Fernanda Abreu celebra 35 anos de carreira solo e fala sobre novos fãs LGBTQIA+: ‘Galera me redescobriu’
Cantora explicou ‘quase feat’ com Anitta, fascínio pelo funk e história surreal de quando cantou em casamento libanês. Ela foi convidada no DE Ouviu, podcast e videocast do DE.
‘Eu não faço uma música panfletária, militante’, diz Fernanda Abreu
Fernanda Abreu foi entrevistada ao vivo no DE Ouviu, o podcast e videocast de música do DE, nesta quarta-feira (22). A conversa fica disponível em vídeo e podcast no DE, no YouTube, no TikTok e nas plataformas de áudio.
Fernanda começou a entrevista falando do início de trajetória como artista solo, em 1990, após fazer parte da banda Blitz. “Existe uma expectativa que todo artista tem quando vai sair em carreira solo”, Fernanda comentou. “Foi com o ‘Da Lata’ que eu consegui afirmar uma estética musical muito diferente, um pop samba funk, e que botei o Brasil naquela pista toda.”
Ela está lançando um documentário sobre os 30 anos do álbum “Da lata”. O disco mesclava samba, hip hop, R&B e música eletrônica. Ela contou que a ideia veio depois que um amigo diretor, Paulo Severo, encontrou 40 horas de material sobre o disco com imagens de estúdio, sessões de foto e outras cenas de bastidores de clipes e shows. Tudo era inédito.
A cantora de 64 anos falou ainda sobre as letras e os arranjos de suas canções. “Eu não faço uma música panfletária, militante, a minha pegada é jogar as minhas sensações urbanas e as pessoas meio entenderem como elas quiserem. Eu vou jogando ali… As pessoas vão entendendo o que elas quiserem entender. E como eu sou bailarina, seria impossível fazer uma música que não fosse dançante.”
Fernanda Abreu disse que nos anos 90 e 2000 a indústria musical quase não tinha mulheres, seja nos bastidores, na produção e na imprensa. “No final das contas, você tem que colocar a sua autoridade. A última palavra tinha que ser minha. Eu me via como uma maestrina em uma grande orquestra de homens.”
Fernanda falou sobre sua relação com a comunidade LGBTQIA+. Ela disse que sempre foi muito “cercada por gays”, por ter interesses em comum como arte, noite, moda, dança e novidades da cultura. “Eu acho que de um tempo para cá tem uma galera que redescobriu, sabe? Eu senti que DJs novos começaram a me mandar inbox, me convidar para ir às festas. Por conta disso, eu fiz um álbum chamado ’30 anos de baile’ só com remix”, ela explicou. “Eu sinto que tem uma coisa que muitos meninos falam para mim que de uma certa maneira tiveram um conforto com a minha música. De se sentirem gays, irem para night, pintarem o cabelo como quiserem, usarem os adereços que quiserem.”
Outro exemplo de novos fãs levou a cantora a tocar em um casamento em Avignon, no Sul da França. Um casal de libaneses, que mora em Londres, contratou para que ela tocasse na festa de casamento deles. Eles tinham ido ao Rio, onde descobriram o primeiro disco (“SLA Radical”, de 1990) da cantora durante uma festa. “Foi demais. A gente tem que aproveitar a vida”, ela resumiu.
Nos anos 80, quando saiu da Blitz, Fernanda teve chance de lançar um disco “de gravadora”, com músicas de outros compositores, mas preferiu fazer uma pausa de quatro anos e fazer seu próprio projeto. “Muita gente dizia, todos os caras de gravadora diziam que iriam me esquecer”, ela lembrou. “A gente vai arriscando na vida, mas hoje olhando para trás foi a melhor coisa que eu fiz. Eu fiz realmente um disco que eu quis, a minha cara e trouxe para o público uma assinatura.”
FERNANDA E O FUNK HOJE E ONTEM
3 de 3 Fernanda Abreu é entrevistada pelas jornalistas Marília Neves e Dora Guerra no programa DE Ouviu, no estúdio do DE em São Paulo — Foto: Fábio Tito/DE
Fernanda Abreu é entrevistada pelas jornalistas Marília Neves e Dora Guerra no programa DE Ouviu, no estúdio do DE em São Paulo — Foto: Fábio Tito/DE
Fernanda fazia parte da cena pop rock da Zona Sul do Rio de Janeiro e ficou impactada quando foi a um baile funk, a convite do antropólogo Hermano Vianna, irmão do vocalista do Paralamas.
“E eu fiquei chocada, porque o único sound system que eu tinha ouvido falar era de Londres, do reggae. E quando eu entrei no baile funk e vi aquele paradão da Furacão 2000 e aquela galera dançando, aquele som grave. Não tinha MC ainda, eram só duelos de equipes de som, depois que vieram Cidinho e Doca com ‘Rap da felicidade’, Claudinho & Buchecha”, ela relembrou.
Fernanda seguiu falando sobre a “cultura periférica, de favela” que tanto influenciou seus primeiros álbuns. “A gente entendia que aquilo estava sendo muito marginalizado… as pessoas não tinham preconceito contra o beat, contra a música. Falavam de maneira jocosa que não era uma poesia incrível. Mas, no fundo, o grande preconceito era um preconceito racial.”