dando a entender que, por ter um posicionamento político, este grupo “não leva a educação a sério”. No entanto, é por levá-la a sério que nos manifestamos naquele momento e viemos a público, novamente, dar alguns esclarecimentos.
Quando decidimos fazer essa manifestação, postamos um posicionamento no Instagram, no mesmo dia da abertura da Sepex, que questiona a perspectiva e visão de mundo de uma mesa sobre saúde mental na abertura do evento. Evento esse que se propõe a apresentar à comunidade a produção realizada pela comunidade acadêmica, mas que não buscou o Departamento de Psicologia para dialogar acerca das produções em torno de um dos eixos de discussão da mesa. Em nenhum momento essa decisão foi tomada de forma individual, e sim após discussão coletiva.
O evento da Sepex é um importante espaço de divulgação da Universidade Pública e da ciência que vem sendo produzida pela UFSC. Destacamos que, diante dos recorrentes ataques à educação pública, sejam eles ataques ideológicos ou orçamentários, espaços como esse se tornam fundamentais para a apresentação e aproximação entre comunidade academica-comunidade externa. Nesse sentido, questionamos a concepção de ciência que estava sendo colocada nessa palestra, e também, como essa não representa a pluralidade dos conhecimentos e das ciências produzidas nesse espaço, ainda mais, pensando o curso de Psicologia da UFSC. Isto é, defendemos uma ciência voltada às necessidades de toda a população brasileira, ou seja, implicada com mudanças sociais (e politicas!) que garantam condições dignas de vida, promovendo saúde. Assim, o entendimento de saúde e saúde mental apresentados na mesa, pautado numa perspectiva individualista e biologicista, se mostrou distante da realidade e materialidade brasileira, da saúde pública, da saúde coletiva e de um entendimento não individual, ainda que necessariamente singular, dos processos de saúde-doença.
Vale ressaltar que um tema tão importante como “Cosmos, Vida na Terra e Saúde Mental” deve, sim, ser debatido e colocado em questão, porém sem que se perca a complexidade e o aprofundamento que essa temática exige. Desse modo, questionamos a ausência de algumas pessoas e conhecimentos, já muito bem produzidos e consolidados, para estar compondo esse debate. Tais como pesquisadores e conhecedores indígenas, quilombolas, negros, trabalhadores e usuários da rede de saúde. Assim, foi feita a confecção de cartares a fim de trazer essas reflexões para a palestra, nos cartazes perguntamos: “Sepex, qual sua ideia de ciência?” e “Quem essa mesa representa?”, além de demarcar nosso posicionamento com as faixas “A saúde será coletiva ou não será e “Psicologia UFSC na Luta Antimanicomial”.
Ninguém “invadiu a mesa até porque este foi um evento público- nem disse que ela “não representava ninguém” porque também entendemos que ela representa, sim, um grupo especifico de pessoas mas pendurou alguns cartazes questionando essa representatividade, de forma pacifica e legítima.
Dessa forma, o CALPSI se mantém aberto ao dialogo, prezando pelo respeito, valorização e manutenção da Universidade Pública.