Como lidar com crises e birras em crianças com autismo: dicas e estratégias essenciais para promover um ambiente equilibrado e respeitoso

Lidar com crises e birras em crianças no espectro do autismo (TEA) é um desafio que afeta famílias, educadores e profissionais da saúde. Entender as diferenças entre esses comportamentos e aplicar estratégias de intervenção adequadas é essencial para promover um ambiente mais equilibrado e respeitoso. Consultamos Laura Guizzo, Psicóloga e Analista do Comportamento na Soulmare Clínica de Autismo, para esclarecer dúvidas e oferecer orientações práticas.

Uma das perguntas mais comuns entre pais e cuidadores é: “Como diferenciar uma crise de uma birra?”. Segundo Laura Guizzo, essa distinção é fundamental. Uma crise comportamental ocorre geralmente como resposta a frustrações, mudanças inesperadas na rotina ou dificuldades em comunicar necessidades. É uma ocorrência intensa e visível, com comportamentos como gritos, choro, agressividade (contra si ou outros) e, em alguns casos, tentativa de fuga. Já uma crise sensorial é desencadeada por estímulos do ambiente que uma criança com TEA não consegue processar de maneira equilibrada, como sons altos, luzes intensas ou multidões. Por outro lado, a birra é intencional e geralmente usada para obter algo desejado, como atenção ou um objeto específico.

Essa diferenciação é o ponto de partida para aplicar as estratégias corretas de manejo e intervenção. A Análise do Comportamento Aplicada (ABA) oferece ferramentas fundamentadas em evidências científicas para prevenir crises e promover comportamentos funcionais. No entanto, Laura destaca a importância de personalizar cada abordagem: Cada criança é única. Antes de implementar qualquer estratégia, é fundamental uma avaliação funcional para identificar a função do comportamento, ou seja, entender qual a intenção ou necessidade por trás daquela ação.

Entre as técnicas mais eficazes, Laura ressalta: Previsibilidade: “Crie uma rotina clara e estruturada e informe com antecedência sobre mudanças e transições”. Controle compartilhado: “Ofereça opções de escolha à criança, como decidir entre dois brinquedos ou atividades, para promover autonomia”. Modelo de comunicação: “Muitos comportamentos interferentes estão atrelados a uma comunicação pobre. Ensinar a criança a expressar desejos ou recusas, seja por palavras, gestos ou outros meios, reduz a ocorrência de crises”.

Quando uma crise ocorre, manter a calma e priorizar a segurança são passos essenciais. Laura explica: Primeiro, observe se o comportamento coloca a criança ou outras pessoas em risco. Remova objetos perigosos, mas evite dar instruções ou ter conversas longas no momento da crise. O cérebro da criança está em ‘modo emoção’ e não ‘modo razão’, e discursos podem intensificar as reações. A especialista também orienta a evitar recompensas no momento da crise: Evite oferecer algo desejado, como um brinquedo ou doce, para não reforçar o comportamento. Esteja presente de forma acolhedora e, após o comportamento diminuir, ensine formas alternativas de comunicação para expressar necessidades.

O ambiente pode ser tanto um aliado quanto um gatilho para crises. Laura ilustra com um exemplo: Imagine uma criança com hipersensibilidade auditiva entrando em um ambiente com excesso de estímulos sonoros, visuais e demandas. O ‘copinho da tolerância’ dela se encherá muito mais rápido, aumentando a chance de uma crise sensorial. Adaptações simples no cotidiano podem fazer a diferença: Organização e tranquilidade: “Ambientes calmos e com menos estímulos ajudam a criança a se sentir mais segura”. Rotinas visuais: “Use quadros e figuras para organizar tarefas e informar mudanças”. Limitação de telas: “Evite o uso excessivo de dispositivos eletrônicos, que podem ser gatilhos comportamentais”.

Dificuldades de comunicação são um dos principais fatores por trás de comportamentos interferentes. Laura explica como a intervenção pode ajudar: Trabalhamos o comportamental verbal chamado mando, que é a capacidade de fazer pedidos e recusas. Isso fortalece o repertório da criança, permitindo que ela se expresse de maneira mais funcional. Ela destaca a importância de avaliar como a criança se comunica: Pergunte-se: ela consegue se fazer entender? Se a resposta for não, buscar auxílio profissional é essencial para iniciar um processo terapêutico eficaz.

Após uma crise, ajudar a criança a regular suas emoções é crucial. Laura recomenda estratégias simples e eficazes, como a técnica de respiração “Peixinho”: Peça à criança que coloque uma mão na barriga, inspire pelo nariz como se estivesse enchendo a barriga de ar e solte o ar lentamente pela boca, imitando um peixinho soprando bolhas. Essa técnica ajuda a reduzir a sobrecarga emocional. Outras sugestões incluem ambientes silenciosos, músicas relaxantes e banhos mornos, sempre adaptados às preferências individuais da criança.

Crises frequentes não afetam apenas as crianças, mas também seus pais e cuidadores. Laura ressalta a importância do treinamento parental: Famílias que enfrentam crises constantes relatam sentimentos de desesperança e exaustão. O treinamento parental capacita os pais com técnicas práticas, como o BST (Behavioral Skills Training), para gerenciar comportamentos de forma mais assertiva e menos reativa. Esse suporte promove não apenas o desenvolvimento da criança, mas também a qualidade de vida de toda a família.

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Empreendedorismo periférico: Desafios e potencial no RS

Favela não é carência, é potência: empreendedores periféricos movimentam mais de R$ 12 bilhões por ano no RS

Empreendimentos fundados nas comunidades do estado são sinônimo de geração de renda e inovação no comércio e serviço.

Os desafios dos empreendedores nas periferias do Rio Grande do Sul

Negócios criados nas periferias do Rio Grande do Sul ganham protagonismo na economia gaúcha. Nos mais de mil territórios contabilizados no estado pela Central Única das Favelas (Cufa), em parceria com o IBGE, os empreendimentos movimentam R$ 12,5 bilhões por ano somente no RS.

A cifra demonstra o potencial encontrado nas periferias, como observa o coordenador da Cufa no RS, Junior Torres.

> “Favela não é carência, é potência. As periferias geram riqueza e são exemplos
> de superação e negócios bem-sucedidos”, diz.

O assunto foi tema de uma série de reportagens exibidas na RBS TV, que mostraram empreendedores de diversas cidades do estado, suas ideias e seus desafios. Em Santa Maria, na Região Central do estado, por exemplo, a reportagem conversou com a trancista Yasmin Couto.

Moradora do bairro Tancredo Neves, ela abriu o salão há quatro anos, e conta que só teve coragem pra começar a empreender quando percebeu que poderia contar com a vizinhança pra impulsionar o negócio.

Trancista Yasmin Couto contou com a vizinhança para impulsionar seu salão de beleza em Santa Maria — Foto: Reprodução/RBS TV

“Fui criando conexões, colaborações com outros trabalhos artísticos e isso foi dando visibilidade para o meu empreendimento. A gente não tá acostumado a dar esse olhar para os empreendedores que vêm da comunidade, né? Mas a gente tá conseguindo colaborar e gerar renda nesse processo de rede, fazendo outras pessoas crescerem, trabalhando com o que gostam”, reflete.

EMPREENDEDORISMO POR NECESSIDADE

Já em Porto Alegre, a arquiteta Karol Rosa de Almeida é uma empreendedora baseada no bairro Restinga. Formada há cinco anos, ela começou a empreender pois não conseguia emprego formal. Sem perspectiva de emprego, Karol oferecia serviços aos vizinhos, com condições facilitadas de pagamento. Assim nasceu o que ela descreve como negócio periférico de impacto social.

“Eu nem sonhava em ser empreendedora. Foi super por necessidade. Eu tenho dois filhos e não podia ficar desempregada, tinha uma urgência de trabalhar. Mas nunca fui contratada, porque nas entrevistas sempre virava pauta eu ser mãe e morar na Restinga”, desabafa.

Hoje, a profissional oferece projetos de forma voluntária a famílias em vulnerabilidade social. Ela também atua em parceria com instituições e entidades filantrópicas.

Karol Rosa de Almeida, arquiteta empreendedora de uma comunidade em Porto Alegre — Foto: Reprodução/RBS TV

Confira a segunda reportagem dos desafios dos empreendedores nas periferias

EQUILÍBRIO ENTRE VIDA E NEGÓCIOS

No bairro Santo Afonso, em Novo Hamburgo, a história de Morgana Luz é exemplo de resistência e reinvenção. Professora e artesã, ela transformou a casa onde cresceu em um ateliê de moda, um espaço que mistura passado e futuro. Com azulejos da década de 1970, a estrutura da casa carrega memórias de infância e hoje abriga cursos e feiras de artesanato.

“Empreender não foi uma decisão estratégica, mas uma necessidade para complementar a renda”, conta Morgana, que há 15 anos começou a produzir acessórios com materiais descartados por indústrias calçadistas.

Na periferia, os desafios são inúmeros. Segundo dados do IBGE, apenas um terço das mulheres em comunidades fatura mais de dois salários mínimos por mês.

> “Equilibrar saúde mental, cuidados com a família, casa e estudos enquanto gerencio o ateliê é a maior dificuldade”, explica Morgana, destacando a necessidade de políticas públicas que ofereçam suporte às empreendedoras.

No estado, 43% dos novos negócios são liderados por mulheres, segundo o Sebrae. Contudo, 90% delas enfrentam os desafios da gestão sozinhas ou com o auxílio de familiares. Kelly Valadares, analista do Sebrae RS, reforça que o machismo estrutural é um dos maiores entraves.

> “Mulheres são vistas como cuidadoras, não como provedoras. Isso se agrava nas periferias, onde as dificuldades para acessar crédito e formalização de negócios são maiores”, explica Kelly.

REDE DE APOIO

No bairro Restinga, em Porto Alegre, Vanessa Luciani Garcia da Silva, presidente da Associação Empreendedoras Restinga, lidera uma iniciativa que já ajudou mais de 200 mulheres a conquistar independência financeira.

“Formamos uma rede de apoio para mostrar que na Restinga é possível empreender. Mulheres que antes se escondiam atrás de seus maridos agora lideram seus negócios com orgulho”, diz Vanessa.

A associação oferece cursos, orientação financeira e até espaço kids, facilitando a participação de mães empreendedoras. “Queremos mostrar que nossa comunidade tem muito a oferecer e que ninguém está parado esperando mudanças”, completa Vanessa.

DESCARTE VIRA OPORTUNIDADE

No bairro Bom Jesus, em Porto Alegre, uma Kombi percorre as ruas diariamente: é a ferramenta principal de Miro Silva, um empreendedor que transforma descarte em oportunidade. Miro recolhe peças de computadores e eletrônicos que seriam jogados fora, reaproveitando-as para consertar equipamentos ou criar novos dispositivos. O que não funciona mais, ele transforma em arte.

O empreendedor também oferece treinamentos gratuitos para jovens da comunidade, capacitando-os para ingressar no mercado de tecnologia. Desde 2018, mais de 300 alunos já passaram por suas turmas.

“Hoje, estamos desenvolvendo o primeiro computador popular recondicionado da periferia. Ele será acessível, com baixo custo, e recondicionado pelos próprios jovens daqui”, explica Miro.

Veja a terceira reportagem dos desafios dos empreendedores nas periferias

QUARTO VIRA ESCRITÓRIO

Renata Eichner, moradora da Vila Floresta, é outro exemplo de como a inovação está mudando vidas. Mãe de Jonathan, um menino autista, Renata equilibra o cuidado com o filho e o empreendedorismo. Ela produz itens personalizados que vende pela internet.

Para driblar a falta de estrutura, Renata usa o quarto como escritório. “Fiz da minha casa um espaço de trabalho para atender às demandas do meu filho e gerar renda para a família”, conta ela. Renata destaca a dificuldade em acessar crédito e apoio: “Falam que existe, mas, quando procuramos, muitas vezes esbarramos em portas fechadas.”

Renata, de Porto Alegre, tem um escritório em casa para produzir e vender itens personalizados

“QUER IR LONGE, VÁ JUNTO”

No Morro da Cruz, Michel Couto, publicitário e empresário, criou um espaço de aceleração de negócios. O local oferece internet gratuita, eventos e cursos de capacitação para a comunidade. Michel acredita que a inovação está enraizada no cotidiano das periferias.

“A inovação acontece quando uma mãe transforma um simples prato de comida em sustento para 10 pessoas. Isso é criatividade e gestão financeira em seu melhor”, afirma Michel.

Antes de se tornar empresário, Michel trabalhou como diretor de arte em uma agência de publicidade. Hoje, ele usa sua experiência para conectar a periferia às oportunidades do mercado. “Quer ir rápido, vá sozinho. Quer ir longe, vá junto. É assim que construímos mudanças e valorizamos o potencial das comunidades.”

De acordo com a Cufa, 75% dos autônomos nas comunidades brasileiras são moradores locais. Levando em conta que, no Rio Grande do Sul, 500 mil pessoas moram em favelas, abre-se um universo de oportunidades.

O professor de Economia da Universidade Feevale José Moura afirma que existe uma tendência de evolução ainda maior.

“Eu digo que o potencial é crescer muito mais, organicamente, ordenadamente, porque hoje as informações estão chegando a essas comunidades. A economia da periferia vai ser um mote do crescimento do estado, porque até então esse potencial estava recolhido e hoje tem uma grande possibilidade de ele se aflorar ainda mais, porque ele já é uma realidade.”

Espaço de aceleração de negócios no Morro da Cruz fomenta oportunidades em Porto Alegre

DESAFIOS

Mas algumas barreiras ainda precisam ser derrubadas.

No estado, ainda segundo a Cufa, apenas 33% dos negócios periféricos têm CNPJ registrado e nem 10% têm conta bancária jurídica. Além disso, só um a cada três profissionais se considera empreendedor.

De acordo com uma pesquisa do Data Favela, 54% dos autônomos gaúchos não possuem um espaço próprio para trabalhar. Ainda assim, a criatividade e a inovação emergem como respostas às adversidades.

Confira a 4ª reportagem dos desafios dos empreendedores nas periferias

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