Números inflados, prejuízo bilionário e investigações: entenda a crise na concessão da Cedae no RJ
DE e Ministério Público miram acordo de R$ 900 milhões entre governo do estado, Cedae e concessionárias de saneamento. Um relatório do BNDES já havia alertado sobre dados superdimensionados antes do leilão.
Antes de leilão, estudo do BNDES alertou Cedae e governo do RJ que rede de saneamento de municípios estava superdimensionada
O Governo do Estado do Rio de Janeiro, a Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae) e as empresas privadas que assumiram os serviços de saneamento vivem um dos maiores impasses desde a privatização do setor. A disputa, que envolve bilhões de reais, gira em torno de supostos erros e inconsistências nos dados de cobertura de água e esgoto usados no edital de concessão.
A polêmica já resultou na suspensão de um acordo de R$ 900 milhões pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) e na abertura de inquérito pelo Ministério Público do Rio (MPRJ) para investigar possível prejuízo aos cofres públicos.
Um estudo feito a pedido do BNDES já havia alertado sobre dados superdimensionados antes da concessão dos serviços públicos. O prejuízo estimado ultrapassa R$ 2,7 bilhões, valor que pode impactar diretamente os gastos do Governo d. Estado.
ACORDO DE R$ 900 MILHÕES
O caso ganhou força no fim de setembro, quando a Cedae — que até então negava qualquer responsabilidade sobre erros nos dados — mudou de posição e aceitou um acordo com a concessionária Águas do Rio, que atua nos blocos 1 e 4 da concessão.
Em apenas quatro dias, a estatal passou de uma defesa formal contra o pagamento para um termo de conciliação que previa R$ 900 milhões em compensações, via desconto nas faturas de compra de água.
A Águas do Rio alegou que encontrou uma cobertura de esgoto muito inferior à prevista no edital, com municípios como Cantagalo, Itaocara, Magé, Queimados e Rio Bonito apresentando zero cobertura, apesar de índices estimados entre 40% e 90%.
TCE SUSPENDE O ACORDO
O Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) suspendeu o pagamento e determinou que governo e Cedae se abstenham de aplicar qualquer desconto nas faturas da Águas do Rio até o julgamento do mérito das denúncias.
A decisão, do conselheiro José Gomes Graciosa, atendeu a pedidos dos deputados Luiz Paulo (PSD) e Jari Oliveira (PSB). Eles argumentaram que o acordo, além de volumoso, foi aprovado de forma “relâmpago” e sem mecanismos adequados de governança e transparência.
O TCE deu prazo de 15 dias para que as partes apresentem documentos técnicos e jurídicos que embasaram a decisão — entre eles o contrato de financiamento com a Caixa Econômica Federal, que poderia ser afetado.
MP APURA POSSÍVEL LESÃO AO ERÁRIO
Após a decisão do TCE, o Ministério Público do Rio instaurou um inquérito civil para apurar um possível prejuízo de mais de R$ 900 milhões aos cofres públicos.
A investigação é conduzida pela 2ª Promotoria de Tutela Coletiva do Patrimônio Público e da Cidadania da Capital, que analisa se o acordo pode configurar ato de improbidade administrativa ou violar a Lei Anticorrupção.
Segundo ele, o procedimento busca identificar se houve dano ao erário e qual foi o papel da Agenersa na fiscalização do contrato.
Um estudo técnico contratado pelo BNDES, a pedido do governo do estado, já havia apontado fragilidades nos dados da Cedae antes do leilão de 2021.
Segundo o documento, os índices de coleta e tratamento de esgoto apresentados pela estatal estavam muito acima da realidade. Mesmo com o alerta, o edital seguiu com os números originais, e as concessionárias — inclusive as que hoje pedem compensações — tiveram acesso ao estudo.
O consultor ambiental Luiz Renato Vergara afirmou que os índices autodeclarados não condiziam com a realidade.
O impacto financeiro da disputa é bilionário. Somados, os pleitos de reequilíbrio econômico-financeiro apresentados pelas três concessionárias ultrapassam R$ 2,7 bilhões. As empresas alegam que os investimentos adicionais não estavam previstos nas propostas vencedoras da licitação e que a variação nos dados ultrapassou o limite contratual de 18,5%.
Em nota, o Governo do Estado informou que aguarda o resultado da análise dos pleitos das concessionárias Iguá e Rio+ Saneamento. Segundo o Estado, o edital de licitação prevê a possibilidade de reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos caso seja comprovado que a discrepância dos dados de cobertura supera 18,5% em relação ao que foi apresentado na licitação dos serviços.
O governo destacou ainda que o Termo de Conciliação firmado com a Águas do Rio é preliminar e teve como objetivo “evitar, de imediato, o aumento da tarifa para a população”.
Em conclusão, a crise na concessão da Cedae no RJ envolve números inflados, prejuízos bilionários e investigações por possíveis irregularidades nos dados de cobertura de água e esgoto. A disputa entre o governo estadual, Cedae e concessionárias reflete a complexidade da privatização do setor de saneamento, com acordos suspensos, inquéritos abertos e ações para apurar danos ao erário. O desafio agora é resolver a crise e garantir a qualidade dos serviços prestados à população fluminense.




