Ex-soldado agredido por 6 durante ‘batismo’ sofre para dormir e toma 3 remédios: ‘que sejam punidos’
Espancado com cabo de vassoura e outros objetos em quartel de Pirassununga (SP), jovem tem gasto de R$ 350 por mês com ansiolítico, antidepressivo e antipsicótico.
O prédio do 13º Regimento de Cavalaria Mecanizado, em Pirassununga; jovem ficou com diversos hematomas após agressão em quartel — Foto: Arquivo pessoal e João Oliveira / Força Aérea Brasileira
O ex-soldado de 19 anos, que denunciou ter sido agredido no 13º Regimento de Cavalaria Mecanizado, em Pirassununga (SP), falou pela primeira vez sobre o caso ao DE, nesta quarta-feira (4).
Após cinco meses da violência, o rapaz, que prefere não se identificar, ainda tem dificuldades para dormir e toma três medicamentos – ansiolítico, antidepressivo e antipsicótico – para se recuperar do trauma. Os gastos, cerca de R$ 350 por mês, são bancados pelo tio, com quem está morando atualmente.
O jovem, que foi desligado do Exército Brasileiro em abril e busca reintegração na Justiça, está com problemas para conseguir consulta com psicólogo. “Estou há duas semanas sem conseguir consulta. Pediram para pegar a guia nesta quarta, mas não sei se vão liberar. [Falam] para esperar”, disse o rapaz, que também é acompanhado por psiquiatra.
A agressão aconteceu em 16 de janeiro dentro do quartel por seis colegas, que foram expulsos pela instituição. Foram usados remo de panela industrial, pedaços de ripa de madeira, e uma vassoura foi quebrada na região do ânus dele. Outros cinco militares também foram agredidos.
> “Falaram que era um trote, um batismo, e acontecia com todo mundo. [Espero] que eles sejam punidos perante a lei”.
O DE questionou o Exército, que manteve a mesma resposta da semana passada, em que garantia estar mantendo o tratamento médico do ex-militar mesmo com o licenciamento.
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TRAUMA E RECUPERAÇÃO
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O ex-soldado relatou que ainda não conseguiu retomar a rotina após a sessão de espancamento. “Se não tomar [remédios], fico nervoso. Ainda sinto [bastante] raiva”, disse.
Ainda sem condições de trabalhar, ele disse que quase não sai de casa e tem a ajuda do tio na recuperação. “[A vida] não tá normal, normal estaria se eu tivesse bem, pagando minhas contas, fazendo minhas coisas. Estou dependendo dos outros”, relatou.
> “Tem dia que eu não durmo. Tem que tomar o dobro da medicação que o médico passou [para dormir]. Eu fico escutando barulho. Sonho com o dia [da agressão] de vez em quando”, afirmou.
Ele acredita que o Exército não está dando todo o suporte necessário. “Faz duas semanas que não vou ao psicólogo, estão negando a guia dizendo que não há crédito com o convênio para liberação. Medicamento tenho que pagar. É um tratamento só por médico. [O Exército] poderia estar apoiando mais”.
O rapaz considerou justa a expulsão dos agressores, com quem não teve mais contato. Ele diz que não pensa em voltar ao Exército.
> “Só quero que eles paguem e me deixem em paz, ninguém me perturbe”.
O processo de lesão corporal leve e violência contra inferior hierárquico, que é o caso de agressão física ou verbal de um superior contra um subordinado, continua em andamento. O Código Penal Militar estabelece, em seu artigo 9º, que crimes cometidos por militares da ativa contra militares na mesma condição devem ser julgados pela Justiça Militar.
LICENCIAMENTO E PEDIDO DE REINTEGRAÇÃO
Apesar de licenciado, termo usado pelo Exército para o desligamento, a corporação garantiu que “mesmo após o licenciamento, o tratamento médico do ex-militar permanece assegurado pelo Exército Brasileiro, em consonância com os preceitos legais”.
À reportagem, Pablo Canhadas, advogado de defesa da vítima, afirmou que ingressou com ação no Tribunal Regional Federal da 3ª Região pedindo a reintegração do soldado – o processo está em andamento.
Canhadas também afirmou que o jovem passou por uma avaliação com um médico psiquiatra do Exército no dia 7 de abril, em São Paulo, e este profissional o teria diagnosticado como inapto para atividades. “Só que nunca nos deram a cópia dessa avaliação.”
O Comando Militar do Sudeste não respondeu especificamente sobre essa questão, mas anteriormente havia informado que “informações relativas à saúde individual estão resguardadas pelo sigilo inerente à relação médico-paciente”.
O DE também teve acesso à avaliação feita por um psicólogo do convênio do soldado e, em 3 de abril, o profissional concluiu que ele “não se encontra apto a exercer atividades laborais e necessita continuar o seu acompanhamento até que esteja em melhores condições para reaver sua rotina”.
Agora, com o desligamento, a preocupação do advogado de defesa é que ele fique sem vencimentos, já que ainda estaria traumatizado.
Segundo Canhadas, o último salário pago pelo Exército ao soldado, em 15 de maio, teve descontos e veio com R$ 981,98. “Alegaram que ele não devolveu o fardamento e alguns itens, por isso o desconto. Como a mulher dele não trabalha, precisei ajudar até com uma cesta básica”, afirmou. O Comando Militar do Sudeste também não se manifestou sobre essa informação.
AGRESSÕES EM QUARTEL
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O ex-soldado denunciou que a violência aconteceu em 16 de janeiro, quando estava organizando um espaço dentro do quartel e outros soldados disseram que ele teria que limpar uma câmara fria.
O jovem disse que, ao chegar no local, foi violentamente agredido com diversos objetos e teve a farda arrancada. O inquérito policial militar (IPM), instaurado em 20 de janeiro e concluído, transitou sob sigilo, mas a ação penal militar é pública.
Em nota, na época, o Exército Brasileiro informou que “repudia, veementemente, a prática de maus-tratos ou qualquer ato que viole os direitos fundamentais do cidadão”.
Ao DE, Adriana Casanova Garbatti, advogada de defesa dos ex-militares, informou que vai se manifestar apenas no processo. “Porque existem controvérsias em alguns pontos e serão esclarecidos durante a instrução processual”, afirmou.