Um novo Nero (por André Gustavo Stumpf)
DE assustado com preços e Trump incendiando o mundo
Inflação não derruba governo, mas prejudica muito a administração. O governante,
diante da alta de preços, é levado a fazer acordos e negociações que não faria
em tempos normais. No Brasil, na época da hiperinflação, o governo tentou vários
planos, elaborados pelos economistas da casa e todos fracassaram. O Brasil
chegou a ter inflação perto de 100% em apenas um mês. Os militares foram
obrigados a entregar o poder, entre outras razões, por causa da inflação forte.
O fenômeno desestabiliza.
O presidente Lula está assustado com a subida dos preços. Fala nisto a todo
momento e anuncia reuniões e mais reuniões. É uma característica da atual
administração. Convoca reuniões, cria grupos de trabalho que é o melhor caminho
para não resolver absolutamente nada. De tudo o que foi falado, desde que os
números oficiais começaram a desabar no Palácio do Planalto já se falou em
diversos encontros entre autoridades de um lado e de outro e os números
continuaram subindo. O Ministro da Fazenda, Fernando Hadddad, com sua pinta de
professor universitário, explica o problema, mas não o resolve.
A fórmula petista de buscar o desenvolvimento é a mesma ao longo dos anos.
Investimento estatal pesado, sem medir consequências, nem prestar atenção em
eventuais déficits. Criar um esquema de governo em que o trabalhador sempre
precise do governo para alguma atividade. O cipoal burocrático envolve e orienta
o cidadão. Fora do poder ele é um desamparado. Nos sites do governo estão
inscritos quase cem milhões de brasileiros. Ou seja, a metade da população
brasileira está ao alcance da mão pesada do estado.
O governo, portanto, não pode privatizar suas mais de cem empresas estatais.
Elas existem para empregar eleitores de Lula e do PT. A Telebrás, por exemplo,
não tem nenhuma razão para continuar a existir. Ela deveria ter sido extinta
quando da privatização do setor no governo Fernando Henrique. Não foi porque
tinha muitas dívidas, algumas delas em fase de cobrança judicial. Seria melhor
pagar as dívidas, extinguir as ações nos tribunais e depois fechar suas portas.
Foi neste estágio que o PT encontrou a Telebrás. Hoje ela foi vitaminada, passou
a fazer parte dos planos do Ministério das Comunicações e, naturalmente,
apresentou um déficit monumental que será pago pelos brasileiros na forma de
impostos.
Também não é bem recebida qualquer sugestão com objetivo de reduzir gastos,
diminuir despesas e racionalizar a administração. O ministro da Fazenda ousou
mencionar a hipótese e foi bombardeado por todos os lados, inclusive por uma
graduada estrela petista que está prestes a se tornar ministra em gabinete
dentro do Palácio do Planalto. Ao lado do presidente. Prestígio maior não há. Os
brasileiros devem ter noção de que o jogo está jogado. A eleição de 2026 de fato
começou a ser planejada nestas férias de verão. Os milhões inscritos nos
múltiplos programas oficiais são eleitores aprisionados dentro dos currais
eleitorais que se expandiram por todo o país. Os empresários, que dependem dos
favores oficiais, não dispõem da autonomia necessária para construir
alternativas. O Brasil cresce aos solavancos, quase por acaso.
Qualquer interrupção neste tipo de organização é catastrófica. É fundamental
manter o equilíbrio dentro do país. A política se assemelha à da República
Velha, é preciso modificar tudo, para que tudo permaneça como está. Muitas
reuniões e nenhuma decisão. Nos dias atuais a ameaça não é mais o ouro de
moscou, nem a possível intervenção soviética, mas a loucura de Donald Trump. Ele
está se divertindo na presidência dos Estados Unidos, país que já foi o símbolo
da democracia e das liberdades. Hoje significa opressão política e protecionismo
econômico, exatamente o contrário do que pregavam os líderes daquela nação nas
últimas décadas. Foi com aquele discurso que os norte-americanos investiram na
reconstrução da Europa, depois da Segunda Guerra, e se transformaram na maior
economia do mundo. Hoje, seu grande líder caminha no sentido contrário.
Os dirigentes ocidentais estão muito assustados. O brasileiro faz o que pode
para se desviar das estocadas originadas em Washington. Mas, um dia haverá algum
tipo de confronto. E o Brasil tem reduzidas chances de obter vantagens. Melhor
ficar quieto e esperar o temporal passar. Os norte-americanos vão pagar um preço
elevado pela ousadia de seu líder e de sua direita. Todos vivemos no mesmo
planeta. Lula, até agora não tem adversário pronto para disputar a eleição de
2026. A oposição ainda se debate com as propostas confusas do bolsonarismo, que
não é uma ideologia. Seu líder é apenas um alpinista que se aproveitou de raro
momento na política nacional. Difícil acontecer de novo. Mas Trump pode
enlouquecer a ele mesmo, seu país e seus vizinhos. Trata-se de um novo Nero com
poder de incendiar sua Roma.
André Gustavo Stumpf, jornalista ([email protected])