Jorge Sampaoli no Atlético-MG: dá para separar a obra do artista?
A volta do argentino ao Galo reacende o debate sobre talento, temperamento e os custos de sua liderança.
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O retorno de Jorge Sampaoli ao Atlético-MG em 2025 desperta confiança ou desconfiança?
Se em 2021 e 2023 Jorge Sampaoli era tratado como um nome de peso no futebol brasileiro, seu retorno em 2025 acontece em outro cenário. O Atlético-MG o contratou como terceira opção, depois das negociações frustradas com Carlos Carvalhal e Martín Anselmi. O clube chegou até a descartar sua volta, mas sem alternativas voltou a recorrer ao argentino.
A mudança de percepção não é gratuita. Nos bastidores de Santos, Flamengo e também do próprio Atlético, ele deixou a impressão de um padrão difícil de conviver: exigente ao extremo, intenso no dia a dia e muitas vezes incapaz de manter relações estáveis. Relatos dão conta de um treinador que não cumprimenta jogadores, muda de opinião com frequência e cria barreiras no ambiente de trabalho.
Ao mesmo tempo, há a outra face. Como treinador, o argentino tem conteúdo, treinos altamente elogiados, visão de jogo singular e a capacidade de imprimir sua ideia rapidamente nas equipes. É esse contraste entre genialidade e turbulência que coloca sua volta ao Galo sob debate. Até que ponto é possível separar a obra do artista?
Ele não chega a extremos assim, claro, mas traz esse dilema para o futebol. No Santos, em 2019, o ótimo trabalho valorizou seu passe, mas a saída veio com atritos internos e uma carta de despedida irônica. No Atlético, em 2020, começou empolgando, mas logo desgastou dirigentes com pedidos insistentes de reforços e criou um ambiente tão pesado que o ex-lateral Fábio Santos resumiu, em entrevista à ESPN: “Fiquei quatro meses dando bom dia para o Sampaoli e depois desisti. Ele não me deu bom dia durante quatro meses”. A relação terminou em ruptura após divergências financeiras e a polêmica “CovidFest”, que atingiu o clube em cheio.
No Flamengo, em 2023, a expectativa era alta. Treinos elogiados e resultados iniciais animadores. De novo, o problema foi a convivência. Jogadores relatavam um “clima de velório” após derrotas e comportamentos novamente erráticos: falta de simpatia generalizada, cara amarrada e exigências muitas vezes incompreensíveis nos treinos. Somaram-se a isso escolhas táticas contestadas e um isolamento visível no dia a dia. A neutralidade do treinador diante da agressão de Pablo Fernández contra Pedro simbolizou sua dificuldade em gerir crises, e a saída após a final da Copa do Brasil, com o Flamengo jogando menos que o São Paulo em dois jogos, foi vista como alívio.
Na Europa, o roteiro não foi muito diferente. No Olympique de Marselha, brigou por reforços, conseguiu a chegada de Gerson, mas deixou o clube reclamando de falta de apoio. No Sevilla, a segunda passagem durou apenas cinco meses. Hoje, a discussão não é mais apenas sobre sua qualidade técnica, mas sobre o “custo Sampaoli”: times competitivos, sim, mas quase sempre acompanhados de relações desgastadas e ambientes tensos. Tudo isso com apenas um título conquistado nos últimos dez anos, justamente no Atlético-MG: o Campeonato Mineiro de 2020.
O Galo parece gostar de dilemas. Em 2024, investiu pesado, chegou a duas finais, perdeu ambas e precisou desmontar o elenco com a venda de Paulinho e outros jogadores. Apostou alto na quarta passagem de Cuca. Agora, volta a Sampaoli, em mais uma escolha de impacto que levanta dúvidas sobre sustentabilidade e planejamento. Será o talento do novo técnico do Galo o bastante para que a torcida relembre apenas a obra e deixe de lado o artista? A conferir.