Ninguém lamenta pelo general
Quem tem, tem medo e por isso silencia
Aproprio-me da pergunta feita ontem à tarde em um grupo de WhatsApp pelo
ex-senador Cristovam Buarque (Cidadania): “Eu gostaria de saber o que a “tropa”
está pensando: Braga Netto é um golpista criminoso ou foi um patriota
incompetente?”
Em nota, o Exército disse que acompanha “as diligências realizadas por
determinação da Justiça”, colabora “com as investigações”, mas não se manifesta
sobre processos conduzidos por outros órgãos em respeito às demais instituições
da República.
Transcorridas mais de 12 horas da prisão de Braga Netto, Bolsonaro finalmente
disse alguma coisa. Postou nas redes sociais:
– Há mais de 10 dias o ‘inquérito’ foi concluído pela Polícia Federal indiciando
37 pessoas e encaminhado ao Ministério Público. Como alguém, hoje, pode ser
preso por obstruir investigações já concluídas?”
O inquérito ao qual Bolsonaro se referiu é o que investiga o golpe de Estado
fracassado de dezembro de 2022 para impedir a posse de Lula, e o puxadinho do
golpe que em 8 de janeiro de 2023 resultou na depredação de prédios na Praça dos
Três Poderes.
Bolsonaro, Braga Netto e mais 38 pessoas, sendo 27 militares, foram indiciadas
por se envolverem nos dois episódios. Serão denunciadas daqui a meses pela
Procuradoria-Geral da República e em seguida condenadas pelo Supremo Tribunal
Federal.
Walter Braga Netto, 67 anos, filho de general, neto de major, é o primeiro
general quatro estrelas a ser preso na era democrática do Brasil. Antes dele,
apenas Hermes da Fonseca, que presidiu o Brasil no alvorecer do século passado,
também foi preso.
Sobrinho do marechal Deodoro da Fonseca, primeiro presidente do Brasil, Hermes
foi preso no dia 2 de julho de 1922 por ordem do então presidente Epitácio
Pessoa; solto no dia seguinte; preso 48 horas depois; e preso permaneceu por
seis meses.
O avô de Braga Netto foi um militar da linha dura do Exército. Conspirou para
depor o presidente eleito Getúlio Vargas que se matou para não ser deposto;
conspirou para evitar a eleição de Juscelino Kubistchek e depois a sua posse.
O pai de Braga Netto foi contra a posse de João Goulart que sucedeu a Jânio
Quadros em 1961; em 1964, apoiou o golpe que derrubou Goulart; e em 1984,
tentou minar a candidatura de Tancredo Neves que se elegeu e morreu sem tomar
posse.
Não procede o que disse Bolsonaro sobre a prisão de Braga Netto, seu ex-ministro
da Casa Civil e da Defesa, e candidato a vice-presidente em sua chapa (“Como
alguém, hoje, pode ser preso por obstruir investigações já concluídas?”).
Para a Polícia Federal, o inquérito do golpe não está encerrado e novos dados
serão enviados ao Supremo Tribunal Federal e à Procuradoria-Geral da República.
Assim também entende o ministro Alexandre de Moraes, presidente do inquérito.
Não procede a reclamação do general Hamilton Mourão (Republicanos-RS),
ex-vice-presidente da República e agora senador: “A prisão de Braga Netto é um
atropelo das normas legais”. O Supremo é quem decide se uma norma é ilegal ou
não.
Bolsonaro considera ilegal a presença de Moraes à frente do inquérito porque o
ministro seria um dos alvos do golpe e, portanto, parte interessada. Na semana
passada, por 9 votos contra 1, o Supremo manteve Moraes no comando do inquérito.
Braga Netto foi preso por tentativa de obstrução da justiça. É disso que
Bolsonaro morre de medo.