A prática da poesia é mais do que milenar. Séculos antes de Cristo e anterior à própria história da escrita, este gênero literário está presente dentro da humanidade desde quando o ser humano passou a produzir cultura. Em 20 de outubro, comemora-se o Dia do Poeta. Diante de uma sociedade tão tecnológica e voltada para as mídias sociais, ainda é possível galgar espaço nessa área, sobretudo em Goiás?
A poesia como profissão
O Diário do Estado (DE) entrou em contato com Lucas Cândido Brandão, de 38 anos, que possui o nome artístico de Lucão. Natural de Goiânia, ele cresceu em Anápolis e hoje mora em São Paulo. Começou na poesia há muito tempo, mas primeiramente como hobby.
“Eu sou um grande amante dos livros, da literatura, adoro ler desde pequeno. Em algum momento, descobri a poesia lendo e decidi começar a escrever, há 22 anos. Brincava de escrever versos, poemas curtos, inspirados muito naqueles que eu lia: Adélia Prado, Manoel de Barros, Mário Quintana, Rubem Alves. Fui adorando isso”, conta Lucão.
Há 11 anos, começou a divulgar seus poemas sem muita pretensão. Surpreendeu-se com o número de pessoas que começaram a segui-lo nas redes sociais, além de editoras que demonstraram interesse em publicar obras do goiano. Desta forma, impulsionado pela paixão pela palavra, ele iniciou sua investida na escrita como profissão, e não apenas por prazer.
Hoje, Lucão possui 477 mil seguidores no Instagram, e já publicou sete livros: É Cada Coisa que Escrevo só pra Dizer que Te Amo, Telegramas, Dois Avessos, Amores ao Sol, Viver Não Pode Ser Só Isso, Poemas Para Respirar Debaixo d’Água, Entre Bailes e Lutos. No total, são quatro obras de poesia, um romance e duas contendo crônicas.
A realidade de um poeta em Goiás
Para Lucão, a dificuldade de ser poeta em Goiás é a mesma em relação ao resto do Brasil: a falta de incentivo. Por conta disso, o próprio escritor tenta expandir o mercado para outras pessoas lerem de forma mais prazerosa, e não apenas quando surge a obrigação. Assim, ele produz projetos, clubes de leitura e promove encontros para fomentar a literatura.
“Falta a gente participar mais de forma sistêmica, com incentivos públicos que promovam os encontros, as leituras, a descoberta do prazer pelos livros através das palavras. É a maior dificuldade, a grande barreira, mas há muito espaço”, comenta Lucão.
Quanto aos números de engajamento, o poeta goiano afirma que não se importa muito com isso. Naturalmente, ele posta conteúdo nas redes com regularidade por se tratar de seu trabalho, mas o maior tempo que gasta é de fato produzindo.
“Para mim, ser poeta em Goiás é igual em São Paulo. Hoje, meu trabalho, por conta da internet e das redes sociais, tem um alcance que me coloca em contato com gente do mundo todo. Portugal, Estados Unidos, Espanha. Sou um poeta muito orgulhoso de ter nascido em Goiás, mas eu falo muito da minha vivência como gente, ser humano, minha relação com as pessoas e a vida que eu observo com meus olhos”, declara Lucão.
Por fim, ele acredita que as pessoas precisam ler o que lhes comove. De acordo com sua vivência, muitos dizem que não gostam de poesia, mas, no momento em que encontram a poesia certa, passam a gostar. Portanto, há muito mercado tanto para os escritores quanto para os leitores.
Uma segunda opinião
Para buscar uma outra opinião acerca do assunto, entramos em contato com Gustavo Mendes, de 21 anos, também natural de Goiânia. Com pouco mais de 100 mil seguidores, ele já publicou dois livros de poesia: Flores Suicidas: Uma Ode à Adolescência, e Pantheos, este último disponível de forma gratuita por meio deste link.
“Tem algo já muito poético em fazer poesia no coração do Brasil. Goiás é um estado em que vivências diferentes se contrapõem, se chocam, entram em conflito. Num local onde parece predominar um desejo pelo passado, os poetas vêm como arautos do presente, trazendo em versos marginais, slams, livros, zines, revistas e saraus aquilo que tem de mais novo e pulsante na população goiana. Em outras palavras, é, nas mesmas medidas, trabalhoso e delicioso”, comenta o jovem.
Na realidade mais expandida da profissão, Gustavo acredita que não dá para resumir poesia como um mero emprego nos moldes mais comuns de mercado. Em sua opinião, fazer poesia é trabalho, mas também é resistir e se manifestar no mundo.
“Acho que nunca vai deixar de ter espaço para poetas no Brasil. As barreiras que nos colocam, falta de incentivo, controle cultural, ausência de oportunidades, censura e tantos outros, nos impedem de fazer muito, mas também são combustível para que sejamos cada vez mais transgressores”, conclui.