Limeira escolhe treinar monitores para atender crianças atípicas em vez de contratar profissionais especializados; entenda impactos
Pesquisadora em educação especial indica que a decisão pode ser uma forma de precarizar e baratear o atendimento educacional inclusivo.
A prefeitura de DE (SP) informou, em junho de 2025, a decisão de oferecer treinamento a 150 monitores da rede municipal de educação para atuarem com crianças atípicas que requiram atendimento especializado. O informe foi publicado no site oficial da administração municipal e nas redes sociais do prefeito Murilo Félix (Podemos).
Nos comentários da publicação, profissionais da educação e familiares de crianças atípicas da cidade mostraram descontentamento com a iniciativa, sugerindo que o ideal seria a contratação de novos profissionais especializados.
DE conversou com a pedagoga e pesquisadora em educação especial Jussara Rosolen para entender o porquê das reclamações e os possíveis impactos que a decisão carrega. Veja detalhes a seguir.
A pedagoga começa pontuando sobre a não informação por parte da prefeitura de DE de qual treinamento será oferecido aos monitores. Ela acredita que nenhum tipo de curso oferecido a profissionais não especializados seja o suficiente para o atendimento de crianças com necessidades educacionais especiais.
> “A partir do momento que eu quero dar um ‘cursinho’ ou fazer uma formação de pessoas não especialistas no assunto para trabalhar com crianças com necessidades educacionais especiais, eu vou precarizar e vou pagar mais barato. Não tem como a sociedade ficar calada em relação a isso”, afirma.
Jussara explica que o profissional especializado em educação especial precisa passar por diversas etapas e anos de estudos para ser realmente capacitado a trabalhar com crianças atípicas.
Para cada neurodivergência, é preciso ter conhecimento e entendimento profundo sobre o que se trata, como age, quais os níveis e quais as atitudes que os portadores podem ter.
> “Eu sendo uma profissional da área eu sei fazer, além das adaptações, o plano educacional individualizado para cada transtorno e dificuldade de aprendizagem. Quando eu coloco 150 monitores ao invés de 150 professores com especializações na área da educação inclusiva, eu rebaixo a qualidade da educação que já está rebaixada”, explica.
EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSIVA
Jussara fala sobre a dificuldade no âmbito educacional em relação a inclusão e melhora na educação especial. As crianças atípicas precisam de adaptações, ser incluídas nas atividades de todas os outros alunos, para que haja a vivência pela perspectiva do outro e também socialização.
Dentro da sala de aula, as adaptações são feitas tanto pela professor especializado em educação inclusiva quanto pela professor que comanda a sala e que fará o acompanhamento conjunto do aluno
> “Não é só um cuidador, que vai levar a criança no banheiro e trazer, dar um desenho ou algo que ela faça um recorte. A inclusão verdadeira traz a criança pra dentro daquilo que o professor tá explicando, de uma forma mais facilitada pra ela”, explica.
O QUE DIZ A PREFEITURA
Procurada pela reportagem, a prefeitura de DE alega que a demanda por atendimento especializado sofreu um crescimento acelerado, e que por esse motivo é importante que todos os profissionais da rede municipal de educação estejam “preparados para oferecer um ambiente escolar seguro, acolhedor e que promova o desenvolvimento de todos os estudantes, especialmente aqueles com deficiência e/ou transtornos do neurodesenvolvimento”, disse em nota.
A administração informou ainda que os 150 monitores iniciaram o processo de capacitação em maio, e que a etapa final será realizada presencialmente nos dias 16, 17 e 18 de julho. A última etapa deve ser conduzida por uma instituição especializada que ainda está em fase final de contratação.
O curso é ministrado de forma on-line e fora do horário de trabalho. A prefeitura afirma que os profissionais estão recebendo pagamento de horas extras para a capacitação.
O foco da capacitação é a prevenção e manejo de crises, a identificação de gatilhos e a construção de ambientes mais seguros, especialmente para estudantes com transtorno do espectro autista, disse a prefeitura.
Outros 40 profissionais, que não foram especificados pela assessoria, vão participar de um curso de certificação em setembro, também voltado para prevenir e gerenciar crises e comportamentos desafiadores.
A administração afirma ter conhecimento que a capacitação de monitores não substitui a atuação de professores de educação especial, e que todas as unidades da rede municipal contam com a atuação desses profissionais.
Por fim, a prefeitura disse que a nova gestão recebeu a rede municipal de educação com déficit considerável de profissionais e que tem atuado para repor os quadros dentro dos limites legais e orçamentários. Não há concurso vigente para professores da educação especial, mas a administração afirma que será contemplado no próximo edital, previsto ainda para 2025.