Eleito pela terceira vez como presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Goiás (Faeg), José Mário Schreiner, esteve na sede do Diário do Estado para falar sobre os novos projetos da instituição e o seu legado nas últimas duas gestões. Schreiner também comentou sobre a possibilidade de ser candidato à Assembleia Legislativa de Goiás mais uma vez e sobre as dificuldades que os produtores rurais enfrentam atualmente no Brasil.
Ricardo Castro
Sara Queiroz
Diário do Estado – O que você destacaria da sua última gestão?
José Mário Schreiner – Eu acredito que a última gestão serviu para consolidarmos muitos projetos que já vinham sendo desenvolvidos. Do ponto de vista da produção rural, buscamos dar competitividade ao setor produtivo rural, que tem sido o grande responsável pelo equilíbrio econômico de Goiás e do Brasil. Dentro do âmbito dos produtores, tentamos ampliar programas que visam dar apoio aos produtores de porte menor. Temos uma questão que temos que diminuir. 85% da produção é oriunda de 15% dos produtores. Os pequenos produtores não conseguem superar as barreiras porque falta a eles orientação. As classes econômicas e a renda do setor rural são muito preocupantes. Hoje existe miséria, só que elas não são vistas pela população e, principalmente, por governos. Por isso, o foco aos pequenos produtores é extremamente importante. Também focamos muito na área da educação. Hoje a Faeg tem na sua essência a formação e a capacitação profissional. Nos aprofundamos nisso e temos programas na área da educação infantil que beneficiam mais de 600 mil crianças por ano em Goiás.
Diário do Estado – Para a próxima gestão, quais são os planos?
José Mário Schreiner – Nova gestão, novos desafios. Tudo novo. Promovemos várias modificações para dar um dinamismo ainda maior ao nosso trabalho. Sabemos que a demanda é muito grande. A Faeg é uma instituição plural. Ela cuida de todos os assuntos e precisa cuidar dos grandes, pequenos e médios produtores. Nosso foco é aprimorar e acompanhar ainda mais os produtores. Acreditamos piamente que, se conseguimos alavancar 50% dos produtores das classes D e E para a classe C e 50% da classe C para as classes B e A, aumentaremos o valor bruto da nossa produção, que no último ano foi de R$ 44 bilhões, em 50%. Para isso, precisamos buscar mais acompanhamento técnico para os produtores.
Diário do Estado- Qual a contribuição da tecnologia para o desenvolvimento agropecuário?
José Mário Schreiner – O Centro-Oeste há 40 anos praticamente não existia no cenário agropecuário nacional. Hoje é a região responsável por quase 50% da produção do Brasil. A criação da Embrapa foi um marco para o Brasil. Outras empresas estaduais de pesquisa e a iniciativa privada investiram e desenvolveram tecnologias e, o mais importante, o produtor incorporou essas tecnologias. Isso fez com que tivéssemos uma revolução. Hoje, existe mais tecnologia dentro de um grão de milho do que em um smartphone. Essa foi a grande transformação que o setor agropecuário trouxe para o Brasil. Outro grande ganho foi a redução no preço dos alimentos. Há 40 anos, gastava-se 45% da renda familiar para se alimentar. Hoje, a família gasta 16% de sua renda com alimentação. Isso propiciou que os brasileiros pudessem adquirir outros bens de consumo. O grande motor do desenvolvimento do Brasil passa pelo setor agropecuário do Brasil.
Diário do Estado – Como o incentivo ao pequeno produtor pode beneficiar a economia?
José Mário Schreiner – Se acompanharmos um produtor de 50 litros de leite, que passe a produzir 300 litros, a renda dele pode subir de R$ 1,5 mil para R$ 9 mil. Isso não quer dizer que ele tenha lucro, mas o dinheiro será gasto na região dele. O produtor vai consumir mais, assim como sua família. Ele vai comprar no supermercado local e desenvolver a economia da região. Fomentar o comércio local gera mais empregos, renda e, consequentemente, mais arrecadação, que os governos adoram. A melhoria do produtor significa melhoria para a sociedade goiana e a brasileira.
Diário do Estado – Qual o principal problema enfrentado pelo agronegócio goiano?
José Mário Schreiner – Em termos de competitividade, nosso grande desafio é a infraestrutura. Temos sérios problemas de infraestrutura, com rodovias, ferrovias inacabadas, energia elétrica. Em Goiás, acreditamos que o problema de energia elétrica tende a se minimizar com a venda da Celg para a Enel. Já tivemos vários contatos com a empresa, que está sendo muito receptiva ao diálogo. Teremos uma reunião mensal para que possamos, gradativamente, resolver o problema de energia elétrica, que é muito sério. Há quedas de energia que duram sete dias, por exemplo.
Diário do Estado -Como a crise política afetou a agropecuária em Goiás?
José Mário Schreiner – Quando a crise política se aprofundou no Brasil e a sociedade entendeu que não dava para continuar no sistema que estávamos, nós apoiamos claramente o impeachment. Acreditávamos que essa crise política sem precedentes estava assolando a economia brasileira. Foi uma decisão histórica. Goiás teve uma participação extremamente importante. Tudo isso afetou de sobremaneira o setor agropecuário. Mesmo que o setor tenha resultado positivos, não é uma ilha. Você não consegue conservar uma laranja boa em uma caixa de laranjas podres. A renda da família brasileira caiu muito, mas o mercado internacional sempre ajudou a dar um pequeno equilíbrio. Contudo, em Goiás e no Brasil, tivemos quedas profundas na produção, além de ter havido freio nos investimentos em tecnologia.
Diário do Estado – Quais as expectativas econômicas para 2017?
José Mário Schreiner – A expectativa para a produção é otimista. Devemos ter uma safra recorde de 21,5 milhões de toneladas em Goiás, assim como no Brasil, com uma safra de 215 milhões de toneladas. Mas, em alguns setores, enfrentamos problemas, como, por exemplo, a cadeia láctea. O produtor de leite está sofrendo muito com preços abaixo do custa de produção. Há um problema na cadeia, pois o produtor está vendendo mais barato, mas o preço final não caiu para o consumidor. Isso amanhã ou depois vai refletir no consumidor. Já houve queda de 14% na produção de leite do estado no último semestre. Há sempre dois elos da cadeia muito penalizados: o produtor e o consumidor. Por outro lado, no cenário internacional, nem tudo está perdido. O Brexit é uma oportunidade para o Brasil, pois todas as negociações serão refeitas. O crescimento da China está migrando para o consumo no lugar dos investimentos. Isso é mais oportunidade para vendermos para o mercado chinês. E há o efeito Trump, que precisamos avaliar com muita cautela. Mas as primeiras sinalizações foram boas para nós. O fim do acordo do Transpacífico, que tratava de 40% do comércio mundial, foi um alívio para nós, pois o Brasil estava fora dele. O grande problema nosso é que o Brasil está muito travado e preso ao Mercosul. O bloco como estava, com Kirchner e Maduro, trouxe atrasos tremendos ao Brasil. Agora há uma boa expectativa.
Diário do Estado – No que o país precisa avançar para alavancar o agronegócio?
José Mário Schreiner – Precisamos acordar e fazer nosso dever de casa. Não conseguimos resolver nossas questões internas, como implementação de comércio bilateral, unilateral. O Mercosul precisa passar por uma revisão. Ele só é interessante para alguns parceiros, mas não para o Brasil. Temos que ter coragem de falar isso. Também há outra questão: a legislação brasileira. A Anvisa demora de seis a oito anos para aprovar novos produtos.
Diário do Estado – As missões comerciais do governador já renderam retorno ao setor agropecuário?
José Mário Schreiner – É imperioso que apresentemos nosso potencial, atraia investimentos, capital estrangeiro. Você sente esses reflexos. Os maiores investidores já estão no estado de Goiás, mas é claro que, quanto mais puder se atrair empresas, investimentos em tecnologia é conhecimento, mais avançaremos. Vejo, por exemplo, na Nova Zelândia, um país muito interessante para a gente se espelhar. Eles têm uma escassez de mão de obra muito grande, mas com equipamentos extremamente práticas. Acredito que devemos avançar nesse sentido e, sem dúvida, o governador fazendo esse papel ajuda muito o setor privado.
Diário do Estado – Como a Faeg tem se movimentado politicamente?
José Mário Schreiner – A Faeg é apolítica e apartidária. As pessoas que estão lá dentro que tomam posições. Hoje, o produtor rural se conscientizou de que a política faz parte da vida dele. Grandes decisões da vida são políticas. Estamos desenvolvendo um trabalho importante e crescente para que nossos membros participem da vida política de Goiás. Ano passado tivemos centenas de candidatos. Hoje, temos 20 prefeitos, eleitos em 2016, muito ligados à Faeg. Para o ano que vem estamos discutindo, avaliando o movimento. Temos que fazer uma política diferente dessa que está aí. Há de ser uma política de representatividade, que apresente algo inovador.