Microplásticos contaminam todas áreas marinhas protegidas do Brasil. Estudo revela que microplásticos atingem até áreas de proteção integral, com impactos potenciais para ecossistemas e cadeias alimentares. Todas as 10 áreas marinhas de proteção integral do Brasil que foram investigadas por pesquisadores de universidades brasileiras e australianas estão contaminadas por microplásticos. As áreas de mar deveriam ser as com presença humana mais restrita para preservar a vida marinha.
A investigação indica que há impactos potenciais para os ecossistemas e cadeias alimentares que deveriam ser protegidos da contaminação. A pesquisa foi publicada na revista Environmental Research em 15 de março. “Encontramos microplásticos, por exemplo, no Atol das Rocas, onde não há qualquer atividade econômica nem é permitida a visitação de turistas. Os microplásticos podem chegar a esses locais transportados pelo vento ou pelas correntes oceânicas”, explica Ítalo Braga, professor do Instituto do Mar da Universidade Federal de São Paulo e coordenador da pesquisa, em entrevista à Agência Fapesp.
Os microplásticos são partículas que variam de um mícron até cinco milímetros (tamanho de um grão de areia grosso). Eles são resultado da fragmentação de plásticos maiores ou fabricados diretamente nesse formato e se acumulam nos organismos de seres vivos, já que não podem ser digeridos. No estudo, foram detectados predominantemente plásticos pretos, brancos ou transparentes, com tamanho médio inferior a 1 milímetro. A análise química identificou polímeros alquídicos, celulose, PET e teflon como principais componentes.
A pesquisa focou em dez áreas de proteção integral, incluindo o Parque Nacional de Jericoacoara, Fernando de Noronha e o Atol das Rocas. A concentração média de microplásticos foi de 0,42 partícula por grama de tecido úmido. O Refúgio de Vida Silvestre do Arquipélago de Alcatrazes apresentou a maior contaminação, com 0,90 partícula por grama, enquanto o Atol das Rocas registrou a menor, com 0,23. “O dado positivo é que a contaminação em todas essas áreas está abaixo da média internacional para áreas marinhas protegidas, e muito abaixo da média brasileira para áreas não protegidas. Locais muito contaminados, como Santos e algumas praias do Rio de Janeiro, chegam a apresentar contaminações de 50 a 60 vezes maior”, comenta Braga.
O estudo utilizou moluscos bivalves, como ostras e mexilhões, como indicadores de poluição, investigando a quantidade de plástico encontrada em seus organismos. Os moluscos bivalves foram escolhidos como organismos-sentinelas por filtrarem a água marinha, retendo partículas, incluindo microplásticos. “Eles acumulam poluentes ao longo do tempo, fornecendo um histórico mais confiável da contaminação”, explica o pesquisador.
A presença de microplásticos em áreas protegidas representa riscos para ecossistemas marinhos e cadeias alimentares. “A criação de Áreas Marinhas Protegidas, por si só, não é suficiente para barrar a poluição. É fundamental que essas áreas contem com gestão ambiental eficiente e fiscalização rigorosa”, afirma Braga. No entanto, medidas locais podem não ser suficientes, já que partículas plásticas podem ser transportadas de longe por correntes oceânicas e ventos. “Para mitigar isso, apenas medidas globais, como o Tratado Global dos Plásticos, atualmente em fase de negociação, podem fazer diferença”, conclui o pesquisador.