Estou morrendo e não precisava’: pacientes esperam até 8 anos por atendimento
do SUS no RS
Quadros de saúde são agravados pela demora. Em Porto Alegre, mais de 190 mil
pessoas esperam por consultas na rede pública.
1 de 4 Empresária Kelly Tomaszewski — Foto: Reprodução/ RBS TV
Empresária Kelly Tomaszewski — Foto: Reprodução/ RBS TV
Nos últimos oito anos, a empresária Kelly Tomaszewski viu o Brasil mudar de
presidente três vezes, o seu time do coração conquistar a Libertadores, e o Rio
Grande do Sul enfrentar secas e tempestades. Ela também teve uma filha. No
entanto, neste período, Kelly viu sua saúde deteriorar. Desde 2016, ela aguarda
por uma cirurgia bariátrica no Sistema Único de Saúde (SUS).
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>”Estou morrendo e eu não precisava porque eu podia estar bem. Eu podia estar
>melhorando”, conta a empresária.
Agora, até mesmo tarefas simples tornaram-se difíceis para a empresária.
“Eu não tenho um sono bom. Acordo com muita dor, seja na perna ou na coluna. O
peito, eu não consigo mais respirar. Eu durmo com cinco travesseiros, quase
sentada. E, quando durmo de lado, coloco um edredom”, relata.
2 de 4 Empresária Kelly Tomaszewski — Foto: Reprodução/ RBS TV
Empresária Kelly Tomaszewski — Foto: Reprodução/ RBS TV
A situação da moradora de Esteio
[https://DE.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/cidade/esteio/], na Região
Metropolitana de Porto Alegre, está longe de ser um caso isolado. No município, seis mil moradores aguardam na fila para consultar um especialista.
Segundo o secretário municipal da Saúde, Gilson Menezes, que também é
enfermeiro, a situação é alarmante.
>”Por exemplo, na cirurgia cardiovascular, onde entra o cateterismo cardíaco,
>temos 198 pessoas na fila. Ganhamos uma vaga por mês. Teoricamente, a fila
>terminaria em 198 meses. Mas, na realidade, não vai terminar, porque novos
>casos entram o tempo todo”, diz Menezes.
Para amenizar a espera, a prefeitura custeia, com recursos próprios, 1,4 mil
consultas mensais. Mesmo assim, o sentimento de frustração é inevitável.
>”Os pacientes procuram a gestão municipal. De nada adianta explicar que a
>responsabilidade é do Estado ou da União. Eles querem é a consulta”, lamenta o
>secretário.
UMA FILA QUE NÃO ANDA
A demora no atendimento pelo SUS é uma realidade que agrava o quadro de muitos
pacientes. Em Porto Alegre, mais de 190 mil pessoas esperam por consultas, de
acordo com dados públicos da capital. A especialidade com maior demanda é
oftalmologia adulta, com mais de 30 mil pacientes na fila. Para exames, o número
também é expressivo: quase 150 mil aguardam por atendimento.
O aposentado Ricardo Dias, morador da capital, esperou 465 dias para consultar
um ortopedista. Quando finalmente conseguiu o atendimento, já era tarde. Ele
ficará com sequelas permanentes no dedo mínimo da mão esquerda.
>”É humilhação. Tu acorda cedo, entra na fila, te chamam, fazem meia dúzia de
>perguntas e pedem para voltar em três meses”, desabafa Dias.
3 de 4 Aposentado Ricardo Dias — Foto: Reprodução/ RBS TV
Aposentado Ricardo Dias — Foto: Reprodução/ RBS TV
Segundo o secretário municipal da Saúde, Fernando Ritter, a fila do SUS é
histórica. Ele aponta o envelhecimento da população e o fechamento de serviços,
especialmente na Região Metropolitana, como fatores que agravam o problema.
>”Essa fila não surgiu agora, desde sempre o SUS tem essa fila. São vários
>motivos: em primeiro, o envelhecimento da população; em segundo, aumento em
>algumas especialidades como traumatologia”, explica Ritter.
O QUE DIZEM AS AUTORIDADES
A reportagem da RBS TV solicitou, via Lei de Acesso à Informação (LAI), o número
de pacientes que aguardam na fila do SUS no estado e não recebeu um retorno até
a mais recente atualização desta reportagem.
A secretária-adjunta da Saúde do Rio Grande do Sul, Ana Costa, afirma que há um
grande investimento para ampliar a oferta de atendimentos.
>”Quando a gente precisa, por exemplo, diminuir uma fila de cirurgia, eu preciso
>ter capacidade dos serviços de executá-las: blocos cirúrgicos novos, novos
>equipamentos”, diz a secretária.
O Ministério da Saúde informou, em nota, que tem expandido os serviços públicos
de saúde no RS, com mais recursos e novas habilitações. A pasta disse que, em
dois anos, aumentou em 21% os recursos para procedimentos de média e alta
complexidade e que lançou, em novembro, um programa para aumentar o acesso a
especialistas. Já para a redução das filas de cirurgias, informou que
disponibilizou, só em 2024, mais de R$ 1 bilhão (veja a íntegra da nota abaixo).
Para quem enfrenta a demora, recorrer ao Ministério Público ou à Defensoria
Pública pode ser uma saída. Casos de espera excessiva podem ser denunciados ao
Ministério Público, que investiga o problema e busca responsabilizações.
Já a Defensoria tenta resolver as situações extrajudicialmente e, caso não tenha
sucesso, ingressa com ações judiciais para garantir o atendimento.