Cooperativsmo: a chave para uma economia solidária e sustentável

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As cooperativas de reciclagem são peças-chave na gestão de resíduos em Goiânia. Além de ajudarem na redução da quantidade de lixo que vai para o aterro sanitário, elas transformam toneladas de materiais descartados em oportunidade de emprego, renda e inclusão para populações marginalizadas.

Pensando em mudar essa realidade, Goiânia se prepara para ser uma das cidades-exemplos na coleta de lixo até o centenário da capital. A cidade tem, hoje, 92 anos de existência.

Com o intuito de chegar a esse patamar, o trabalho começa dentro de galpões, que contam com fardos empilhados e muitas mãos anônimas nessa luta.

No galpão da Cooperativa de Trabalho de Catadores de Materiais Recicláveis Dom Fernando (Cooprec), no Jardim Conquista, na região leste de Goiânia, o barulho é 24 horas por dia. Sacos se rasgam, esteiras rodam, e fardos de papelão, plásticos e de latinhas vão se formando como paredes improvisadas.

A Cooprec, criada há 28 anos, foi a primeira cooperativa de reciclagem em Goiânia. Nasceu de um projeto da então Universidade Católica, hoje PUC Goiás, com moradores da região leste.

A diretora administrativa-financeira da Cooprec, Nair Rodrigues Vieira, lembra que a cooperativa começou com 38 cooperados, chegou a 70 e hoje são 26. A maioria são mulheres. Se dentro do galpão são 26 cooperados, do lado de fora a conta é bem maior.

“Cada cooperado sustenta, em média, três a quatro pessoas em casa, que soma mais de 100 pessoas, que dependem dessa renda”, calcula Nair. “É sustento, é escola de filho, é comida mais digna na mesa.”, enfatiza.

Nair explica que a presença de mulheres nas cooperativas aumentou de maneira significativa. “Isso não é só na Cooprec, é em todas as cooperativas de catadores que conheço. Mas aqui a gente vê isso todos os dias.”

Diretora administrativa-financeira da Cooprec, Nair Vale

 

O material que chega na Cooprec é proveniente de 20 pontos de coleta seletiva e dos caminhões que chegam por meio de uma empresa contratada pela Prefeitura de Goiânia.

Em média, a cooperativa recebe, por mês, cerca de 110 toneladas de resíduos. Após a retirada do rejeito — o que não pode ser reaproveitado —, cerca de 90 toneladas reaproveitadas são vendidas, o suficiente para pagar as contas e ratear o restante entre os cooperados.

“A gente separa, enfarda, vende. Paga as contas e o que sobra é rateado. Não temos rateio fixo. Uma semana é um valor, na outra é outro. Mas é o nosso trabalho, é dali que a gente tira o sustento”, destaca Nair, diretora administrativa-financeira.

História que se repete

Na região noroeste de Goiânia, a história se repete com outras nuances. A Cooper Rama Cooperativa de Reciclagem, hoje instalada na Chácara Recreio Joaquim, tem 18 anos de existência. Atualmente, a cooperativa está em uma área cedida pelo município, com galpão construído por meio de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) do Ministério Público.

A presidente da Cooper Rama, Dulce Helena, explica que atualmente o local conta com 18 cooperados, mas já chegou a mais de 50. “A queda não se explica por falta de trabalho, mas por crises sucessivas na coleta seletiva, terceirizações sem planejamento e períodos em que o material simplesmente não chegava”, afirma.

 

Mesmo assim, o impacto da cooperativa segue profundo na vida de quem fica. Segundo Dulce, a maior parte do pessoal que trabalha aqui no local é de pessoas sem qualificação profissional, que não conseguem outro trabalho pela idade ou pela falta de estudo. “Aqui, elas passam a ser vistas. Elas se veem fazendo alguma coisa que tem valor.”, reforça.

Na fala de Dulce, reciclar é também reescrever trajetórias. Muda a vida financeira, o social. “A pessoa consegue comprar uma geladeira melhor, uma televisão, fazer uma refeição melhor. Têm mães que viram os filhos alcançarem a faculdade. Isso pra nós, é um marco.”

A Coleta em Goiânia

Desde abril deste ano, o Consórcio Limpa Gyn (Consórcio QC Ambiental) é o responsável pela coleta de lixo domiciliar e seletiva, em Goiânia. A empresa assumiu parte dos serviços antes realizados pela Companhia de Urbanização de Goiânia (Comurg).

Embora a Comurg permaneça responsável pela varrição manual das ruas e avenidas, a decisão de contratar o consórcio foi uma resposta à exigência do Ministério Público de Goiás (MPGO) para solucionar problemas recorrentes na coleta do lixo domiciliar na capital.

A gerente operacional do Limpa Gyn, Bruna Soares Araújo, explica, que todo o material reciclável coletado é encaminhado para as 12 cooperativas vinculadas ao programa de coleta seletiva da cidade.

Gerente operacional do Limpa Gyn, Bruna Soares Araújo

“Entregamos, por mês, em média, entre 3 mil e 3,5 mil toneladas de resíduos seletivos”, revela. Bruna destaca que, quando se olha para o lixo comum, os números passam de 42 mil a 45 mil toneladas de resíduos domiciliares por mês coletadas na Capital. E aí aparece um dos maiores desafios na gestão de resíduos da cidade.

Bruna revela que a coleta seletiva cresceu, o que é positivo. Mas ainda não é nem 10% da população de Goiânia que separa o lixo de maneira correta. “A gente ainda vê muito resíduo reciclável indo para a coleta domiciliar, o que não é o correto”, alerta.

A LimpaGyn mantém uma equipe específica de mobilização e educação ambiental, que atua nos condomínios verticais, para tentar aumentar a adesão, além de divulgar, no site, os planos de coleta e contatos para tirar dúvidas sobre dias e horários em cada bairro.

PROJETO RECICLAR INTENSIFICA AÇÕES DE CONSCIENTIZAÇÃO

A Organização das Cooperativas do Brasil em Goiás (OCB/GO) lançou em junho deste ano, o Movimento Reciclar em parceria com o Conselho de Desenvolvimento Econômico, Sustentável e Estratégico de Goiânia (Codese).

A proposta ambiciosa é aumentar o índice de reciclagem de resíduos sólidos urbanos de Goiânia dos atuais 1,8% para 10% até 2026 e chegar a 50% até 2033, ano do centenário da Capital.

Segundo o presidente da OCB/GO, Luís Alberto Pereira, os próximos passos do Movimento Reciclar são intensificar as ações de conscientização à população sobre a importância da separação correta dos resíduos.

Presidente da OCB/GO, Luís Alberto Pereira

 

Ao mesmo tempo, a OCB/GO busca a definição de um bairro específico para executar um projeto piloto e consolidar as ações em determinada comunidade, que se torne modelo do projeto.

De acordo com Luís Alberto, outra frente crucial será ampliar a divulgação sobre a importância de utilizar sacos azuis para os recicláveis, uma medida fundamental para permitir o rastreamento do material e assegurar que ele seja desviado do aterro sanitário. E o sistema planeja divulgar os resultados quantificados dos resíduos que foram desviados dos aterros e destinados corretamente às cooperativas, por meio da gestão promovida em eventos realizados na capital.

“O modelo cooperativista já tem a sustentabilidade em seu DNA. Acreditamos que, com o Movimento Reciclar, vamos gerar renda para as famílias cooperadas, reduzir o volume de lixo no aterro sanitário e conservar o meio ambiente. É um ciclo virtuoso em que a economia, o social e o ambiental se unem”, ressalta.

Segundo o diretor executivo da Codese, Marcos Villas Boas, o Codese, que é um dos principais parceiros do Movimento Reciclar, o conselho trabalha com um planejamento, denominado Goiânia 2033, com 16 diretrizes para fazer da cidade uma das três melhores capitais do Brasil para se viver.

“Quando a OCB/GO trouxe o dado de que menos de 2% dos resíduos são reciclados em Goiânia, a constatação foi imediata”, diz. Segundo Villas Boas, hoje, são desperdiçados 98% do material que poderia ser reciclável. “Isso tem impacto ambiental gravíssimo, impacto social e impacto econômico”, afirma.

Atualmente, o Movimento Reciclar já está presente em grandes eventos da cidade, como a FIC e feiras de economia criativa, com pontos de coleta e ações de conscientização. Uma das apostas é a distribuição de um milhão de sacos azuis, que servirão para “rastrear” o resíduo reciclável desde a casa até à cooperativa.

De acordo com Villas Boas, a ideia é simples, por exemplo: se o morador colocar o reciclável no saco azul, o caminhão não vai misturar esse resíduo com o lixo comum, e o aterro não vai aceitar esse saco azul. Então, ele volta para a cooperativa. População desperdiça boa parte do que poderia ser reaproveitada.

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