Uma ex-funcionária da Basílica de Trindade relatou ao Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) que cedeu seu nome para se tornar sócia de uma rádio vinculada à Associação Filhos do Pai Eterno (Afipe) e que assinou documentos em branco relacionados a essa questão. Celestina Celis Bueno, que também chegou a ser conselheira fiscal da entidade, relatou ainda que “não recebeu valor algum” para emprestar seu nome e que o fez “pela amizade com o padre Robson”.
A relato consta no recurso apresentado pelo MP solicitando o debloqueio das investigações contra o padre por supostos desvios na Afipe. A Justiça trancou a apuração no dia 6 de outubro por entender que não houve crime. O pároco sempre negou as acusações e se afastou da direção da Afipe no mesmo dia da operação que o investigou, em 21 de agosto.
A advogada de Celestina, Cláudia Seixas, informou que não vai se pronunciar sobre o assunto.
Em nota, a defesa do padre Robson informou que “questões tratadas fora do processo são subterfúgios para vazar elementos de investigação já trancada, portanto, em sigilo” e que a decisão da Justiça de trancar a ação “restabeleceu a verdade: não houve irregularidades na gestão da Afipe” (leia a íntegra ao final do texto).
Já a assessoria da Afipe informou que Celestina “já não fazia parte dos quadros da associação” quando a nova direção assumiu e disse que “reafirma seu compromisso com a transparência e com a apuração de todos os fatos” (leia a íntegra ao final do texto).
Ex-doméstica, Celestina trabalhou na Basílica de Trindade a convite do padre Robson, recebendo salário de R$ 1 mil. Porém, chegou a fazer transações de mais de R$ 4 milhões, além de se tornar dona de emissoras de rádio, um avião e uma casa na praia. Ela relatou que abriu uma conta bancária, mas que não sabia dos valores realizados nela, nem que a gerenciava.
No depoimento ao MP, Celestina afirmou que, certo dia, padre Robson a chamou para conversar e “pediu para usar seu nome no quadro societário de uma rádio”. A justificativa dele, segundo ela, era que, “em razão das leis de comunicação, a Afipe não poderia ter tais empresas vinculadas aos seus CNPJs”.
A mulher afirmou que “cedeu seu nome e não sabia o que estava acontecendo”. Ela admitiu que, durante a conversa com o religioso, “assinou alguns papéis em branco”.
“Assinava sem questionar, sem ler e sem ter conhecimento [ do que se tratava]. Confiava em padre Robson”, relata Celestina, conforme o documento.
Casa de praia foi vendida para a Afipe por uma das rádios de que Celestina era sócia — Foto: Reprodução/Fantástico
‘Laranjas ‘ e ‘organização criminosa’
No mesmo documento, o MP listou o interrogatório de outras quatro pessoas, todas elas apontadas pelo órgão como “laranjas” do padre Robson. Todos declararam aos promotores de Justiça ter integrado a diretoria da entidade a convite do padre, mas disseram que não sabiam que tinham sido inclusos como sócios de empresas vinculadas à Afipe. Os relatos também mostram que eles atuaram como intermediários para a compra de imóveis para parentes do padre.
No documento, o MP alega que as provas “aniquilariam a tese” de que investigava apenas atos da gestão da Afipe. Esse tema foi levantado pela defesa do padre para justificar a “atipicidade” dos fatos, ou seja, a ausência de crime, que embasou a decisão judicial.
Além disso, na conclusão dos embargos, após listados os depoimentos e suspeitas de irregularidades, os promotores indicam “a existência de uma organização criminosa empresarial da qual o paciente Robson de Oliveira seria supostamente o seu líder e cujos membros teriam se utilizado da estrutura de diversas pessoas jurídicas”.