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Cartazes que prometem “trazer amor verdadeiro” escondem segredo obscuro

Última atualização 21/06/2022 | 12:49

Eles estão por todo lado, seja no ponto de ônibus, nas paredes do viadulto e até nos postes. Os cartazes que prometem trazer o “amor verdadeiro” e “fazer ou desfazer” qualquer tipo de trabalho espírita escondem um segredo obscuro. Acontece que alguns desses anúncios têm como pano de fundo uma espécie de clínica de aborto espiritual, onde a cliente que não deseja seguir com a gestação pode contratar os serviços – cujo preço varia de acordo com o mês de gravidez.

A reportagem do Diário do Estado conversou com uma dessas supostas clínicas de Goiânia por meio do WhatsApp. Se passando por cliente, o repórter negociou com a secretária da mulher responsável por fazer o trabalho. Perguntada se ela realizava abortos, a mulher respondeu que sim e que o serviço seria realizado “pelas entidades”, como se fosse um aborto espontâneo. O valor cobrado foi de R$ 1.565 à vista, para que realizasse o procedimento de uma gestação de três meses. A mulher ainda afirma “está no tempo ideal, não pode demorar muito”.

Para realizar o serviço, ela pediu apenas o nome completo da grávida e uma foto, alegando que o trabalho seria feito no mesmo dia. Caso a pessoa prefira, ela também pode ir ao local por sua conta e risco.

Crime

No entanto, a prática um tanto curiosa, pode configurar em quatro crimes, mesmo não sendo realizada de forma física: aborto, estelionato, charlatanismo e curanderismo. O aborto que é proibido no Brasil, pode ser realizado apenas em três ocasiões, segundo o delegado Paulo Ludovico: quando as mulheres correm risco de vida, nas situações de gravidez por estupro e, recentemente, na presença de anencefalia fetal.

A pena para quem pratica o abordo induzido pode chegar a 3 anos de detenção para a gestante, e de um a quatro anos de reclusão para o médico ou qualquer outra pessoa que realize o procedimento de retirada do feto.

“Caso alguém pague para outra pessoa para fazer um abordo mediante reza e de fato acontecer, o fato pode se configurar em crime. Já se o aborto não acontecer, mesmo que a pessoa pague pelo serviço, a pessoa que realizou o trabalho pode responder por estelionato. Porém, o estelionato depende de representação. Ou seja, a pessoa que pretendia fazer o aborto e levou o golpe teria que se apresentar a polícia para fazer a denúncia”, explicou Paulo.

Charlatanismo e curanderismo

Já em relação aos crimes de curandeirismo e charlatanismo, que se aproximam dos crimes de estelionato e exercício ilegal da medicina, o investigador diz que eles também podem estar presentes na prática do aborto espiritual.

“O charlatanismo é quando alguém anuncia que pode curar um terceiro por meio secreto ou infalível, já o curandeirismo, por sua vez, nada mais é do um indivíduo que exerce a profissão de curandeiro prescrevendo, ministrando ou aplicando habitualmente alguma substância ou diagnostico. Todos esses crimes podem se enquadrar neste aborto oferecido por meios espirituais, já que o trabalho pode de fato ser realizado ou não”, concluiu.

Diálogo

Para entender melhor como é a prática, o jornalismo do DE entrou em contato com uma dessas pessoas que prometem o aborto espontâneo. Veja a conversa abaixo:

Repórter: Bom dia! Minha namorada está grávida e queremos abortar. Me disseram que você pode ajudar.

Clínica: Bom dia! Me chamo Divina sou secretária da dona Laurinda. De quantos meses sua namorada está?

Repórter: Bom dia! Está de 3 meses.

Clínica: Esse trabalho fica 1,565,00.

Repórter: Beleza. Mas como que é? Não risco para a minha namorada não?

Clínica: Não.

Repórter: Beleza

Clínica: Tem que ser logo.

Repórter: Como é o trabalho?

Clínica: É feito com as entidades.

Repórter: Beleza. Precisamos levar alguma coisa?

Clínica: Nome dela completo e uma foto.

Repórter: Beleza. Precisamos ir até vocês?

Clínica: Se você quiser pode vir. Se não você pode só mandar para a Dona Laurinda que ela faz no mesmo dia.

Repórter: Beleza. O pagamento é parcelado?

Clínica: Não.

Repórter: Tá bom. Estou conversando com a minha namorada. Não tem risco de dar errado não?

Clínica: Não. Dá certo. Que dia você quer começar? Só não demora porque não pode passar muito. Três meses é ótimo.

Repórter: Estou vendo com a minha namorada que dia fica melhor. É apenas uma sessão ou tem mais de uma? Aí é tipo abordo espontâneo?

Clínica: Uma sessão só. Sim, espontâneo.

Repórter: Tá bom.

Clínica: Quer marcar?

Repórter: Estou vendo com a minha namorada direitinho. Ela tem medo de prejudicá-la.

Clínica: Não vai não.

Repórter: Vocês ficam aonde?

Clínica: Em Goiânia, no Jardim América.