Após mais de 30 anos, cidade corrige nome da Rua Marechal Rubens Paiva
Projeto encaminhado pela prefeitura visa retirar o termo “marechal” do nome da
rua que homenageia o deputado, morto na ditadura militar
Um erro que perdura desde os anos 1990 pode, enfim, ser corrigido em Francisco
Beltrão, município localizado a cerca de 500 km de Curitiba (PR). A prefeitura
da cidade encaminhou à Câmara Municipal um projeto de lei para alterar o nome de
uma rua que, de forma equivocada, homenageia o ex-deputado Rubens Paiva como se
ele tivesse sido um militar.
O logradouro em questão leva o nome de “Marechal Rubens Paiva” — título militar
concedido apenas a generais em tempos de guerra —, o que representa uma
distorção histórica, já que Paiva era engenheiro e político. Além disso, um dos
militares envolvidos na morte de Paiva durante a ditadura militar brasileira
ostentava o posto de general.
ENTENDA
– Rua foi batizada como “Marechal Rubens Paiva” nos anos 1990.
– Vereadores petistas cobraram a mudança por meio de um projeto de lei. Agora,
a prefeitura também protocolou um projeto corrigindo essa e outros nomes de
rua do município.
– De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o
município conta com 101 mil habitantes.
No projeto, o prefeito Antônio Pedron (MDB) argumenta que a proposta visa
adequar o nome da via “à realidade histórica e biográfica da personalidade
homenageada”.
Segundo ele, a medida busca respeitar a memória do ex-parlamentar e corrigir um
erro de natureza simbólica.
> “Rubens Paiva foi engenheiro e deputado federal, eleito pelo antigo estado da
> Guanabara, e teve seu mandato cassado pelo Ato Institucional nº 1, em 1964,
> após o golpe militar. Em 1971, foi sequestrado por agentes do regime e, desde
> então, consta oficialmente como desaparecido político, sendo um dos casos mais
> emblemáticos de violação de direitos humanos durante a ditadura no Brasil”,
> detalhou o prefeito no texto enviado ao Legislativo.
A história do ex-deputado, que se tornou símbolo da resistência à repressão,
inspirou o filme Ainda Estou Aqui, vencedor do Oscar de Melhor Filme
Internacional.
Com a alteração, a rua passará a se chamar apenas “Rua Rubens Paiva”. “Ao adotar
essa medida, o município de Francisco Beltrão reafirma seu compromisso com os
valores democráticos, com a memória histórica verdadeira e com o respeito às
vítimas da repressão, em consonância com os princípios constitucionais da
dignidade da pessoa humana e da transparência histórica”, concluiu Pedron.
O projeto foi apresentado na última quinta-feira (3/4), mas ainda precisa
tramitar pelas comissões da Câmara antes de ser votado em plenário. A proposta,
no entanto, conta com o apoio tanto da base governista quanto da oposição.
A rua fica localizada no município de Francisco Beltrão
Se aprovada, a alteração elevará para nove o número de logradouros — entre ruas
e praças — no Brasil que homenageiam Rubens Paiva. O dado foi obtido por meio de
um levantamento feito pelo DE junto ao banco de dados dos Correios.
O processo que investiga a morte de Rubens Paiva está em análise no Supremo
Tribunal Federal (STF). A Corte vai decidir se crimes classificados como “grave
violação de direitos humanos” podem ser excluídos da Lei da Anistia.
O Ministério Público Federal (MPF) sustenta, no processo, que sequestro e
cárcere privado têm natureza permanente; portanto, não deveriam ser abrangidos
pela lei. O Plenário Virtual do STF reconheceu a repercussão geral do caso e
também avaliará a morte de outros dois opositores à ditadura militar, vigente no
Brasil entre 1964 e 1985.
As ações chegaram ao Supremo após o MPF recorrer de decisões do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) e do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2),
que arquivaram os processos, sob a justificativa de que os crimes estavam
acobertados pela Lei da Anistia.
Entre os responsáveis pelo desaparecimento de Rubens Paiva, dois ainda estão
vivos. O grupo chegou a ser denunciado e tornados réu em primeira instância no
Rio de Janeiro pelos crimes de homicídio qualificado, ocultação de cadáver,
fraude processual e formação de quadrilha armada. No entanto, o caso foi
arquivado com base na Lei da Anistia, considerada constitucional pelo STF,
conforme a legislação de 1979.
O que os ministros da Corte vão decidir agora é se a Lei da Anistia pode ser
aplicada a crimes permanentes e se a validade é compatível com tratados
internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário.
Caso o STF aceite o recurso do MPF e determine que o Brasil deve punir crimes
cometidos durante a ditadura, os processos poderão ter continuidade nas
instâncias inferiores. Se os ministros decidirem em sentido contrário, as investigações sobre a morte
de Rubens Paiva e de outras duas vítimas da ditadura militar serão encerradas,
sem possibilidade de punição. O relator do processo é o ministro Alexandre de
Moraes.
Ao optar por corrigir a nomenclatura da rua, Francisco Beltrão demonstra seu
comprometimento com a verdade histórica e a memória das vítimas da repressão.
A alteração para “Rua Rubens Paiva” reflete os valores democráticos do município,
em consonância com os princípios constitucionais da dignidade humana. A decisão,
que ainda precisa ser aprovada pela Câmara, mostra apoio tanto da base governista
quanto da oposição, destacando a importância e o consenso em torno do respeito
aos direitos humanos e à justiça histórica.