Uma auditoria revelou esquema de fraudes em licitações de asfalto feitas durante o governo Bolsonaro pela Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), que realiza obras de pavimentação e máquinas em regiões metropolitanas em todo o país. A avaliação do Tribunal de Contas da União (TCU) apontou irregularidades entre 2019 e 2021.
O chamado Cartel do Asfalto seria formado por 35 empresas. O problema teria sido identificado pelos técnicos na sede da estatal federal, em Brasília, e nas superintendências regionais em 63 pregões com valor total de R$ 1,13 bilhão concorridos por 27 empresas.
Parte das integrantes no processo estaria presente “apenas a cobrir a participação dessa empresa líder (Engefort), compondo o número de participantes dos certames a fim de dar aparência de concorrência”, de acordo com o relatório do TCU. Outras seriam criadas como fachada pela Engefort, como a Del, que enviariam propostas falsas e serviriam para rodízio entre as candidatas ao contrato.
Foi verificado que havia participantes sem experiência e sem habilitação técnica exigida pelos editais na execução das obras pleiteadas, com poucas condições financeiras para pleitear um contrato, quadro de funcionários pequeno para o trabalho, com endereço até 2 mil quilômetros de distância de onde seria a obra e com ausência de histórico de proposta em pregões no estado com sede da concorrente. Em duas empresas havia capital social inferior a 5% do total contratado.
No período apurado foi verificado aumento dos lotes e recursos licitado, menos concorrência e desconto médio abaixo do usual. Somente no ano passado, 50 licitações vencedoras da empresa Engefort tiveram somente 1% de abatimento. No primeiro ano do governo Bolsonaro, a média caiu de 24,5% para 5,32% nos últimos três anos. Na Internet, o assunto ganhou o apelido de “Bolsolão do asfalto”.
Mudança drástica
A Codevasf, Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), foi criada para promover projetos de irrigação no semiárido, mas passou a cuidar de asfalto na atual gestão do chefe do Executivo federal. Denúncias relacionando a Companhia a irregularidades sugerem que ela serviu de moeda de troca da bancada do Centrão do Congresso Nacional por apoio a pautas do governo Bolsonaro.
Risco
As fraudes estariam “representando um risco à própria gestão da empresa pública”, considerou o ministro do TCU e relator do caso, Jorge Oliveira. Ele é amigo pessoal do presidente Jair e articularia projetos de interesse do atual governo, chegando a contrariar o parecer da área técnica que pede a suspensão de obras relacionadas a licitações supostamente fraudados.
Ele foi indicado ao cargo por Bolsonaro em 2020. Ele afirmou na sessão mais recente do Tribunal que, embora reconheça indícios de fraude no processo, não é possível confirmar o cartel em todas as licitações.
“Uma vez que a suspensão dos procedimentos adviria da existência de conluios, é necessário que o Tribunal primeiramente se manifeste conclusivamente acerca da existência desses conluios e os admita como tal. E isso somente será deliberado após o esgotamento do assunto pela Seinfra Operações, quando este Plenário, então, poderá chancelar, ou não, a compreensão acerca da existência do esquema colusivo”, argumentou Jorge Oliveira.
Resposta
A Engefort negou irregularidades e desconhece a existência de cartel liderado pela empresa. A Codevasf também refutou ter cometido práticas em desacordo com a legislação porque “os procedimentos licitatórios da instituição são realizados de acordo com leis aplicáveis, por meio do portal de compras do governo federal, e são abertos à livre participação de empresas de todo o país”, afirmou por meio de nota.