Não foi sobre anistia. Foi sobre provocar a revolta dos bolsonaristas
Golpe mata!
Em Paris, a líder da ultradireita Marine Le Pen disse neste domingo (6) que vai
se inspirar no pastor Martin Luther King Jr., assassinado em 1968 por lutar
contra a segregação racial nos Estados Unidos, para enfrentar a Justiça que a
tornou inelegível por cinco anos.
Há quase uma semana, Le Pen foi condenada por desviar fundos do Parlamento
Europeu para o caixa de seu partido, a Reunião Nacional (RN), e impedida de
concorrer a cargos públicos – medida que entrou em vigor imediatamente apesar de
ainda ser passível de recursos.
Na Avenida Paulista, o líder da ultradireita Jair Bolsonaro disse que “algo o
avisou”, porque se ele estivesse no Brasil no dia do golpe de 8 de janeiro de
2023, “teria sido preso e estaria apodrecendo até hoje ou até assassinado”. Bolsonaro e Le Pen são dois contraventores.
Le Pen ainda tem chances de disputar a presidência da França em 2027. Bolsonaro,
inelegível até 2030, não tem, de vez que foi condenado duas vezes pelo Tribunal
Superior Eleitoral. Em breve, o Supremo Tribunal Federal o condenará por golpe
de Estado.
É remota a possibilidade de Le Pen ser presa. A de Bolsonaro é mais do que
certa, a não ser que fuja. Há poucos dias, ele admitiu que conversou com chefes
militares sobre a adoção de medidas de exceção que impediriam a posse do
presidente eleito, Lula.
Bolsonaro sabe melhor do que ninguém que o Congresso não aprovará a anistia que
o beneficiaria. E que se a aprovasse, ela seria barrada pelo Supremo por ferir a
Constituição. Só lhe resta, pois, estimular seus seguidores à revolta caso ele
seja preso.
O pastor Silas Malafaia, um dos promotores do comício na Avenida Paulista, disse
aos manifestantes:
“Se os senhores [ministros do STF] prenderem Bolsonaro, o que pode acontecer no
Brasil? Pode não acontecer nada, ou pode acontecer tudo!”
O que seria “acontecer tudo”? Baderna, estradas bloqueadas por caminhoneiros,
acampamentos à porta de quarteis, invasões de prédios públicos, milhares de
pessoas a clamarem por um golpe? Esse filme já passou, e no fim os bandidos
morrem.
De resto, segundo pesquisa da Quaest, a maior parte dos brasileiros (49%)
acredita que Bolsonaro participou de uma tentativa de golpe, contra 36% que não
acreditam; e 52% concordam que o Supremo Tribunal foi justo ao tornar Bolsonaro
réu no inquérito do golpe.
Patética a cena de Bolsonaro ao tentar ler em inglês uma mensagem dirigida ao
mundo. Bolsonaro sugeriu que a perseguição a ele é parte de uma conspiração
internacional contra a direita, e citou Le Pen, os processos contra Trump e a
oposição venezuelana.
Bolsonaro criou o bordão que espera ver repetido por todos os seus asseclas:
“O que os canalhas querem é me matar!”
Fazia parte do golpe que Bolsonaro quis aplicar o assassinato de Lula, do vice
Geraldo Alckmin e do ministro Alexandre de Moraes. Esqueci algum nome?
Baderna não é golpe, em alguns casos é crime. Tentativa de golpe é crime, como
tentativa de homicídio também é.
Golpe mata. Mata a democracia. Mata e tortura pessoas. Enterra sonhos de
gerações inteiras.