Um documento encaminhado pelo Ministério Público Federal em Goiás (MPF-GO) à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) aponta irregularidades no avião que transportava a cantora Marília Mendonça. A denúncia ocorreu em maio e foi encaminhada no mês seguinte ao presidente da autarquia, Juliano Noman.
A aeronave, que caiu na última sexta (05), e levou à morte a sertaneja e outras quatro pessoas, teria problemas estruturais. Além disso, a empresa Pec Taxi Aereo Ltda, proprietária do bimotor, apresentava pendências trabalhistas e burlava licitações e avaliações da Anac.
Na denúncia feita pelo procurador da República Marcello Santiago Wolff, ele informa que as solicitações de averiguação não são inéditas e pede uma solução por causa do perigo iminente de uma tragédia.
“A empresa acumula irregularidades que coloca em risco tripulantes e passageiros, mesmo diante de denúncias repetidas à ANAC, a empresa nunca passou por auditoria a fim de serem averiguadas as irregularidades”, frisa ele. O prazo para a Anac, responsável pela fiscalização de supostas irregularidades na prestação de serviços de táxi aéreo, era de 20 dias.
Estrutura
De acordo com o Registro Aeronáutico Brasileiro (RAB), o avião estava em situação regular com o Certificado de Verificação de Aeronavegabilidade (CVA) válido até 01 de julho de 2022. Pelo RAB, a empresa tinha autorização para operar táxi-aéreo.
No entanto, a empresa realizava voos mesmo tendo conhecimento de problemas no para-brisa desde o início deste ano. Segundo o procurador, isso dificultava a visibilidade nos pousos e decolagens porque embaçava o vidro. A Anac, denunciou ele, foi informada, mas nunca vistoriou o avião.
Fraudes
O MPF-GO indica que a empresa Pec Taxi Aereo Ltda teria fraudado processos licitatórios em dois estados brasileiros e também avaliações técnicas da própria Anac.
A informação seria oriunda de várias fontes que reclamam da mesma prática em Rondônia e Roraima: meios ilícitos para ser contemplada em licitações e meios ilícitos de burlar a ocorrência de auditorias e vistorias da autarquia.
Problemas trabalhistas
As questões trabalhistas ocupam boa parte da manifestação redigida em maio. Das seis denúncias, quatro são de problemas relacionados à jornada e condições de trabalho. Uma delas, inclusive é de desigualdade de gênero.
A jornada de trabalho extenuante e o “jeitinho” para resolver a troca em escalas de serviço foi destacada pelo procurador. Ele alega que a empresa desrespeita a folga social dos pilotos e que altera informações junto à Anac.
“É recorrente que a empresa coloque pilotos com jornada de voo estourada para voar, lançando mão do código da ANAC de outro piloto com hora voo liberada, fato presenciado em diversos voos tanto executivos quanto aeromédico na empresa”, descreve.
Wolff denuncia que a empresa deixa claro à coordenação de voos para não escalar mulher para voo com pernoite a fim de não ter custo com quarto separado. Ele afirma ainda que a Pec não respeita a regulamentação de que, em caso de pernoite, cada tripulante deve ter seu quarto individual, submetendo o funcionário à divisão de quartos.
Ele relata no documento irregularidades infraestruturais com potencial risco à saúde de tripulação e passageiros, principalmente porque o avião faz transporte frequente de pacientes com covid-19.
“A instalação da maca, fiação elétrica e cabeamento de oxigênio destinados ao aeromédico são precárias e fora das normas ideais de segurança; bem como a limpeza da aeronave deixa a desejar”, afirma.
Ligação
Apesar dos problemas trabalhistas, o Ministério Público do Trabalho em Goiás (MPTG-GO) afirma que não pode relacionar essas questões ao acidente de avião que causou a morte de Marília Mendonça, de seu produtor Henrique Ribeiro, seu tio e assessor Albicieli Silveira Dias Filho, o piloto e o copiloto, em Piedade de Caratinga (MG). O órgão abriu um inquérito civil para realizar apuração das denúncias e na semana que vem deve ouvir os funcionários.