“Brasil só terá sucesso quando povo não for tratado como lixo, diz Lula: o impacto da educação e saúde públicas”

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Este país só dará certo, Lula, quando o povo não for tratado como lixo

Não ficou claro por que Lula acha que a educação e a saúde públicas dependem da
classe média para melhorar

Ontem, na cerimônia de entrega de um certo “Prêmio Selo Nacional Compromisso com
a Alfabetização”, em Brasília, Lula criticou prefeitos que não têm filhos em
escolas públicas e que usam serviços de saúde particulares.

Disse o presidente da República: “Você chega em uma cidade e pergunta: ‘Prefeito, como é que está a educação?’
(Ele responde) ‘Está maravilhosa, a educação aqui é fantástica’. ‘Prefeito, como
é que está a saúde?’ (Ele responde) ‘A saúde aqui é fantástica’. Aí você
pergunta: ‘Seu filho estuda nessa escola fantástica?’ (Ele responde) ‘Não’. O
filho dele está em um (escola) que não presta, particular.”

Lula continuou: “Aí você pergunta: ‘Você se atende no pronto-socorro que você acha que é
espetacular?’ (O prefeito diz) ‘Não, o meu filho, eu levo em outro lugar’.
Então, esse país não vai dar certo nunca. Esse país só vai dar certo o dia que a
classe média voltar para a escola pública. E (a classe média) só vai voltar para
a escola pública quando ela melhorar.”

Vou deixar de lado o político que volta e meia faz o elogio do SUS, mas corre
para o Sírio-Libanês, um dos melhores hospitais privados de São Paulo, quando
tem uma urgência médica. As redes sociais, essas incômodas pedras no sapato de
gente poderosa, já se encarregaram de colocar o dedo na ferida.

Prefiro me concentrar na cabecinha confusa de Lula. Ele começou criticando
prefeitos hipócritas, com o perdão do pleonasmo, e terminou falando em classe
média.

Não ficou claro o que uma coisa tem a ver com a outra. Também faltou esclarecer
se ele acha que a classe média é responsável pelo nosso subdesenvolvimento por
evitar usar a educação e a saúde públicas ou, então, qual seria o motivo de ele
considerar que o salto de qualidade de ambas deveria ocorrer para atrair a
classe média. Neste caso, por que a classe média seria melhor do que o povão?

Não há motivo nenhum para serviços públicos serem decentes apenas para atender a
expectativas de uma classe social mais elevada. Eles têm de ser decentes
independentemente do poder aquisitivo de quem os utiliza. É assim que se pensa
nos países civilizados.

Sou proveniente da classe média bem média paulistana. Estudei em escola estadual
até o primeiro ano do segundo grau, cursado no longínquo 1977, quando a situação
ficou tão deplorável em apenas três anos de decadência impressionante, que fui
matriculado em escola particular para completar o ensino médio.
Quase trinta anos depois, o meu pai sofreu um atropelamento e foi levado
diretamente para o pronto-socorro do Hospital das Clínicas. É uma sucursal do
inferno, na qual ótimos médicos e enfermeiros lutam contra condições precárias
para salvar vidas.
Diante da emergência, fomos convencidos a internar o nosso pai na ala particular
do hospital (não sei se ela ainda existe), que seria equiparável aos melhores
privados.

De fato, as instalações eram razoáveis. O que ninguém nos disse é que, para
fazer qualquer exame, ele tinha de entrar na fila interminável do
pronto-socorro. O que ninguém nos contou é que a enfermagem era escassa. Se não
o tivéssemos transferido para um bom hospital privado, ele teria morrido naquele
momento.
Eu teria gostado de matricular os meus filhos em escola estadual. Eu adoraria
não ter de pagar uma fortuna por mês em plano de saúde e de poder usar hospitais
sustentados apenas por impostos. Isso só teria acontecido se o serviço público
fosse bom para todo mundo. Se ele fosse bom em si. Este país
só vai dar certo, Lula, quando o povão tiver escola e hospital que não o tratem
como lixo. O resto é consequência.

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