Homens em situação de rua foram mortos à queima-roupa; sobrevivente está em estado grave
O sobrevivente é Jaílton Matias Anselmo, o Pará, de 38 anos. Os mortos não tinham sido identificados até a última atualização desta reportagem, mas na região eram conhecidos como Milharina e Bahia — que foi percussionista em Salvador.
Moradores em situação de rua são baleados em Irajá
Os homens em situação de rua atacados a tiros nas imediações do metrô de Irajá, na madrugada desta sexta-feira (17), foram baleados à queima-roupa. Dois sem-teto morreram na hora, e outro foi hospitalizado em estado grave.
O ataque ocorreu por volta das 4h. Inicialmente, acreditava-se que os assassinos tinham atirado de dentro de um carro. Agora, já se sabe que os criminosos pararam o automóvel perto de um retorno da Avenida Pastor Martin Luther King Júnior, desceram do veículo, caminharam até onde os homens dormiam e abriram fogo com fuzis.
Os disparos não foram concentrados em um único ponto — os corpos ficaram em extremidades opostas do viaduto. Foram tantos disparos que cápsulas ficaram pelo chão, e um tiro atravessou a janela de uma casa e parou na televisão — ninguém na residência foi ferido.
QUEM ERAM AS VÍTIMAS
O sobrevivente é Jaílton Matias Anselmo, o Pará, de 38 anos. Ele tem uma anotação criminal por associação ao tráfico. Segundo a direção do Hospital Estadual Getúlio Vargas, o estado de saúde dele era grave.
Os mortos não tinham sido identificados até a última atualização desta reportagem, mas na região eram conhecidos como Bahia e Milharina.
“São 2 coroas que já moram debaixo do metrô há muito tempo. Um andava com bengala, mal conseguia andar. O outro vendia verdura. O terceiro é o Pará. Todo mundo da redondeza conhecia eles”, contou Érico Cerqueira, morador da região.
A técnica de enfermagem Camila de Jesus Gomes, que passa diariamente pelo local, lamentou o crime: “Eles não mexiam com ninguém. Davam bom dia, boa tarde. Eram tranquilos. O que leva um ser humano a fazer isso? Muito triste, lamentável.”
VÍTIMA ERA PERCUSSIONISTA
Antes de viver em situação de rua, Bahia, também chamado de Etevaldo, era percussionista em Salvador. No Rio, onde vivia há muitos anos, encontrou abrigo sob o viaduto da estação de metrô de Irajá. Mesmo com limitações de mobilidade causadas por AVCs, mantinha uma rotina marcada pela música e pela convivência com a comunidade.
Ele participava das atividades do Batikum Afro, projeto social que promove oficinas de música afro-brasileira em comunidades da Zona Norte. “Ele cantava, participava e estava sempre com a gente. Tocávamos percussão, e ele lembrava muito de Salvador. Um dia, em 2023, apareceu do nada e começou a cantar junto. Criamos uma relação. Todo ensaio ele aparecia”, conta Luccas Xaxará, diretor do projeto.
“Ele era o mais vulnerável ali. Aquele trecho nunca teve muitos moradores, só uns 6, mais ou menos. A comunidade conhecia. Tinha um barbeiro que cortava o cabelo dele, o pessoal dava alimentação. A gente oferecia café da manhã e interagia durante os ensaios”, relembra Luccas.
Mesmo após perder parte dos movimentos, Bahia continuava a cantar. “Chegava, começava a cantar e animava todo mundo”, diz Luccas.
Agora, o grupo busca formas de preservar sua memória. “Queremos garantir que ele não seja esquecido. Ele não tinha documentos, mas tinha história. Estamos atrás da família dele para que ele tenha um sepultamento digno”, afirma Luccas.