E se Brasil vencesse a Copa de 50? “Talvez deitasse nos louros”, diz Simas
Terceiro episódio da série Campo da Imaginação revisita “Maracanazzo” e imagina efeitos de um título mundial para o país. Historiador diz que derrota para o Uruguai viabilizou geração de 1958.
Um dos eventos mais impactantes da história do futebol brasileiro é o tema do terceiro episódio do podcast Campo da Imaginação. A série, que revisita momentos históricos do esporte e reescreve seus desfechos, vislumbra um novo final para a traumática derrota da Seleção Brasileira para o Uruguai na última partida da Copa do Mundo de 1950, e todos os seus desdobramentos para o país. Ouça abaixo.
O historiador, escritor e professor Luiz Antônio Simas concedeu entrevista na produção do episódio e explicou por que aquele revés por 2 a 1, eternizada sob o nome “Maracanazzo”, foi tão marcante não só para o futebol brasileiro, como para o povo em geral.
O primeiro aspecto é que ela é um baque nesse, digamos, discurso, que o governo (do presidente Eurico Gaspar) Dutra vinha tentando promover, mantendo ainda certas características dos tempos do Estado Novo, do discurso de grandeza do país. De certa forma, é um balde de água fria, aquela sensação de que as coisas não iriam funcionar. E eu costumo dizer que o Brasil toma, na autoestima do projeto da nação, dois cacetes um atrás do outro. A gente costuma pensá-los desvinculados, mas eu acho que não. Perder a Copa em casa em 50, e o suicídio do Getúlio (Vargas) em 54, num espaço de tempo, que é muito curto. São duas pauladas. Numa certa construção simbólica da estima nacional. São muito pesadas – analisa Simas.
Ademir Menezes (de branco) fez oito gols para o Brasil na Copa do Mundo de 1950.
Ouça os demais episódios de Campo da Imaginação:
– Ep. 1 – E se Senna tivesse escapado? Podcast imagina vida do piloto pós-Ímola.
– Ep. 2 – Campo da Imaginação coloca Marta ao lado de Neymar em seleção mista.
Mas se a Seleção tivesse vencido, o que seria diferente? Teríamos um time hexacampeão mundial? O historiador não tem tanta certeza.
Eu suspeito que a derrota de 50 tenha viabilizado a era de ouro do futebol brasileiro, que vai de 1958 a 70. Porque, de certa forma, você ajustou muita coisa. A coisa ganhou uma outra dinâmica, até em relação à preparação da Seleção, a relevância do futebol, e 58 foi o título na Suécia. É difícil dizer, mas eu acho que é possível que parasse naquela geração, que já era uma geração que estava envelhecida.
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Outra diferença de um mundo sem a derrota de 1950 é que talvez a Seleção jamais trajasse a camisa amarela, uma vez que a camisa branca usada naquela ocasião não receberia a pecha de “azarada”. Simas revela outra mudança que poucos sabem que teria acontecido.
O Maracanã teria outra cor, porque o Maracanã foi azul por causa do título do Uruguai. Na verdade, ele não estava com a pintura definitiva e foi estabelecido que ele seria pintado nas cores da seleção campeã. Poderia ser branco, o Brasil jogava de branco.
Devido ao regulamento daquela Copa, única que teve um quadrangular decisivo em vez de uma partida final, o Brasil chegou ao último jogo precisando apenas do empate para ser campeão. A Seleção Brasileira poderia ter entrado em campo já com o título garantido, pois o Uruguai estava perdendo para a Suécia por 2 a 1 até os 33 minutos do segundo tempo, antes de Míguez marcar dois gols e virarem o placar.
Barbosa (camisa 1) foi o goleiro do Brasil na Copa de 1950.
Mas quis o destino que os uruguaios derrotassem o Brasil. E com muito mérito, segundo teria confessado o próprio Zizinho, um dos grandes craques daquela seleção, a Simas, três meses antes de morrer.
A gente ia fazer um evento em Casemiro de Abreu no dia seguinte. O Zizinho gostava muito de beber um chopinho, na boa, e aí é inevitável, depois do quinto chope você pergunta sobre a Copa de 50. Ele é muito afável e ele falou uma coisa que é interessante: “Garoto, vou te falar uma coisa. Ainda bem que não tem a transmissão toda daquele jogo”. O Zizinho me falou isso, não tenho nada a ver com isso.
“Primeiro que era equilibrado. Brasil x Uruguai, um ganhava um jogo e outro ganhava o outro, era pau a pau. O time do Uruguai era um timaço, tinha por exemplo o maior centroavante que eu vi na vida, o Schiafino. E ainda bem que não tinha transmissão, porque nós não jogamos nada!”, Zizinho falou isso. “A gente foi atabalhoado, o Uruguai cozinhou aquele jogo e levou o jogo como quis.” Não foi aquele jogo de o Brasil dando 250 mil chutes… O Brasil saiu cruzando bola na área, começou a cruzar depois que tomou o segundo gol, mas o Zizinho falou isso, que o Uruguai jogou melhor. Não tem muito o que explicar – revela Simas.
Disponível no ge, na globo.com/podcasts e nas plataformas de áudio, “Campo da Imaginação” terá, ao todo, cinco episódios, com novas publicações às segundas-feiras.