Olavo de Carvalho e Felipe Neto: a morte da razão

Olavo de Carvalho e Felipe Neto: a morte da razão

Por Sara Andrade.

Venham comigo. Tenham um momento de sinceridade consigo mesmos: de onde você tirou o que sabe sobre Olavo de Carvalho? Vamos lá! Não tenha repulsa à mera pergunta: é apenas uma pergunta! (Essa é inclusive uma atitude típica de pessoas que não estão em pleno uso da razão, e que são capazes de se inflamar ao ouvir apenas palavras, como se elas tivessem o poder de ferir mortalmente). É como quem escuta o nome “Lula” ou “Bolsonaro” e já se contorce todo… “Não diga este nome perto de mim!”, diz o fulano. Admita: você não está tão afetado!

Eu respondo por você. Se é como a maioria imaginada por mim, você ouviu falar de Olavo de Carvalho por meio de algum veículo de mídia: uma notícia do Google News, uma postagem no Facebook ou, na pior das hipóteses, você é um leitor de manchetes, e foi formando a imagem do nosso personagem, em sua cabeça, através de adjetivos que coletou desses títulos.

Agora, tente definir Olavo de Carvalho em alguns termos. Pois bem, se “guru”, “astrólogo” e “conspiracionista” vieram à mente, eu penso que acertei na mosca: você o “conheceu” por matérias da mídia de grande circulação no país. Na mais rasa das circunstâncias, você o conheceu por ler manchetes- ainda aqui, não se afete! Acalme-se, tranquilize o seu coração. Não há motivos de exasperação para abandonar a leitura.

Porque está tudo bem se esse for o cenário. Você tem algum problema em admitir a realidade da própria vida? Se o conheceu deste maneira, só confesse isso a você mesmo (já que não está na berlinda diante de mais ninguém). Pois é: Olavo de Carvalho morreu. Acaba de morrer, embora a sua biografia e circunstâncias você não terá por aqui. Tente a Wikipédia.

Talvez você pense em Olavo como um velho louco. Porque obviamente a manchete, ou ainda algum parágrafo, te contou que o homem teve a intrepidez de dizer que a Terra é plana. E você talvez parou por aí? Pois eu fui buscar o tal vídeo da terra plana: uma aula de horas de duração, presente no Youtube. Se você não teve curiosidade de confirmar uma informação antes de formar julgamentos perenes: eu sim! E este foi o resultado… (continue se você não tem medo de talvez… sim, na mais aterrorizante das possibilidades para você, tão agarrado às próprias certezas, mudar de opinião). Coragem, meu filho!

No vídeo, Olavo está, diante dos alunos, exercendo a profissão que dizia ter: estava em pleno ato de “filosofar”. Se perguntava, então, sobre as certezas que temos como absolutas em nossas vidas. Como elas surgiram, de quem vieram… e para tanto, tomou como exemplos grandes descobertas científicas. Em dado momento, Olavo diz algo como “pensando assim, a Terra até pode ser plana. Não sabemos, não vimos de cima pessoalmente, com nossos olhos!”. Pois o que parece um simples exercício de questionar certezas, a partir da filosofia, tornou-se um corte de poucos segundos que serviu como prato cheio a todos os jornais do país. Estava provado: o velho é doido!

E assim foi com tantas outras polêmicas, que na minha sincera análise, parecem bobagens criadas, ou falas cortadas fora da linha do raciocínio em que foram primordialmente expostas, ficando realmente difícil para algo soar coerente. “Como ele chegou nisso… Meu Deus, do que ele está falando?”. Essa é a reação, e parece-me o caminho certeiro, a receita infalível para a ridicularização de uma figura.

Agora confesso: como eu conheci Olavo? Em 2017, na faculdade de jornalismo, uma colega (de esquerda), falou-me (elogiosamente) desse homem que pelo jeito, eu já deveria ter ouvido falar, mas de desinformada a coisa me fugiu. Fui para o Youtube, e lhe assisti: xingando como eu nunca tinha visto, e soltando mais fumaça que caminhonete antiga. Mas, no meio daquilo, que me dava desgosto… algumas palavras coerentes foram se formando e conclusões lógicas iam surgindo por detrás da fumaça, até que me fizeram dizer: “Ei, o que importa é o que ele está dizendo!”. Daí parece que a verdade pulsou no meu coração, ao encontrar eco fora de mim.

Conheci então Olavo de Carvalho através de vídeos sobre o amor verdadeiro, o perdão, a necessidade de ser sincero consigo mesmo e por suas duras críticas feitas ao moralismo, esteja ele onde estiver: nas universidades, nas igrejas, nos lares. Esse mesmo moralismo que me fez ter aversão a um homem porque ele falava palavrinhas feiosas, ou porque simplesmente… fumava. Tudo aconteceu antes, bem antes de mudanças na política nacional. Bolsonaro? Não, eu não sabia quem era.

E, veja só: mesmo que haja de fato frases e afirmações “fora da caixinha” rolando por aí… considere por um instante que devem haver mais de DUAS MIL horas de oratória publicadas por Olavo na internet. Você, neste tempo, mister perfeição… quanta bobagem você perdoaria de si mesmo? Até onde vai sua tolerância, ou razoabilidade para pensar: “Ora, foram péssimos trinta segundos dentro de uma aula genial de três horas”. Os mais miseráveis, normalmente, sempre escolhem o pedaço podre da maçã.

Por isso, quando os jornais começaram a descrever Olavo, na época da política, eu pensava: “Mas esse não é o filósofo que conheço”. Pareciam estar falando de outra pessoa. Chamavam de astrólogo, para diminuir, um homem que, há mais de 40 anos, na juventude, havia estudado o tema, mas logo abandonou. Depois disso, já havia publicado dezenas de livros, entre eles uma perspectiva em Aristóteles, e desenvolvido teorias reconhecidamente novas sobre a personalidade humana. Ainda assim, para a mídia brasileira (alvo de muitas das suas críticas), o homem era astrólogo. E ponto final.

Felipe Neto é um desses. Poucos minutos de morte anunciada, e faltou soltar balões. Olavo, crítico de medidas políticas tomadas durante a pandemia (parece que não se pode mais fazer isso, mas vou checar e aviso vocês) estava com Covid-19. Exaltar o fato de que alguém morreu daquela mesma doença após ousar criticar as suas circunstâncias, é idêntico àqueles vídeos de religiosos fundamentalistas que dizem: “Olha… com Deus não se brinca!”; “Tá vendo? Falou mal de Deus e morreu de desastre!”… Este tipinho capaz de ver a Justiça Divina na montanha que parou o avião dos Mamonas. Fale sério: quem é o fundamentalista? Pois este adjetivo cabe muito bem em todos os lados. Lembre-se bem disso.

Eu não peço que você ame Olavo de Carvalho. Eu só peço que tenha caráter o suficiente para não criar e nem nutrir, inflexivelmente, ódio por alguém baseado na fraca imagem criada na sua cabeça, que você inclusive não teve lá tanta curiosidade para checar. Quão evoluída é esta geração, tão orgulhosa de si mesmo, que, na verdade, aceita tudo muito facilmente… como verdade.

E se a Terra for plana? Pois eu faço questão de causar.

Receba as notícias do Diário do Estado no Telegram do Diário do Estado e no canal do Diário do Estado no WhatsApp

Quatro estudantes da PUC-SP são desligados após se envolverem em atos racistas durante jogo

Quatro estudantes de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) foram desligados de seus estágios em escritórios de advocacia após um vídeo viralizar nas redes sociais, mostrando atos de racismo e aporofobia cometidos durante uma partida de handebol nos Jogos Jurídicos Estaduais. O incidente ocorreu no último sábado, 17, em Americana, interior de São Paulo. Nos registros, os alunos ofenderam colegas da Universidade de São Paulo (USP), chamando-os de “cotistas” e “pobres”.

As demissões foram confirmadas por meio de notas oficiais enviadas às redações. O escritório Machado Meyer Advogados, por exemplo, anunciou a demissão de Marina Lessi de Moraes, afirmando que a decisão estava alinhada aos seus valores institucionais, com o compromisso de manter um ambiente inclusivo e respeitoso. O escritório Tortoro, Madureira e Ragazzi também confirmou a dispensa de Matheus Antiquera Leitzke, reiterando que não tolera práticas discriminatórias em suas instalações. O Castro Barros Advogados fez o mesmo, informando que Arthur Martins Henry foi desligado por atitudes incompatíveis com o ambiente da firma. O escritório Pinheiro Neto Advogados também comunicou que Tatiane Joseph Khoury não faz mais parte de sua equipe, destacando o repúdio ao racismo e qualquer forma de preconceito.

Repercussão do caso

O episódio gerou forte indignação nas redes sociais e foi amplamente criticado. O Centro Acadêmico XI de Agosto, que representa os alunos da Faculdade de Direito da USP, se manifestou, expressando “espanto, indignação e revolta” com as ofensas racistas e aporofóbicas proferidas pelos alunos da PUC-SP. A instituição ressaltou que o incidente representou uma violência contra toda a comunidade acadêmica.

Em resposta, a reitoria da PUC-SP determinou a apuração rigorosa dos fatos pela Faculdade de Direito. Em comunicado, a universidade afirmou que os responsáveis serão devidamente responsabilizados e conscientizados sobre as consequências de suas atitudes. A PUC-SP reiterou que manifestações discriminatórias são inaceitáveis e violam os princípios estabelecidos em seu Estatuto e Regimento.

Receba as notícias do Diário do Estado no Telegram do Diário do Estado e no canal do Diário do Estado no WhatsApp

Isso vai fechar em 0 segundos