90% dos indígenas Avá-Guarani estão em situação de insegurança alimentar no
oeste do Paraná, aponta estudo
Pesquisa da Defensoria Pública indica que maioria dos indígenas deGuaíra contam
com apenas uma refeição por dia. DE e RPC tiveram acesso com exclusividade aos resultados preliminares.
1 de 5 Comunidade indígena Avá-Guarani — Foto: Daniel Caron/DICOMDPE-PR
Pelo menos 90% dos indígenas Avá-Guarani que moram na comunidade emGuaíra, oeste do Paraná,
estão em situação de insegurança alimentar.
O número consta no resultado preliminar de um estudo social feito pelo Núcleo de
Promoção da Igualdade Étnico-Racial da Defensoria Pública do Paraná (DPE-PR). O
DE Paraná e RPC tiveram acesso com
exclusividade aos dados.
O estudo mostrou, por exemplo, que a maioria dos indígenas só tem uma refeição
por dia.
A pesquisa foi desenvolvida por uma equipe multidisciplinar composta por
assistentes sociais, assessores jurídicos e defensores públicos, que foram até a
comunidade depois de uma série de ataques violentos sofridos pelos indígenas da
região nos últimos anos em disputa de terras com fazendeiros.
Em janeiro deste ano, quatro indígenas foram baleados
na comunidade, incluindo duas crianças. Foi após esse ataque que a equipe
decidiu visitar a região.
2 de 5 Comunidade indígena Avá-Guarani — Foto: Daniel Caron/DICOMDPE-PR
Veja histórico: conflitos envolvendo indígenas se estendem por décadas no
Paraná
A defensora pública Camille Vieira da Costa explica que a motivação inicial da
pesquisa foi verificar as questões de segurança da comunidade, mas, após a
visita, identificaram outros pontos tão urgentes quanto e que não estavam sendo
cumpridos na saúde, educação, moradia e emprego e renda.
A Defensoria Pública do Paraná ouviu 67 famílias na aldeia Yvy Okaju, em Guaíra.
“A gente verificou que muito além da questão da segurança, que é muito
importante é uma questão de vulnerabilidade social. A ausência quase que
completa de políticas públicas para garantir, por exemplo, a alimentação”.
Saúde
Na saúde, o órgão identificou que cinco pessoas estavam com balas alojadas no
corpo durante a visita. Eles também identificaram que a maioria das pessoas
ouvidas relatou ter sido afetada psicologicamente pelos ataques.
No questionário, eles responderam que gostariam de receber um atendimento
psicológico.
Os indígenas também informaram que a discriminação e preconceito que sofrem
afastam a aldeia da atenção básica de saúde.
Emprego e Renda
De acordo com o mapeamento, a maioria dos indígenas trabalham em empregos
temporários, como em colheitas ou outros trabalhos informais; e uma minoria
recebe entre R$ 2 mil e R$ 5 mil.
Educação
Na educação, o estudo identificou que há apenas uma escola na parte antiga da
aldeia, com dois professores, o que é insuficiente para a quantidade de
estudantes, na avaliação da DPE.
A maioria dos alunos está matriculado em escolas e colégios não-indígenas.
Também há relatos de discriminação e preconceito.
Moradia
Sobre a moradia, o mapeamento levantou que a maioria das casas possui um
dormitório para toda a família, sem acesso à água encanada. Também não há
banheiros.
Atuação após o estudo
O estudo social foi desenvolvido para mapear as principais vulnerabilidades e
nortear a ação do Núcleo da Defensoria para pleitear pedidos para que as
políticas públicas cheguem na aldeia.
Mesmo com dados preliminares, o estudo já realizou algumas ações pontuais.
Em relação à saúde, a defensoria oficiou o Ministério da Saúde e a Secretaria de
Estado de Saúde sobre os indígenas que ainda estavam com balas alojadas no
corpo. Após a intervenção, um indígena de 14 anos teve a bala retirada. Os
demais devem ser atendidos em breve.
O assessor jurídico Diekiscon Braian Ribeiro esclarece que também houve
comunicação com o Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI).
“Após reunião com o órgão, foi acordado que será elaborado um plano de
trabalho para atender à situação de saúde mental, especialmente para as
crianças. Durante nossa visita, conseguimos identificar que muitas delas estão
sofrendo com o medo”, contou o assessor.
Ele também destaca que a defensoria tem atuado como uma ponte entre os órgãos
públicos e a comunidade, buscando garantir a implementação das políticas
públicas na região, enquanto a questão fundiária não é resolvida.
“Um dos principais objetivos da defensoria lá é ouvir a comunidade, entender a
complexidade dos problemas enfrentados pelos indígenas e levar essas questões ao
conhecimento de outras instituições”, explicou.
Além do estudo social, o órgão está realizando, em parceria com a Defensoria
Pública da União, um mapeamento das ações judiciais que tramitam na Justiça
Federal envolvendo as comunidades.
“Observamos que, em alguns casos, o direito já foi reconhecido pela justiça,
como no caso da educação, mas na prática ainda não foi implementado”, concluiu.
O que diz a FUNAI
Em nota, a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) informou que o órgão
atende os indígenas de toda a região do oeste paranaense, em mais de 30 aldeias
em seis municípios, e que a unidade local atua na promoção de direitos sociais
para garantir desde o acesso a documentação civil básica, até benefícios
sociais.
A nota afirma que “não há como negar que existe um quadro generalizado de
dificuldades socioeconômicas enfrentadas pelas comunidades da região, sobretudo
em comunidades como Guaíra e Terra Roxa.
Ainda assim, existem muitas ações por parte do poder público local em favor do acesso à
políticas públicas e da segurança alimentar. A Funai auxilia na distribuição de
cestas básicas adquiridas pelo Ministério da Cidadania”.
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