Muro no Pontal de Maracaípe: perícia solicitada pela Justiça Federal confirma danos ambientais e obra irregular em área protegida
Segundo documento, contenção avança sobre área pública, impede acesso à praia, compromete a fauna marinha e intensifica erosão costeira.
O impasse em torno do muro que restringe o acesso à praia do Pontal de Maracaípe, no Litoral Sul de Pernambuco, ganhou um novo desdobramento: uma nova perícia solicitada pela Justiça Federal confirmou danos ambientais decorrentes da contenção.
Segundo o documento, ao qual o DE teve acesso, o muro avança sobre área pública, impede o acesso à praia, compromete a fauna marinha e intensifica a erosão costeira.
O laudo pericial faz parte de uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal contra o empresário João Vita Fragoso de Medeiros, dono de um terreno no local e responsável pela construção da barreira em fevereiro de 2023, sob a justificativa de contenção do avanço do mar na propriedade.
Em junho de 2024, um relatório do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) apontou que o muro, feito de troncos de coqueiro e sacos de ráfia, tinha mais que o dobro do tamanho autorizado, estava causando poluição com detritos de plástico e havia danificado a vegetação de restinga do local.
A Agência Estadual de Meio Ambiente (CPRH) iniciou a demolição do muro, em janeiro deste ano, mas parte da estrutura foi reconstruída horas depois pelo empresário João Vita Fragoso. O Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) indeferiu pedido de liminar para demolição imediata, alegando necessidade de maior instrução processual.
A nova perícia técnica corrobora os apontamentos realizados pelo Ibama em 2024. O documento aponta que o muro tem 570 metros de extensão, ultrapassando em mais que o dobro os 250 metros autorizados inicialmente pela CPRH. A construção também avança 1.282 m² além dos limites da propriedade registrada no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
A perícia também confirmou que o muro foi construído integralmente em Área de Preservação Permanente (APP), conforme as legislações federal, estadual e municipal, além de estar em faixa de praia, considerada bem público de uso comum. A obra está em área classificada como “non aedificandi”, ou seja, onde construções são proibidas por lei.
DANOS À VEGETAÇÃO E À FAUNA MARINHA
Um dos principais impactos ambientais apontados pelo laudo técnico é a supressão irregular da vegetação de restinga, ecossistema protegido por lei e essencial para a estabilidade da faixa costeira.
De acordo com o documento, a construção do muro destruiu parte dessa vegetação e, após o embargo da obra, a área foi novamente soterrada com areia retirada da própria praia para reforçar a estrutura.
Além disso, a perícia aponta que o muro atua como uma barreira física que impede o acesso de tartarugas marinhas às áreas mais elevadas da praia, onde normalmente realizam suas desovas. Em maio de 2024, uma tartaruga chegou a desovar junto ao muro e o caso foi documentado pela Polícia Federal.
Outro problema identificado foi a poluição causada pela degradação dos sacos de ráfia utilizados na construção da barreira. Com o tempo, esses materiais começaram a se desfazer e liberar microplásticos na areia, no estuário e nos manguezais, colocando em risco a fauna marinha, que pode ingerir ou se emaranhar nos resíduos.
EROSÃO COSTEIRA E PERDA DA FAIXA DE AREIA
A perícia também identificou que o muro interfere diretamente na dinâmica sedimentar da região. Segundo o laudo, a estrutura bloqueia o transporte natural de sedimentos, intensifica a erosão costeira e causa escavação na base do muro, o que pode levar ao seu colapso.
Na prática, a energia das ondas, ao bater no muro, gera turbulência e remove a areia da base da estrutura. O documento aponta que, com o tempo, isso pode tornar a estrutura instável e exigir manutenção constante. Além disso, a erosão pode se transferir para praias vizinhas, agravando o problema em toda a região.
Outro problema seria o risco à segurança dos visitantes da praia. Durante marés altas, a faixa de areia desaparece em diversos pontos, tornando a área intransitável. Segundo o laudo, há registros de pessoas caminhando com água na cintura para contornar a estrutura, com risco aumentado em situações de “ressaca” do mar.
Além disso, a presença do muro também restringe o acesso à praia, especialmente para pescadores, jangadeiros e turistas. Uma placa de “propriedade particular” instalada na área, segundo a perícia, reforça o “constrangimento” e a sensação de privatização de um espaço público.
Procurada, a Justiça Federal em Pernambuco disse que as partes foram intimadas para se manifestar sobre o laudo do perito. Caso haja alegação de omissões ou contradições, o perito pode ser acionado para responder às questões por escrito ou em audiência. “Após esses esclarecimentos, abre-se prazo para alegações finais das partes e, por fim, sairá a sentença”, disse o órgão em nota.
Também procurados, o empresário João Vita Fragoso de Medeiros e a Agência Estadual de Meio Ambiente não se manifestaram sobre a perícia até a última atualização desta reportagem.
Para recapitular, o muro no Pontal de Maracaípe continua sendo cenário de disputas e impasses, com impactos ambientais significativos que despertam preocupação e a necessidade de medidas urgentes para preservar a área e a fauna marinha afetadas pela construção irregular. Espera-se que a justiça e os órgãos competentes tomem as devidas providências para solucionar essa questão de maneira adequada e eficaz.