Brasil é o país com maior índice de ansiedade no mundo; como contornar?

Pessoa com ansiedade

De acordo com dados de 2019 da Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é o país com maior índice de ansiedade no mundo. Segundo o levantamento, cerca de 9,3% da população sofre com esse transtorno, ou seja, 18,6 milhões de pessoas. Por que isso acontece? E como escapar?

Como a ansiedade funciona

O consenso na área da saúde é de que a ansiedade não se trata necessariamente de uma doença. Em vez disso, é considerada um espectro, uma reação natural de todo ser humano com diferentes tipos de gravidade.

Para a Dra. Ana Idalina, psicóloga com formação e mestrado na USP, doutorado em Ciências do Comportamento pela UnB e especialista em neuropsicologia com reconhecimento do Conselho Federal de Psicologia, a ansiedade é nada mais do que uma resposta evolutiva.

“É uma sensação interna de antecipação de uma ameaça futura. É uma reação natural, evolutivamente selecionada entre humanos, e é muito vantajosa. Quando você sabe que está em perigo, você pode se defender. O nosso corpo reage para que você lute ou faça uma fuga. Então, fica hipervigilante, todo o nosso sangue é redirecionado, coração bate mais forte, pois o corpo está se preparando para uma ameaça”, discorre.

Porém, quando a ansiedade alcança níveis exacerbados, utiliza-se o termo de Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG). É o caso de Letícia Oliveira, acadêmica de Enfermagem da UFG. “A ansiedade é o meu monstro interior, me atrapalha em tudo mesmo. É bem complicado. Na faculdade, a ansiedade virou uma bola de neve. Fico achando que não vou conseguir fazer nada, não consigo estudar direito. É uma grande luta”, conta a estudante.

Débora Damacena de Andrade, psicóloga e mestranda na UFG, atua na área escolar e educacional na Escola Interamérica e na área clínica no Instituto de Psicologia Desenvolverse. Segundo ela, as motivações para o crescimento da ansiedade podem ser diversas.

“As causas são multifatoriais, pois envolvem predisposição biológica, histórico familiar, contexto socioeconômico, situações de crise familiar ou pessoal, entre outras”, explica.

A presença maior entre jovens

Devido ao crescimento de casos de ansiedade nos últimos anos, uma das conclusões possíveis é de que tal transtorno seja mais comum entre jovens. Ana Idalina faz coro a essa afirmação, mas realiza algumas ponderações a respeito.

“A gente tem demandas enquanto se está ativo no trabalho, na escola, enquanto é preciso performar de alguma maneira. Isso é maior entre adultos jovens e adultos no geral. Não são especificamente jovens entre 18 e 25 anos, não é isso. Não existe essa prevalência. Porém, até os 40 anos, existe essa prevalência bastante alta”. A doutora ainda explica que, entre as pessoas mais velhas, há uma maior presença da depressão afetando a saúde mental.

Para Débora Damacena, a ansiedade entre os mais jovens tem a ver com a própria natureza humana. “Na psicologia, entendemos que a adolescência envolve aspectos psicossociais para além da puberdade. Nesse momento da vida, o sujeito encontra-se entre o luto pelo infantil e a expectativa de ser aceito no universo adulto. Por isso, falamos que é uma fase de moratória, em que não se é nem criança, nem adulto. Com isso, instaura-se uma crise de identidade, culminando na necessidade de se diferenciar e ao mesmo tempo ser aceito por um grupo”, descreve.

Letícia Oliveira, por exemplo, possui 22 anos e é uma das pessoas que entram nessa estatística. “Na vida pessoal a ansiedade me atrapalha nos meus relacionamentos, porque eu fico achando que as pessoas enjoam de mim, ou não gostam de mim, ou que sou muito chata. Passa muito pensamento na minha cabeça por minuto e é horrível”.

A incidência no Brasil

Como explicar a maior incidência da ansiedade no Brasil? De acordo com Ana Idalina, a questão cultural é um dos grandes motivos. “Do ponto de vista social, existem características culturais brasileiras muito fortes. Temos uma cultura com relações pessoais muito próximas, íntimas. Para nós, o ‘não’, a objetividade, a assertividade não são valorizados”, opina.

A especialista em neuropsicologia exemplifica a maneira com que as pessoas reagem a convites sociais. No Brasil, é comum não apresentar uma negativa direta, optando por estender a situação por puro receio de ser rude. Em outros países, isso acontece menos. Portanto, tal necessidade de aprovação alheia contribui para o crescimento da ansiedade.

Além disso, a instabilidade social também é um fator essencial nessa coluna. Para o brasileiro médio, a vulnerabilidade financeira e a falta de perspectiva geram ansiedade. Com a pandemia da Covid-19, isso piorou ainda mais.

Débora concorda, e acrescenta. “Do ponto de vista mais geral, envolvendo a cultura ocidental como um todo, estamos vivendo um processo de valorização exacerbada da vida acelerada, produtividade e desempenho a qualquer custo. Estamos em uma sociedade do desempenho, que nos impõe a falsa liberdade por meio do imperativo da realização, da mobilidade, da velocidade, meritocracia e superação constantes. A consequência são sujeitos adoecidos emocionalmente. Por isso, dizemos que o sofrimento psíquico também é fruto de uma época”.

Como procurar ajuda?

O primeiro passo para melhorar a ansiedade é procurar ajuda de profissionais. “O transtorno de ansiedade é uma psicopatologia. Não é frescura, não é falta de fé. Tem toda uma química cerebral alterada, então a pessoa precisa procurar ajuda profissional de psicólogos ou psiquiatras, não apenas de amigos”, reforça.

Em Goiânia, por exemplo, os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) são uma opção de ajuda especializada gratuita, além das alternativas particulares. “Hoje eu faço um tratamento para ansiedade e estou bem melhor em tudo”, conclui Letícia.

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