Grau de Investimento: Importância, Desafios e Estratégias para Recuperação

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Grau de investimento já

Países e empresas são tomadores de dívida, ou seja, precisam captar recursos de terceiros para financiar suas próprias atividades. Em meados do século XIX, com o desenvolvimento do comércio fruto da Revolução Industrial, surgiram organizações dedicadas a compilar informações financeiras sobre empresas e governos, de modo a medir e classificar a capacidade desses devedores de cumprir suas obrigações. Era o início do modelo de negócios das chamadas agências de classificação de risco, que são hoje largamente usadas por investidores para instruir suas decisões sobre onde alocar seus recursos.

As agências atribuem notas aos títulos emitidos por empresas privadas no mercado financeiro e pelos títulos emitidos por estados soberanos. Essas notas servem como referência para o cálculo dos juros que recaem sobre tais títulos. Atualmente, 95% do mercado de agências de classificação de risco está concentrado nas Big Three: Standard & Poor’s, Moody’s e Fitch Ratings. Grande parte dos fundos mútuos e dos fundos de pensão é obrigada apenas investir em papéis bem avaliados por ao menos duas dessas agências.

Apesar de historicamente terem sido alvo de críticas (como a de não terem sido capazes de identificar os riscos envolvidos nas hipotecas subprime americanas, que levaram à crise de 2008 e ao colapso de três grandes bancos de investimento – Lehman Brothers, Merrill Lynch e Bear Stearns), as agências de rating continuam oferecendo as métricas mais seguras de que os investidores dispõem para avaliar onde alocar seu capital.

As classificações padrão são divididas em dois grandes grupos: grau de investimento e grau especulativo (onde estão os também chamados títulos chamados “lixo” ou junk bonds). No patamar de investimento estão aqueles que receberam notas entre AAA e BBB- (na escala da S&P e da Fitch) ou entre Aaa e Baa3 (na da Moody’s).

Costumam encabeçar essa lista países como Alemanha, Holanda, Suíça, Dinamarca, Noruega, Suécia, Austrália, Canadá, Luxemburgo, Liechtenstein e Singapura, seguidos pelos Estados Unidos, China, Japão, Reino Unido, França, Israel e Arábia Saudita. Nossos vizinhos latino-americanos Chile, Uruguai e Peru também estão dentro do patamar de investimento, ainda que com nota menor do que aqueles que lideram as classificações.

O Brasil viveu uma trajetória de elevação e de posterior rebaixamento de sua dívida soberana. Em 2008, durante o governo do atual presidente Lula da Silva, o Brasil alcançou a categoria de grau de investimento pela primeira vez em sua história. Com a inflação controlada e as finanças públicas em ordem, o país era então visto como uma economia emergente promissora.

Porém, no contexto da crise econômica de 2015, o Brasil sofreu uma série de rebaixamentos. Em setembro daquele ano, a S&P retirou o grau de investimento do país, seguida pela Fitch alguns meses depois. Em fevereiro de 2016, foi a vez da Moody’s retirar o Brasil do grau de investimento.

As agências continuaram a rebaixar a nota do país, que chegou a ficar 3 níveis abaixo do patamar de investimento por vários anos consecutivos, impactando diretamente as nossas finanças públicas.

No Brasil, a maior parte da arrecadação é comprometida por gastos obrigatórios como folha de pagamento do funcionalismo público e previdência. Os recursos para infraestrutura e programas socioambientais são, assim, limitados e acabam reduzidos quando o governo precisa gastar mais com juros da dívida pública, por conta do rebaixamento de suas notas.

Desde 2023, o Brasil estava classificado como BB pela S&P e pela Fitch e Ba2 pela Moody’s, dois níveis abaixo do grau de investimento. Em outubro do ano passado, no entanto, a Moody’s elevou para Ba1 a nota do Brasil, deixando-nos a apenas um nível abaixo desse patamar – o que foi comemorado pelo governo como um sinal de recuperação.

De fato, se trata de um passo importante, embora ainda insuficiente. Não é concebível que o Brasil, que é uma das 10 maiores economias do mundo, ainda seja classificado de forma pior que países como Vietnã, Paraguai, Colômbia, Indonésia, Panamá, Marrocos e Trinidad e Tobago.

A retomada do grau de investimento está no horizonte, mas ainda será provavelmente um processo gradual. O país precisa continuar comprometido, ao longo dos próximos meses e anos, com políticas fiscais responsáveis e reformas estruturais. Caso contrário, a confiança dos investidores pode rapidamente se dissipar e os avanços alcançados serem perdidos.

O exemplo da Grécia nos pode servir de lição. Em 2010, aquele país enfrentou uma espiral de crise e precisou ser salvo da falência por resgates internacionais. Apenas no último sábado, ou seja, depois 15 anos de sucessivos programas de austeridade impostos pela União Europeia e FMI, o governo grego pode finalmente comemorar a sua retomada do grau de investimento pela Moody’s.

Como se vê, grau de investimento é algo fácil de perder – mas difícil e demorado para recuperar. Entre as variáveis levadas em consideração pelas agências, a trajetória da dívida pública ao longo do tempo, com seus custos, prazos e dinâmica de crescimento, tem suma importância. A retomada da confiança dos investidores, portanto, nunca é imediata, depende de um comprometimento dos governos no médio e longo prazo.

Para que se torne uma prioridade dos nossos governantes, é preciso que, antes, seja uma preocupação de todos nós cidadãos – desde aquele que vende pipoca na rua até os nossos maiores empresários.

A melhoria da nota de crédito, além de reduzir a quantidade de juros paga pelo governo, incentiva investimentos diretos no setor produtivo, impulsiona a atividade econômica e aumenta a arrecadação. Além disso, muda a qualidade do próprio capital, que passa a ser mais estável e de longo prazo, menos especulativo, proporcionando uma previsibilidade maior às contas públicas.

A recuperação do grau de investimento, portanto, não é apenas uma questão de prestígio. É uma alavanca fundamental para impulsionar a economia e aumentar o emprego, renda e melhorar as condições de vida da população. É uma necessidade premente para que qualquer país desenvolva um ambiente de negócios sólido, onde as empresas se sintam seguras para expandir e inovar, e os consumidores, por sua vez, a gastar e investir de maneira mais otimista.

O Brasil é um celeiro de riquezas materiais e humanas, mas hoje está impossibilitado de receber os investimentos necessários para seu desenvolvimento sustentável. Para alcançar esse objetivo, é essencial que todos nós, brasileiros, estejamos conscientes da importância de resgatar o grau de investimento do país.

O caminho pode parecer desafiador, mas os benefícios são inegáveis e cruciais para o nosso futuro. Por isso, assim como o país inteiro se uniu, no passado, para reivindicar eleições diretas já, está na hora de voltarmos a nos unir em torno para alcançar um propósito comum: grau de investimento já.

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