Sem usura: Banco do Vaticano dá lucro, mas bancões ganham quatro vezes mais
Retorno sobre patrimônio (ROE) da instituição financeira da Santa Sé é muito
menor que o registrado pelos grandes no Brasil
“O dinheiro deve servir, e não governar”. Histórica, a frase do papa Francisco
parece pautar a gestão do braço financeiro da Santa Sé, o Banco do Vaticano.
Após anos com escândalos, a instituição vive atualmente um momento de relativa
calmaria: dá lucro, mas emite fortes sinais de resistência ao pecado da usura.
E, assim, o retorno do banco não chega a um quarto do visto nos bancões
brasileiros.
O último balanço anual do IOR, sigla em italiano para o Instituto para as Obras
de Religião, mostra que o ano de 2023 foi muito bom para o Banco do Vaticano. No
período, a instituição teve lucro líquido de € 30,6 milhões, 3,4% mais que no
ano anterior.
Jean-Baptiste Douville de Franssu, presidente do Conselho do banco, explicou que
o resultado melhorou especialmente pelo forte aumento das operações de
intermediação financeira. Essa é a atividade básica de um banco: conectar quem
tem dinheiro sobrando (poupadores) com quem precisa de recursos (tomadores de
empréstimo).
Com essa intermediação financeira, o Banco do Vaticano lucrou € 49,7 milhões em
2023, alta de 49%. Basicamente, ganhou mais com investimentos financeiros e
comissões por operações.
O lucro existe, mas dá para dizer que os números são comedidos. A métrica mais comum para medir o lucro de um banco é pelo ROE, sigla em inglês
para retorno sobre patrimônio líquido. Em 2023, o ROE do Banco do Vaticano ficou
em 4,8%. Ou seja, a cada € 1 de patrimônio, a instituição conseguiu produzir €
0,048 de lucro.
Para entender os números, vamos ao Brasil. No mesmo ano de 2023, grandes bancos
registraram, por aqui, ROE na casa dos 20%. Ou seja, essas instituições
brasileiras geram pelo menos R$ 0,20 de lucro a cada R$ 1 de patrimônio – quatro
vezes mais que o Banco do Vaticano.
Enquanto os bancões brasileiros atingem o nirvana financeiro com ROE de 20%, o
Banco do Vaticano parece estar feliz com uma rentabilidade bem mais modesta.
Talvez seja a prova de que, no mundo das finanças divinas, a regra de ‘servir e
não governar’ tem um custo – ou talvez, um valor – que não se mede apenas em
euros.