Não basta condenar Bolsonaro. Sem prisão não haverá plena justiça
Tornozeleira para que não fuja
Insisto: Bolsonaro fugirá para não ser preso pelos crimes de tentativa de golpe
de Estado, abolição violenta da democracia e organização criminosa. Custa
monitorá-lo com a aplicação de uma tornozeleira eletrônica? Ou o que se quer é
que ele fuja?
A fuga não impediria o Supremo Tribunal Federal de condená-lo. Bolsonaro ainda
responderá por outros crimes: roubo de joias presenteadas por governos
estrangeiros ao Brasil e fraude de certificado de vacina contra a Covid-19.
Mas para quem espera que se faça justiça, e justiça plena, a fuga será uma
frustração. Lula não fugiu para escapar à prisão quando condenado pelo ex-juiz
Sérgio Moro, que trocou a toga pelo cargo de ministro da Justiça de Bolsonaro.
Não fugiu e nem tentou fugir.
Foi aconselhado por amigos a fugir, e no exterior, seguir se defendendo e se
dizendo um perseguido no seu próprio país. Recusou-se, porém, a fazê-lo. Achou
que fugir equivaleria a uma admissão de culpa e encerraria sua carreira
política.
Lula estava certo. Passou 580 dias preso. Saiu da prisão depois que o Supremo
suspendeu sua condenação por julgá-la irregular, repleta de defeitos, e concluir
que Moro comportou-se como um juiz parcial, atuando em dobradinha com o
Ministério Público.
Bolsonaro não tem esses pruridos. Para quem nunca imaginou que pudesse se eleger
presidente da República e foi candidato com a pretensão inicial de apenas ajudar
seus filhos Flávio, Eduardo e Carlos a se reeleger, a fuga não lhe causará
maiores danos.
E se causar, pouco lhe importa. Seu público cativo o perdoará. Mais do que isso:
o defenderá enquanto ele permanecer exilado. Mesmo que Lula se reeleja no
próximo ano, a direita, nas eleições de 2030, se apresentará mais forte do que é
hoje e poderá vencer. Um presidente de direita, qualquer um, será pressionado por
Bolsonaro a perdoar sua pena. É pule de dez que perdoará. Caso não o faça, um
Congresso mais à direita do que o que temos aprovará uma anistia para Bolsonaro e
os demais golpistas.
Então, Bolsonaro voltaria ao Brasil e seria recebido por uma malta exaltada e
esfuziante. E se valeria do perdão ou da anistia para confirmar seu discurso de
que fora vítima de um conluio da esquerda com uma parcela de ministros do Supremo.
Improvável que se lançasse outra vez candidato a presidente e logo contra o
presidente da direita que o beneficiou com o perdão. Provavelmente, se
candidataria a senador. Parece delírio? Não é. Na política, quem morre pode
ressuscitar.
Ora, direis: a ser assim, não seria melhor para a imagem dele que suportasse
alguns anos de prisão para não ser acusado depois de ter fugido? Respondo: você
já foi preso? É uma merda. À época da ditadura militar, fui preso três vezes por
me opor a ela.
Não recomendo a ninguém que se disponha a ser preso, nem a possíveis aspirantes
a falso mártir. Mas Bolsonaro merece ser preso. Tornozeleira nele!